� economista do BNDES. O artigo n�o reflete necessariamente a opini�o do banco.
Demorando
A atual legislatura federal vai se encerrar nos pr�ximos dias deixando uma d�vida com o Brasil e consigo mesma.
Em 2 de abril de 2013, a "PEC das Dom�sticas", de autoria do deputado Carlos Bezerra (PMDB-MT), foi transformada na emenda constitucional n� 72/2013, visando a acabar com a diferencia��o dessas profissionais em rela��o aos demais trabalhadores. A coluna "Demor�!", de 28/3/2013, aplaudiu o Congresso Nacional pela iniciativa, que teve importantes efeitos imediatos.
Entre outras coisas, a jornada de trabalho foi limitada a 44 horas semanais. As horas extras passaram a ter garantia de uma remunera��o 50% superior. Foi explicitamente vedada a diferencia��o de sal�rios, crit�rios de admiss�o e exerc�cio de fun��es em raz�o de cor, g�nero, estado civil ou idade.
No entanto, passados quase dois anos, n�o foram regulamentados outros direitos, cruciais para acabar com a insidiosa discrimina��o contra uma categoria profissional: o FGTS, o seguro-desemprego, a remunera��o do trabalho noturno superior ao diurno, o seguro por acidente de trabalho etc.
� isso que mostra o texto "Os direitos das trabalhadoras dom�sticas e as dificuldades de implementa��o no Brasil: contradi��es e tens�es sociais", de Magda Biavaschi, desembargadora aposentada do TRT4 (www.cesit.net.br/wp-content/uploads/2015/01/Direitos-das-trabalhadoras-dom%C3%A9sticas.pdf).
Esse � um padr�o da hist�ria nacional. A escravid�o atravessou quase todo o s�culo 19. Mesmo j� sendo considerada imoral, seu fim era tido como "invi�vel". No s�culo 20, a desigualdade se manteve profunda, mesmo com a industrializa��o, que criou oportunidades de inclus�o, mas foi limitada por n�o ter priorizado o consumo popular. A preocupa��o em universalizar a educa��o b�sica s� come�ou a ser efetiva com a Constitui��o de 1988, cem anos ap�s a Aboli��o. O grande contingente de dom�sticas � mais uma sequela da desigualdade ancestral.
Agora, finalmente a sociedade brasileira recha�ou o prolongamento da jornada de trabalho das dom�sticas. � o que Karl Marx chamava de "mais-valia absoluta", uma explora��o do trabalho tipicamente pr�-capitalista, que, em vez de se basear no aumento de produtividade, se d� pelo esgotamento f�sico do trabalhador.
Todavia, a equipara��o dos direitos tem travado nos impactos pecuni�rios sobre os patr�es. A alega��o � que, por n�o ser uma atividade que vise ao lucro, seria invi�vel (o termo se repete) para as fam�lias suportar tais encargos. Por esse prisma, deveriam ser limitados os direitos dos funcion�rios p�blicos ou dos empregados em ONGs.
H� ainda quem diga que isso seria de interesse das dom�sticas, que temeriam a perda de seus empregos. Por�m n�o � o que diz sua representa��o de classe.
N�o � disso que se trata, mas h� um fundamento econ�mico nessa dificuldade. Esse � um servi�o de baixa produtividade, que tem uma alta propens�o a gerar explora��o.
Nos pa�ses desenvolvidos, o trabalho dom�stico existe, mas � caro porque a oferta desses profissionais � relativamente pequena.
A conjuga��o de redu��o da desigualdade -gerando crescimento e ganhos de produtividade- com a devida regulamenta��o de diretos pode fazer o pa�s superar mais uma etapa da pesada heran�a escravista.
A equipara��o definitiva dos direitos trabalhistas � um sinal pol�tico de que o Brasil precisa encontrar caminhos para seguir avan�ando, que n�o cola mais o discurso da inviabilidade, cujo resultado pr�tico � garantir a uma elite "docemente constrangida" a possibilidade de continuar se beneficiando da explora��o do trabalho alheio.
Vale notar que a aus�ncia da previs�o legal de direitos como o seguro-desemprego ou a remunera��o adicional do trabalho noturno n�o faz com que seu �nus deixe de existir, mas sim que ele recai sobre as dom�sticas, que ficam sem a prote��o existente para os demais profissionais formalizados.
Se h� a preocupa��o com os poss�veis efeitos mal�ficos sobre o emprego dom�stico, � melhor que o Estado, ao menos por um tempo, divida o custo adicional com o empregador. N�o d� � que a parte mais fraca continue arcando com esse �nus.
Que a pr�xima legislatura n�o demore a corrigir a falta desta que se despede.
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