� economista do BNDES. O artigo n�o reflete necessariamente a opini�o do banco.
Ideias a priori
Estou lendo o livro "Seven Bad Ideas: How Mainstream Economists Have Damaged America and The World" (Sete ideias ruins: como os economistas convencionais prejudicaram os EUA e o mundo), do jornalista Jeff Madrick.
Seu intuito pol�tico � defender que a partir dos anos 1970 o liberalismo e a desregulamenta��o financeira elevaram a desigualdade e reduziram o ritmo do desenvolvimento em rela��o ao ocorrido no p�s-Guerra.
Para isso, discute o conhecimento econ�mico, mostrando que ideias populares, como "a m�o invis�vel do mercado", embora engenhosas, s�o incoerentes com a realidade.
Algumas dessas "ideais ruins" ser�o tratadas nas pr�ximas semanas. Hoje, o objetivo � falar de algo que o livro evoca: a capacidade humana de criar modelos para lidar com a realidade e como isso impacta o conhecimento, em particular o econ�mico.
O fil�sofo Immanuel Kant tratou disso no conceito de "ideias a priori". O ser humano se distingue pela capacidade de interromper uma a��o, perceber as rela��es e analisar se � poss�vel agir de outra forma. Esse poder de generaliza��o, de identificar o que � principal, permite criar modelos para o entendimento da realidade. Assim, um princ�pio n�o � o in�cio, mas a conclus�o de uma experi�ncia. S� que a partir de ent�o tal modelo ser� usado "a priori" para guiar as a��es.
O ser humano n�o escapa desse poder de mediar a realidade e criar modelos. Com frequ�ncia, n�o � preciso mais do que um fiapo de realidade para que seja posta em a��o, gerando uma profus�o de modelos e idealiza��es.
Esses "preconceitos" s�o �teis, pois frequentemente n�o h� tempo para formar os conceitos. S�o a eles que recorremos, por exemplo, ao andar numa rua deserta ou ao escolher um restaurante num lugar desconhecido. Como na c�lebre frase de Oscar Wilde, "s� os tolos n�o julgam pela apar�ncia".
Entretanto, na sua acep��o mais comum, a de generaliza��es indevidas e estigmatizadoras, os preconceitos mostram que tal capacidade � fal�vel. O risco � ficar aferrado a ideias ruins.
Assim, na ci�ncia, para que o conhecimento n�o seja s� um choque de opini�es, � necess�rio estabelecer crit�rios racionais e, principalmente, emp�ricos que permitam a converg�ncia dos entendimentos.
Novas formas de compreender a realidade sempre surgem. Foi o que aconteceu quando Cop�rnico percebeu que as mudan�as de posi��o dos astros no c�u n�o eram coerentes com a hip�tese de um observador parado.
Os novos modelos precisam ser testados. Como diz Kant, se "deve obrigar a natureza e responder a suas perguntas". Foi o que fez Galileu: ao jogar uma pedra do alto do mastro de um navio em movimento, verificou-se que um observador no conv�s a v� cair em linha reta, pois ela acompanha o barco at� cair no mar. Isso derrubou a tese de que, se a Terra n�o estivesse parada, nuvens e p�ssaros seriam deixados para tr�s.
Isso implica que o conhecimento humano � provis�rio. Mesmo as teorias mais s�lidas e proveitosas, como a f�sica newtoniana, podem ser substitu�das.
� verdade que esse n�o � um processo estritamente racional e emp�rico, que ocorra sem resist�ncias. Em geral, as mudan�as de paradigmas cient�ficos se consolidam somente quando uma nova gera��o de pesquisadores se torna dominante.
Na economia, por�m, disputas te�ricas raramente s�o resolvidas. Por um lado, h� uma dificuldade de estabelecer experimentos que sejam inequivocamente capazes de isolar as caracter�sticas que se deseja testar. A poupan�a � um requisito pr�vio do investimento ou este multiplica a renda e, assim, gera a poupan�a que o financia? Por outro, interesses e convic��es ideol�gicas enviesam a objetividade dos economistas.
Livros como o de Madrick mostram que a teoria e as recomenda��es dos economistas costumam ignorar tal dificuldade, destacando o car�ter algo m�tico de certas ideias econ�micas: t�m estrutura conceitual e sistem�tica, mas s�o descoladas da realidade. Pena que n�o s�o capazes de mudar o exerc�cio da profiss�o.
Isso n�o torna a economia imune ao esfor�o do conhecimento, de olhar para a realidade para identificar padr�es e testar hip�teses. Por�m � preciso ter consci�ncia de seus limites, buscando entender as distintas raz�es e os interesses em jogo.
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Por falar em forjar entendimentos, fico imaginando como seria a cobertura da grande imprensa se a crise h�drica de S�o Paulo ocorresse sob um governo do PT.
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