� economista do BNDES. O artigo n�o reflete necessariamente a opini�o do banco.
Por que tanta celeuma?
Como � de amplo conhecimento, o Ipea (Instituto de Pesquisa Econ�mica Aplicada) errou ao apresentar na semana passada um dado de uma pesquisa de opini�o sobre a viol�ncia contra a mulher. A frase "mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas" teve a concord�ncia de 26% dos entrevistados, e n�o de 65%, como inicialmente divulgado.
� quase dispens�vel dizer que erros crassos acontecem a todos n�s. Reconhec�-lo prontamente foi importante. Agora, o esperado � que os procedimentos internos de revis�o e divulga��o sejam reavaliados.
O diabo � que a repercuss�o tinha sido estrondosa justamente em raz�o do dado equivocado. Nessas circunst�ncias, guardar sil�ncio � um gesto de solidariedade, em especial porque fui bolsista da institui��o por cerca de um ano no fim da d�cada de 1990. Por�m o caso tem servido para desqualificar uma iniciativa que tem m�ritos.
O uso de sondagens de opini�o pelo Ipea � relativamente recente, mas basta ler a nota t�cnica "Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da sa�de" –de 27/03/2014, divulgada juntamente com a pesquisa de opini�o e dispon�vel no site do instituto– para verificar que esse � um instrumento adicional aos tradicionalmente utilizados pela institui��o, que costuma recorrer a informa��es p�blicas ou produzidas por institui��es parceiras.
A pesquisa de opini�o tem a finalidade de verificar a evolu��o do que pensa a popula��o acerca de temas civilizat�rios que s�o alvo de diversas pol�ticas p�blicas desde a redemocratiza��o, como a Lei Maria da Penha, as delegacias de mulheres, a uni�o civil gay, as cotas raciais, o Estatuto da Crian�a e do Adolescente. Com mais acertos do que erros, elas s�o tipicamente o que se chama de pol�tica de Estado.
A sondagem mais recente mostra que, no que se refere a quest�es de g�nero e sexualidade a a��o do poder p�blico, bem como da sociedade em geral, tem dado resultados. A despeito de varia��es conforme a escolaridade, a renda, a idade, a religi�o, a origem urbana ou rural etc., o retrato � de uma sociedade em transi��o: ainda machista e conservadora, por�m mais consciente de direitos individuais e da necessidade de combater mazelas hist�ricas de uma na��o em constru��o.
Por exemplo, a imensa maioria das pessoas (91%) concorda total ou parcialmente com a frase "homem que bate na esposa tem que ir para a cadeia". No entanto, 63% dos entrevistados concordam com a afirma��o de que "casos de viol�ncia dentro de casa devem ser discutidos somente entre os membros da fam�lia".
O homem ainda � visto como o chefe da fam�lia, mas n�o tem direitos irrestritos sobre sua mulher. A mulher "deve se dar ao respeito", por�m deve se proteger e aos filhos, sendo o div�rcio uma solu��o aceita para problemas no casamento.
� um avan�o que pouco mais da metade dos entrevistados acredite que casais gays devem ter os mesmos direitos dos heterossexuais, embora 59% concordem que "incomoda ver dois homens, ou duas mulheres, se beijando na boca em p�blico".
O cruzamento dos dados da nota t�cnica –por exemplo, ao constatar que a chance de abusos cresce em raz�o da baixa escolaridade da v�tima e de sua proximidade com o agressor– com os da pesquisa de opini�o permite avaliar os resultados de pol�ticas p�blicas e sugerir poss�veis novas prioridades.
Tenho d�vidas se a sondagem de opini�o n�o ganhou demasiada centralidade. Ainda assim, n�o entendo por que houve tanta celeuma em torno dela. Tem sido comum, inclusive na Folha, o argumento de que ela revelaria um outro problema, o da atual politiza��o da institui��o. No entanto, nos anos de 1990, o Ipea fez, por exemplo, diversos trabalhos sobre as privatiza��es. � natural, pois essa era uma prioridade dos governos da �poca. N�o vejo problema em mudar os focos.
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