� economista do BNDES. O artigo n�o reflete necessariamente a opini�o do banco.
O prim�rio e a Constitui��o
O governo federal anunciou uma meta de superavit fiscal prim�rio para este ano de 1,9% do PIB. Isso ocorreu mesmo com as redu��es das expectativas de crescimento real e do prim�rio de Estados e munic�pios. Para tanto, foram anunciados cortes de R$ 44 bilh�es nas expectativas de despesas, dos quais R$ 30 bilh�es em itens discricion�rios.
A rea��o do dito "mercado" foi positiva. Sua l�gica � pressionar por juros (ganhos de baixo risco) mais altos e por mais poupan�a p�blica para pag�-los (o prim�rio).
N�o deixaram de ser feitas cobran�as sobre itens que estariam subestimados, como o subs�dio �s t�rmicas, e alertas de que os ajustes ser�o acompanhados "m�s a m�s". Por�m, h� confian�a de que, ante a amea�a de rebaixamento da classifica��o de risco do pa�s, ser� entregue um superavit prim�rio substancial.
No Brasil os an�ncios de ajuste fiscal t�m algo de teatral. A receita convencional prega o corte de despesas, especialmente as correntes, para que o Estado abra espa�o para o mercado "fazer sua m�gica".
No entanto, na pr�tica, a rigidez dos gastos p�blicos faz com que o ajuste somente seja poss�vel pelo aumento de receitas (extraordin�rias ou via eleva��o de al�quotas tribut�rias) ou pelo corte dos investimentos. � claro que, na dividida entre ideologia e interesse, o "mercado" se satisfaz com o segundo.
Dois motivos explicam tal rigidez. A Constitui��o vincula boa parte das receitas da Uni�o a transfer�ncias para Estados e munic�pios e a gastos com educa��o e seguridade (sa�de, previd�ncia e assist�ncia social). Ademais, � estreita a margem para conter despesas contratuais, como benef�cios previdenci�rios concedidos e sal�rios dos servidores, e para comprimir os gastos (obrigat�rios) com educa��o e sa�de, sob risco de desorganizar sistemas que t�m penosamente se estruturado.
At� 1994, o ajuste pelas despesas era facilitado porque a simples posterga��o dos pagamentos p�blicos trazia grandes ganhos pela corros�o inflacion�ria.
Ap�s a estabiliza��o, a sa�da foi usar a previs�o constitucional das contribui��es sociais. Criadas para dar lastro ao novo conjunto de direitos universais, elas t�m requisitos legais menos duros, como dispensar o princ�pio da anuidade, e, principalmente, n�o precisam ser divididas com Estados e munic�pios.
Assim, a partir da segunda metade dos anos 1990, as contribui��es sociais viraram um instrumento de eleva��o da carga tribut�ria, em especial das receitas federais.
Mas, como as contribui��es se destinam ao gasto social, foi preciso editar emendas constitucionais (Desvincula��o de Receitas da Uni�o, DRU) que desde 1994 t�m liberado provis�ria e sucessivamente a aplica��o de 20% das receitas federais.
Assim, foi poss�vel usar o aumento de arrecada��o para atingir expressivos superavit prim�rios. Como destaca minha colega Erika Ara�jo, com quem discuti esta coluna, a partir de 1999 as contribui��es sociais cresceram � frente de suas despesas vinculadas, gerando excedentes anuais de at� dois pontos percentuais do PIB.
Ap�s 2005, o crescimento e, assim, a melhora da situa��o fiscal -que, para o padr�o mundial, continua confort�vel, considerando a rela��o com o PIB do deficit nominal (3,3%), da d�vida p�blica bruta (57%) ou da d�vida l�quida (34%)- permitiram reduzir o desvio de uso das contribui��es do financiamento aos gastos sociais.
Como mostrou Samuel Pess�a, em sua coluna do dia 16, de 1999 a 2013, o gasto federal subiu 4,5 pontos percentuais do PIB. A alta foi em gastos diretos, pois as despesas com pessoal, incluindo aposentados, e o custeio administrativo ca�ram 0,7 ponto percentual.
Por certo, h� crit�rios de benef�cios que podem ser revistos, o que daria algum ganho fiscal, casos do seguro-desemprego e das pens�es por morte, al�m de subs�dios, como a desonera��o da folha salarial de servi�os e bens n�o transacion�veis. Mas, como regra, os gastos sociais s�o justos e efetivos.
Esse � o pacto criado pela Constitui��o. Mais que uma peti��o de princ�pios, ela buscou prover instrumentos para construir um pa�s mais equilibrado, conforme preocupa��es e dificuldades da �poca. Tais instrumentos podem ser rediscutidos. Mas hoje nenhum governo teria grande margem para cortar despesa.
Tomara que, supondo a carga tribut�ria est�vel, n�o se comprimam os investimentos para satisfazer a fome de ajuste do "mercado".
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