� economista do BNDES. O artigo n�o reflete necessariamente a opini�o do banco.
A armadilha da parcim�nia
Um dos valores morais que mais prezo � a parcim�nia. Como o conhecimento humano � limitado, mesmo potente, ele n�o elimina o desconhecimento. Assim, a parcim�nia, sem ser interdi��o � realiza��o das coisas, confere uma saud�vel dose de d�vida sobre nossas convic��es e a��es.
Por exemplo, n�o sou militante das causas ambientais. Mas desde crian�a aprendi facilmente h�bitos como n�o deixar l�mpadas e aparelhos ligados sem necessidade. Mais tarde, a poupan�a, ao menos para quem n�o tem renda baixa, mostrou-se algo que d� estabilidade � vida, o que me faz n�o ser perdul�rio.
Em raz�o disso, h� quem considere incoerente minhas cren�as macroecon�micas, que defendem que o Estado deve, por meio do gasto p�blico, minorar os impactos adversos do ciclo de neg�cios. Ou seja, a receita para combater crises � a contr�ria da pregada pelos economistas ortodoxos, que enfatizam ajuste fiscal, controle estrito da infla��o, flexibiliza��o de leis trabalhistas etc.
De fato, h� nisso algo paradoxal. A explica��o para isso foi dada por Keynes, que mostrou que a macroeconomia n�o pode ser reduzida totalmente aos fundamentos do comportamento microecon�mico.
Foi H�lio Schwartsman quem me apontou que isso n�o se restringe � economia. Em sua coluna de 11/10/2012 no site da Folha, ele mostrou que a emerg�ncia -propriedade de sistemas complexos que faz com que o todo tenha caracter�sticas que n�o se verificam nas partes- � um fen�meno verificado em diferentes ci�ncias.
Um exemplo � o avi�o: nenhuma das partes � capaz de voar por si s�, mas o todo, sim. Um feixe de neur�nios tem propriedades que n�o se veem em neur�nios isolados. O c�rtex, em intera��o com outras partes do enc�falo e do corpo, apresenta caracter�sticas, como a consci�ncia, que n�o h� em feixes de neur�nios.
Nas ci�ncias naturais, mesmo que ainda n�o se saiba a raz�o de uma emerg�ncia, n�o h� d�vida da sua exist�ncia. N�o se tenta reduzir o genoma ao gene.
Ao contr�rio, nas ci�ncias sociais, � comum falar de fam�lia ou mercado como se fossem composi��es indistintas de seus indiv�duos.
Na economia moderna, a emerg�ncia tem causa conhecida, ainda que n�o amplamente aceita, dada pela moeda. Ativo central das rela��es econ�micas, emitido pelo Estado e cujo valor � fiduci�rio (n�o h� lastro), a moeda e o cr�dito s�o os respons�veis por alavancar a economia com rapidez se as expectativas s�o de demanda para as empresas.
Por outro lado, quando h� pessimismo, o ref�gio que os agentes encontram na moeda como reserva de valor faz com que a revers�o do ciclo tamb�m seja mais aguda, pois esse � um ativo que n�o necessita de trabalho para ser produzido (seu custo de produ��o � �nfimo).
A economia monet�ria de produ��o ressalta duas caracter�sticas da emerg�ncia: alavancar a realidade, fazendo coisas surgir, e tamb�m deixar os sistemas mais vol�teis.
A diverg�ncia existe porque a ortodoxia n�o reconhece tal propriedade da moeda, que � tratada como neutra. Quer dizer, ela facilita as trocas, mas em ess�ncia uma economia monet�ria n�o se diferencia de uma feira de escambo.
Se pre�os e sal�rios s�o livres, o mercado se ajusta at� obter o pleno emprego. A poupan�a agregada � fruto da absten��o de consumo da sociedade, em vez de ser o resultado final (a emerg�ncia) do processo de gera��o de renda desencadeado pelo investimento. Empreendedorismo e propens�o a poupar s�o os principais determinantes do dinamismo econ�mico. O governo n�o deve interferir na economia para tentar mudar isso, pois o resultado somente seria infla��o. Como uma dona de casa, ele n�o deve gastar mais do que ganha (arrecada).
Keynes, por�m, pontuou que pre�os e sal�rios s�o r�gidos para baixo. Diante disso, os economistas ortodoxos prop�em as reformas micro como a forma de adequar a realidade � sua teoria, tentando criar as condi��es para que o comportamento racional prevale�a, como na ideia do homo economicus, aquele perfeitamente informado, que busca seus interesses de modo preciso.
Os heterodoxos buscam lidar com as possibilidades e os riscos que a emerg�ncia traz. O papel contrac�clico do Estado � crucial: gerar deficit quando os neg�cios est�o fracos e conter a demanda no aquecimento. Na d�vida, � bom ter em conta que errar quando a economia esfria tem efeito pior (desemprego) do que no caso oposto, cujo malef�cio � apenas a infla��o.
� o caso de ser parcimonioso com a parcim�nia. Exagerada e deslocadamente, ela produz sofrimento sem necessidade.
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