� professor-doutor de Comunica��o Digital da ECA da USP. Trabalha com internet desde 1994. Hoje � consultor em inova��o digital.
A verdadeira tecnologia vest�vel
A vestimenta � uma das primeiras inven��es do homem. � tamb�m uma das mais difundidas, criativas e variadas formas de materializa��o de ideias. Ao dar ordem ao caos de fibras na forma de tecidos delicados, resistentes, bonitos e coloridos, ela � um fator de distin��o em diversas sociedades. Era natural que, ao longo da hist�ria, recebesse investimentos para descobrir e aprimorar suas t�cnicas.
A hist�ria da tecnologia �, sob muitos aspectos, uma hist�ria t�xtil. Os processos de tecelagem e pigmenta��o inauguram os casos de propriedade, segredo e espionagem industrial. A Rota da Seda marca um dos primeiros esfor�os de diplomacia comercial. A pr�pria Revolu��o Industrial, evento que iniciou a corrida tecnol�gica contempor�nea, surgiu com a cria��o de m�quinas para automatizar teares.
"Texto" e "tecido" s�o palavras que derivam da mesma origem. Quando associadas, elas remetem ao ato de construir o racioc�nio a partir de filamentos de ideias. Express�es como "fio da meada" descrevem encadeamentos de argumentos. O conjunto de vis�es de mundo � compilado em linhas de pensamento essenciais para a defini��o do tecido social. O temo "fabric" �, at� hoje, usado na l�ngua inglesa para se referir tanto a ind�strias quanto a tecidos.
At� os anos 1970 a ind�stria t�xtil era reconhecida por suas inova��es tecnol�gicas. Nomes como Lycra, Nylon, Rayon e Velcro n�o eram t�o diferentes das marcas de acess�rios eletr�nicos contempor�neos. Mas com o tempo a inova��o foi assimilada e deu lugar a novas ideias coloridas.
Na mesma �poca em que "sint�tico" se transformou em sin�nimo de t�xico", a ideia de novas tecnologias foi transferida para c�rebros eletr�nicos e telas brilhantes. Fibras, vendidas por atacado e enfrentando pirataria por todos os flancos, tinham perdido sua "aura" de modernidade.
Isso n�o significa que a ind�stria t�xtil tivesse parado no tempo. O melhor exemplo de sua capacidade est� no traje portado pelos primeiros astronautas. Mistura de alfaiataria de precis�o com tecnologia de ponta, ele era uma verdadeira nave port�til.
No mundo cotidiano, tecnologias invis�veis criam roupas que n�o cheiram, n�o sujam, repelem �gua e insetos, protegem contra raios UV, refrescam ou esquentam conforme a necessidade. Mas como elas n�o tem displays nem falam com o smartphone, ainda s�o consideradas meras roupas.
A consequ�ncia dessa confus�o fica evidente no que hoje se chama de tecnologia "vest�vel". Em vez de analisar a qualidade t�cnica da vestimenta que cobre o corpo, revistas de moda e grifes internacionais dedicam p�ginas e passarelas a trambolhos amarrados no corpo, empanturrando bolsos, perturbando as rela��es sociais e chorando por suas baterias com uma frequ�ncia de fazer inveja a beb�s desmamados.
Mas isso est� para mudar. A destrui��o criativa e a reacomoda��o de boa parte das ind�strias promete devolver aos artes�os da costura o glamour e a import�ncia que um dia tiveram os alfaiates, costureiras e revistas de moldes. Da mesma forma que a revolu��o nas comunica��es devolveu �s pessoas o poder de m�dia - com efeitos controversos, vale ressaltar - a tecnologia t�xtil promete devolver aos comuns o poder da moda.
O Projeto Jacquard, do Google, � uma tentativa de criar tecidos conectados, que podem ser costurados a qualquer tipo de roupa. Quando o sensor est� incorporado na fibra, fica mais dif�cil separar a roupa da tecnologia.
A confec��o Under Armour deixou clara uma vis�o poss�vel desse futuro em seu v�deo-conceito Future Girl, em que a atriz abre uma gaveta com uma pilha de roupas aparentemente id�nticas e veste uma delas. A roupa rapidamente toma a forma do corpo e transmite sinais vitais para uma janela, que prepara um programa personalizado de gin�stica.
A mesma roupa � adaptada para se transformar em um traje colorido de corrida, capaz de medir tempo, dist�ncia e resposta do corpo. Tudo de forma intuitiva, autom�tica e personalizada.
Ainda em prot�tipo, essa nova tecnologia n�o dever� chegar �s casas t�o cedo. Mas quando finalmente vingar, dever� provocar uma grande revolu��o nos h�bitos pessoais, dos cuidados com a sa�de aos tamanhos dos arm�rios nas casas.
Ela tamb�m poder� significar uma excelente not�cia para o meio-ambiente, uma vez que as novas nanofibras dever�o reduzir a enorme quantidade de algod�o tingido que ainda hoje � usada em camisetas, bolsas, sof�s e panos de ch�o.
Tecidos, mais do tecnologias, s�o parte fundamental da identidade social. Reduzi-los a suas propriedades funcionais � ignorar sua import�ncia cultural. Novas ind�strias prometem, com suas descobertas, mudar a vis�o que hoje se tem das din�micas sociais para horizontes muito al�m do que pode supor a nossa v� tecnologia.
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