� professor-doutor de Comunica��o Digital da ECA da USP. Trabalha com internet desde 1994. Hoje � consultor em inova��o digital.
A crise de todas as idades
Antigamente a prerrogativa era masculina. �s mulheres, como sempre, sobrava o argumento dos horm�nios. Pouco importasse o g�nero, a crise s� poderia ocorrer na meia-idade, por mais que na �poca n�o se cogitasse viver um s�culo.
Proposta em 1965, a ideia de crise aos 50 costumava descrever o momento esclarecedor (e deprimente) em que o indiv�duo tomava consci�ncia de sua mortalidade e percebia que j� tinha passado da metade de seu tempo de exist�ncia.
Vinte anos depois, a meia-idade � mais complicada. Homens podem usar Viagra e ter mais cabelos brancos do que pretos, e mulheres podem sofrer ondas de calor, mas n�o � dif�cil encontr�-los em restaurantes e bares como se tivessem a idade de seus filhos.
Ao mesmo tempo, a press�o para que os jovens "fa�am sucesso" cada vez mais cedo leva muitos a entrarem em crise mais r�pido do que as gera��es que os antecederam. O resultado � um conflito de valores e dire��es que hoje atinge todas as idades. Sua v�timas n�o costumam ser capazes de identificar suas origens nem os fatos que as desencadearam. Seu comportamento, no entanto, � bem parecido com o dos velhos em crise. Por mais maduros que se sintam, muitos se lan�am em aventuras para "viver o momento" da forma mais radical poss�vel.
Entre eles n�o h� uma clara defini��o de rumo, mas a vontade de mudan�a � clara. � preciso mudar o estilo de vida, a apar�ncia, reavaliar as rela��es afetivas e os objetivos de vida. As coisas que sempre foram desejadas precisam ser conquistadas o quanto antes, e o momento ideal parece ser agora.
Hoje, em qualquer idade entre 25 e 55, muita gente se sente entediada, sem validade, sem significado e com um sentimento terr�vel de que o rel�gio continua a correr em dire��o ao final. Como Shirley Valentine ou Elizabeth Gilbert, muitos querem deixar carreiras, relacionamentos e vidas em nome de algo que n�o s�o capazes de definir, e que talvez encontrem em uma viagem pelo mundo.
A d�cada dos 30 costuma ser a que concentra a maior carga de ansiedade. A transi��o de uma (suposta) juventude leve e despreocupada para um ambiente mais "adulto" pode quebrar at� os mais confiantes. A sensa��o repentina de falta de rumo e inseguran�a com rela��o � carreira e aos relacionamentos faz com que jovens que estejam na fase que Jung chama de "a tarde da vida" sintam uma inesperada ang�stia e d�vida com rela��o ao porvir.
Os 30, que at� h� pouco simbolizavam o in�cio da vida adulta, foram transformados em uma esp�cie de linha de chegada, como se todos morressem aos 40. Ao se darem conta do pouco que fizeram com rela��o ao que imaginavam, muitos se questionam se esse ser� o seu destino final. E se sentem velhos e novos ao mesmo tempo.
Boa parte dessa insatisfa��o vem da falsa ideia de que � preciso ter tudo "resolvido" em uma determinada idade, ang�stia complicada pela compara��o com os personagens expostos no Facebook, que parecem viver uma vida t�pica de comercial de margarina.
Enquanto a crise da meia-idade costuma rever a vida com um leve arrependimento, a crise dos mais novos est� relacionada ao prop�sito. N�o se procura ter uma Ferrari ou um namorado d�cadas mais novo, mas viver uma vida mais simples, aprender a tocar um instrumento, fazer uma tatuagem, praticar algum esporte radical e, acima de tudo, fazer do mundo um lugar melhor. Acima de tudo, muitos querem sair de onde est�o em busca de significado, mesmo que n�o tenham a menor consci�ncia de para onde querem ir.
A crise � normal. Nenhuma personalidade biografada em seu sucesso foi transportada magicamente de uma vida med�ocre para o estrelato. Se bem interpretada, boa parte da situa��o est� mais para transi��o do que para uma crise, uma �poca em que se abandonam as ideias descabidas de como sua vida pode ser instantaneamente fant�stica para uma vis�o mais pragm�tica do mundo.
O tempo corre em linha reta e nunca mais seremos jovens, inocentes e sonhadores novamente. Por isso � preciso desenvolver uma nova percep��o da fragilidade e inconst�ncia da vida. A melhor forma de faz�-lo � abandonar o comportamento masoquista e se divertir mais. Acreditar mais no futuro, deixar de ser t�o duro consigo mesmo, parar de idealizar o passado e o futuro e passar a viver no presente.
Acima de tudo, � preciso parar de se permitir ser ca�tico e pensar demais a respeito de tudo, enquanto se come�a a fazer as coisas que realmente alegram. Como fazem seus pais e av�s, deixar indecis�o, nostalgia e desilus�o para tr�s e viver a vida que vale a pena ser vivida. Pra que esperar at� os 70 para descobrir algo que poderia ter sido descoberto aos 15?
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