� professor-doutor de Comunica��o Digital da ECA da USP. Trabalha com internet desde 1994. Hoje � consultor em inova��o digital.
Errados est�o os outros
M�dia social n�o � m�dia. � uma forma de express�o pessoal. Aparentemente democr�tica e extremamente popular, ela pode ser vista como medidor de certos aspectos da opini�o p�blica ou como um term�metro da popularidade de determinados produtos ou servi�os. Mas cham�-la de m�dia � um exagero t�o grande quanto atribuir contexto sociol�gico a uma fofoca ou analisar a situa��o econ�mica de um pa�s atrav�s do Tinder.
O mercado publicit�rio adora chamar Facebook de m�dia social porque assim pode realocar as verbas milion�rias de seus clientes para os novos canais, em busca de novos trouxas que cliquem nas mesmas velhas piadinhas retr�gradas e caiam nas mesmas velhas armadilhas de mercadores inescrupulosos em busca de retornos cada vez maiores para investimentos p�fios.
M�dia que mere�a o nome � uma institui��o de respeito e credibilidade, coisa que n�o se pode atribuir aos powerpoints do Slideshare ou aos textos de autoajuda corporativa distribu�dos pelo Linkedin. Acima de tudo, m�dia implica uma responsabilidade social com rela��o ao assunto relatado, que precisa ser analisado e descrito de forma minimamente imparcial.
Mesmo quando a m�dia � claramente parcial –como diversos grandes ve�culos brasileiros exemplificaram nos �ltimos tempos– ela precisa manter uma apar�ncia de neutralidade m�nima, sob o risco de sofrer a��es judiciais que possam levar a graves preju�zos financeiros ou, no pior dos cen�rios, perder completamente a sua reputa��o, recuando para nichos cada vez menores de p�blicos espec�ficos at� que seja abandonada por leitores e anunciantes.
Desenvolvida originalmente como uma ferramenta para melhorar a comunica��o digital, a m�dia social vem se transformando em uma gigantesca exposi��o p�blica do individual, n�o do coletivo, cada um desesperado para estar mais verdadeiro, belo e bom do que os outros que o cercam. Travestidos de m�dia, os usu�rios de redes sociais n�o procuram conversas, mas plateias. N�o querem saber de debates, querem f�s. Em �ltima inst�ncia, os "amigos" do Facebook n�o querem saber de amigos, mas de uma corte que aplauda de p� cada um de seus pequenos atos.
T�o vazios e in�teis quanto as "celebridades" que imitam, os �cones da rede social chamam a aten��o pela pol�mica vazia e pela virul�ncia de um discurso de �dio, raso, discriminat�rio, desrespeitoso e, em �ltima inst�ncia, bastante perigoso. Ao pregar a dissolu��o institucional de tudo o que est� por a� sem oferecer nada sustent�vel em troca, ele �, na maioria das vezes, t�o reacion�rio quanto o pior cl�rigo fundamentalista.
Empresas privadas, financiadas por investidores e a��es em bolsas, as grandes redes tem valores muito diferentes dos que levaram � constru��o da Internet que as abriga. Derivadas da ind�stria de entretenimento, sua filosofia n�o � muito diferente daquela que � aplicada nos programas de televis�o matutina ou nas revistas de variedades televisivas. N�o h� preocupa��o com qualquer esp�cie de forma��o ou esclarecimento, tudo o que se quer � prender o consumidor � telinha, dar a ele uma ilus�o de que sua opini�o � importante e buscar, sempre que poss�vel, uma nova forma de vender um velho e in�til servi�o, reempacotado.
Mesmo sem ser m�dia (ou talvez exatamente por isso), a m�dia social tem alcance, frequ�ncia, imediatismo e perman�ncia �nicos. Se em parte isso se d� por sua natureza eletr�nica e grande disponibilidade gra�as �s tecnologias m�veis, um aspecto pouco discutido � a total irresponsabilidade do conte�do divulgado por ela.
Da mesma forma que n�o se demanda que um papo de bar cite refer�ncias ou seja imparcial, boa parte do discurso dos grandes botecos da rede � barulhento, emotivo, radical e irrespons�vel. Poderia ser at� c�mico, se n�o fosse levado a s�rio.
Por uma mistura de falta de raz�es com excesso de argumentos, a m�dia social tem a impertin�ncia de um torcedor fan�tico, que aos berros, insiste em declarar que o seu time, com a escala��o de 1978 contra a Ponte Preta, foi o melhor do mundo.
Instrumento de conversa��o, relacionamento, presen�a, compartilhamento e reputa��o, a m�dia social tem tudo para ser o verdadeiro ambiente de manifesta��o de identidade em um futuro pr�ximo. Mas para isso � preciso us�-la mais e melhor, compreendendo seu valor e verdadeiro tamanho.
H� muito de realidade no virtual, da mesma forma que h� muito de virtualidade no que se convencionou chamar de realidade. N�o se pode culpar a m�dia social por preconceitos ou radicalismos que a precedem ou que, como a histeria quanto � liberdade de manifesta��o de g�nero, n�o tem nada a ver com ela. A m�dia social n�o � um espa�o ideol�gico, da mesma forma que n�o � um ambiente tecnol�gico. Ela � um ambiente de relacionamentos que, como um bar ou uma praia, pode levar a uma grande mudan�a, mas precisa ser relativizado.
Enquanto ela � nova, ainda leva-se a s�rio demais o que � dito, compartilhado e analisado por ali. Por mais que tenham acelerado e catalisado, elas n�o inventaram o fiasco que se deu nas ruas no final de semana que passou. A indigna��o � resultado de um processo de longa data que n�o se resolver� atrav�s de uma canetada ou solu��o messi�nica. Quem acredita em milagres tende a morrer � sua espera.
Livraria da Folha
- Cole��o "Cinema Policial" re�ne quatro filmes de grandes diretores
- Soci�logo discute transforma��es do s�culo 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD re�ne dupla de cl�ssicos de Andrei Tark�vski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade