� professor-doutor de Comunica��o Digital da ECA da USP. Trabalha com internet desde 1994. Hoje � consultor em inova��o digital.
Ribossomos digitais
A fabrica��o digital est� cada vez mais pr�xima da realidade. Munidos de impressoras 3D, scanners e algoritmos cada vez mais detalhados e precisos, equipamentos industriais buscam romper as barreiras entre os mundos digital e f�sico, em um processo de cria��o, desmanche e reciclagem de materiais.
A ideia tem ares de alquimia, e o objetivo maior de seus principais desenvolvedores n�o � t�o diferente. Em um mundo de recursos cada vez mais limitados e polui��o ambiental crescente, ningu�m mais pode dar-se ao luxo de criar novos materiais a partir de mat�rias-primas virgens e delegar a seus consumidores a tarefa de cuidar deles at� seu eventual fim, arcando inclusive com despesas de remo��o e descarte ou, quando poss�vel, reciclagem em um processo impreciso, pouco eficiente e raramente completo.
Hoje � impratic�vel acompanhar a cadeia e ciclo de vida de um produto industrial depois que ele deixou a loja. Acompanhar ou controlar o andamento de sua vida �til e manuten��o � praticamente imposs�vel sem gerar grande mal-estar entre seus consumidores. Alguns tentam apelar para a segunda melhor op��o: mont�-los com uma estrutura de f�cil desmanche e recolh�-los de seus antigos usu�rios no final de sua vida �til.
A ideia � simp�tica, mas n�o resolve o problema. Fomos condicionados a buscar aparelhos cada vez mais leves, finos, potentes e baratos quando poss�vel. A sustentabilidade raramente faz parte da conversa. Quando o faz, est� mais ligada ao processo de fabrica��o do que ao de reciclagem. O resultado � a gigantesca quantidade de produtos industrializados em aterros sanit�rios, uma vez que seu processo de fabrica��o, como o de um autom�vel, funde elementos em altas temperaturas e processos qu�micos complexos, tornando a sua decomposi��o praticamente imposs�vel.
Em busca de inspira��o, a Ind�stria recorre � natureza. Em uma floresta que n�o h� lixo. Quando um organismo morre, n�o existe lugar para descart�-lo. Suas partes s�o rapidamente decompostas e reutilizadas em novos materiais. Tudo se transforma, criando um sistema autossuficiente, quase fechado, com grande efici�ncia energ�tica e praticamente nenhum desperd�cio.
Da mesma forma, novos prot�tipos modulares imaginam produtos cujos componentes s�o de certa forma semelhantes a blocos de Lego. Quando conectados, n�o � preciso r�gua; a geometria vem das partes. Gra�as a essa estrutura, qualquer unidade industrial poderia construir objetos enormes, desde que munida de um conjunto de instru��es. Como uma crian�a capaz de criar estruturas a partir de blocos de pl�stico, com grande complexidade e detalhe, mesmo sem ter qualquer habilidade manual espec�fica, essas novas f�bricas poder�o ser gen�ricas e vers�teis, capazes de criar e desmontar o que for necess�rio, conforme a disponibilidade de recursos e demanda de produtos.
Outra vantagem desse processo de fabrica��o estaria, paradoxalmente, em suas restri��es de montagem. Por mais vers�til que seja uma estrutura feita de Lego, h� limites para a quantidade permitida de varia��es. Isso leva uma estrutura feita com esses blocos pl�sticos a ser mais precisa e uniforme do que uma constru��o feita com blocos de madeira. As restri��es de montagem permitem a identifica��o e corre��o de erros durante o processo, interrompendo-o caso necess�rio.
No mundo microsc�pico das organelas celulares, essa estrutura j� existe na forma de ribossomos, pequenas unidades fabris que combinam os cerca de vinte amino�cidos dispon�veis em prote�nas de grande complexidade e a��o espec�fica, em estruturas t�o diferentes quanto m�sculos, neur�nios e sensores de luz na retina. Da mesma forma, os novos processos buscam criar estruturas que, baseadas em nanotecnologia, intelig�ncia artificial e impress�o 3D, sejam capazes de criar, reciclar e recriar as nova tecnologias modernas a partir de praticamente qualquer material original, desde que seja capaz de produzir os componentes microsc�picos necess�rios.
O processo parece fic��o cient�fica, mas tem muitos pontos em comum com a ind�stria que hoje recicla pl�stico, partindo de pol�meros complexos, organizados em estruturas determinadas para criar, a partir deles, as mat�rias-primas posteriormente usadas por outras ind�strias, de forma t�o precisa e transparente que se um dia uma sand�lia velha for reciclada na forma de uma escova de dentes, ningu�m ser� capaz de identificar sua verdadeira origem. Nem ter� porque se preocupar.
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