� professor-doutor de Comunica��o Digital da ECA da USP. Trabalha com internet desde 1994. Hoje � consultor em inova��o digital.
O que h� de errado com eles?
O bate-boca que ocorreu nas m�dias sociais durante as elei��es � o exemplo mais recente de um fen�meno cada vez mais comum: a virul�ncia e o baixo n�vel dos coment�rios feitos por pessoas normalmente bem educadas. O que h� de errado com essa gente?
A democratiza��o da rede trouxe com ela a oportunidade de ampliar a participa��o do leitor, levando o debate para muito al�m do tradicional discurso da m�dia. Muitos comemoraram a "revolu��o" anunciada, uma oportunidade in�dita de participa��o p�blica que criaria discuss�es de maior abrang�ncia e profundidade do que cabia no limitado espa�o da m�dia.
N�o foi bem isso o que aconteceu. O tom das opini�es contraria qualquer ideia de civilidade. Na maioria das vezes, o que se v� s�o minorias antag�nicas gritando umas contra as outras, evitando meios-termos. Ao permitir coment�rios impulsivos, ainda menos deliberados, os dispositivos m�veis pioraram a situa��o.
Boa parte dos protestos n�o se referia ao conte�do, mas ao "direito" do autor em escrev�-lo, buscando desqualific�-lo com os piores argumentos poss�veis. Muitos mal chegaram a ler o texto que criticam, baseando sua interpreta��o no t�tulo e um ou dois par�grafos.
O problema � maior do que um simples bate-boca. A natureza das opini�es tem um grande poder de influ�ncia sobre a interpreta��o do texto, que pode ser tomado como incorreto, tendencioso, panflet�rio ou desatualizado. Isso aumenta a desinforma��o.
O vi�s de interpreta��o sempre foi social. Durante um curto per�odo hist�rico, a m�dia assumiu o papel de int�rprete das not�cias dignas de registro. A princ�pio nas editorias impressas, passando pelos apresentadores dos programas de r�dio e culminando com a figura do �ncora de telejornais, para o qual n�o h� equivalente no mundo real.
Presen�a de autoridade na sala de todas as casas, ele sempre parece saber o que � apropriado dizer, de forma elegante, cautelosa e diplom�tica. Sem ele, ficamos perdidos.
Hoje o consumo da m�dia se transformou. N�o se l� mais o jornal por conta pr�pria, na mesa do caf�. A not�cia � consumida em ambientes compartilhados, em que coment�rios de todo tipo s�o expressos antes e durante a leitura do texto. A interpreta��o n�o � mais individual nem influenciada pelo �ncora, mas coletiva. � natural que gere confus�o.
Na vida real a interpreta��o de sinais sociais � aprendida lentamente. O mesmo acontece nos ambientes on-line de c�digos de conduta restritos, como f�runs t�cnicos e massivos multiplayer. Nas redes sociais tal c�digo ainda est� em constru��o.
O assunto � complexo e cheio de nuances. Ainda mais quando se leva em conta que muito do que garante a receita de ve�culos digitais � a publica��o de an�ncios, determinada pelo volume de leitores que visita uma p�gina. � dif�cil criar uma discuss�o construtiva quando qualquer pol�mica, mesmo que vazia, � muito mais rent�vel.
Algumas tentativas de resolver o problema s� pioram a situa��o. Sua origem n�o est� nas novas tecnologias, mas na falta de estrat�gias de melhorar a qualidade do debate.
A longo da Hist�ria, culturas diferentes costumavam se encontrar em fronteiras. Nos portos, cercas e desertos havia um espa�o e tempo de reflex�o que for�ava o visitante a reconhecer que n�o estava mais em casa, e que portanto deveria se comportar de acordo com regras de civilidade.
Na aldeia global do Facebookist�o as barreiras entre a casa e a rua, o particular e o coletivo, o p�blico e o privado se desfazem, dissolvendo com elas o respeito ao espa�o e valores alheios.
Acredito que seja uma fase de transi��o. Tudo ainda � muito novo. A opini�o dos outros, quando construtiva, � sempre enriquecedora. Mesmo que seja dolorida.
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