� professor-doutor de Comunica��o Digital da ECA da USP. Trabalha com internet desde 1994. Hoje � consultor em inova��o digital.
T� pensando que o dado � teu?
A hist�ria das fotos vazadas � mais complicada e s�ria do que parece. Antes de julgar as atrizes e modelos que tiveram suas contas hackeadas e fotos nuas expostas, vale lembrar que todos cometemos pequenas indiscri��es que, fora de contexto, podem ser interpretadas como repulsivas, engra�adas ou rid�culas.
O maior problema n�o est� na nudez, por mais que se ver pelado frente a desconhecidos seja bastante desagrad�vel. A quest�o que ningu�m parece estar disposto a encarar � a da viola��o de privacidade. Como em um assalto, essa invas�o deixa na v�tima uma paranoia e inseguran�a justamente com aquele que deveria ser o seu porto seguro.
O crime � mais comum do que parece. Os famosos chamam a aten��o, mas basta uma pequena visita a f�runs como o 4Chan, Imgur ou AnonIB para ver uma multid�o de desconhecidos expostos.
O m�todo para encontrar a maioria dos dados � razoavelmente simples: basta descobrir o endere�o de e-mail da v�tima e ativar a recupera��o de senhas, que costuma perguntar coisas f�ceis de descobrir, como nomes de bichos de estima��o e local de nascimento. Celebridades podem ter esses dados mais expostos, mas a maioria das pessoas os disponibiliza alegremente via Facebook ou ao participar de brincadeiras on-line aparentemente ing�nuas, como a de descobrir que nome teria se fosse uma drag queen.
Por mais que figuras p�blicas estejam expostas, � gente comum que precisa ser mais cuidadosa. A legisla��o � extremamente vaga no que diz respeito a dados pessoais, e os contratos gigantescos que todo servi�o digital obriga seus usu�rios a concordar antes de usar –e que ningu�m l�– se isentam de praticamente toda responsabilidade quanto a vazamentos e danos � reputa��o.
A situa��o se complica quando se leva em conta que os dados podem ser interceptados em tr�nsito, como o que aconteceu com a vulnerabilidade "heartbleed", e que a maioria dos servi�os de armazenamento usa t�cnicas de controle de vers�o, que permitem a recupera��o de dados apagados, como as fotos da atriz Mary Winstead.
A concentra��o de dados particulares em servi�os como Dropbox, OneDrive, Google Drive e –a v�tima da vez– iCloud, torna a tenta��o grande para hackers do mundo todo. Por mais que seja dif�cil invadi-los, a recompensa � muito maior do que acessar um telefone de cada vez.
Cada vez que uma falha dessas acontece, todo mundo se apressa em culpar a v�tima, que "n�o deveria ter fotos nuas em seu celular", e em trocar suas senhas, para logo depois relaxar. Sobram posts em blogs, f�runs e redes sociais a lembrar que n�o se deve usar senhas f�ceis ou repetidas, e que n�o se pode armazenar material delicado na nuvem. H� at� quem sugira evitar a resposta honesta a quest�es de seguran�a.
As recomenda��es podem ser sensatas, mas acredito que foquem na quest�o errada. � medida que a internet passa a ocupar papel central em nossas vidas, a pegada digital que cada um deixa � cada vez maior, tornando a descoberta de dados pessoais cada vez mais corriqueira.
A desculpa da falta de seguran�a dos servi�os on-line � que � dif�cil ser, ao mesmo tempo, seguro e amig�vel. Senhas costumam ser encaradas mais como empecilho do que como prote��o, o que leva muitos usu�rios a relaxar no seu uso.
N�o � culpa deles. Mais de trezentos milh�es de pessoas no mundo confiam em servi�os na nuvem, da mesma forma que se confia nos bancos ou na pol�cia. Voc� pode ser solid�rio com o motorista do t�xi se furou o pneu ou acabou a gasolina, mas, em �ltima inst�ncia, o problema n�o � seu.
Registrados em contas de armazenamento ou transa��es comerciais, fornecidos deliberadamente cada vez que se coloca o nome de usu�rio e senha em uma rede social ou coletados de forma passiva em browsers e aplicativos que rastreiam a navega��o, os dados pessoais formam um retrato individual cada vez mais preciso, comercializado livremente para quem se interesse em pagar.
"Big data", vale lembrar, n�o � "Big Oil". A informa��o pertence aos usu�rios, n�o foi vendida por eles para explora��o livre pelos latifundi�rios digitais. Antes de se pensar em qual poder� ser o novo vazamento ou em como se proteger dele, � cada vez mais importante demandar uma seguran�a maior dos fornecedores para que esse tipo de problema n�o ocorra mais.
� sempre bom lembrar que servi�os online n�o s�o gratuitos, mas pagos com cliques e compartilhamentos de dados pessoais. Na Economia da Informa��o, esse � um valor t�o financeiro quanto dinheiro, comercializado em pacotes publicit�rios ou aquisi��es de empresas.
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