� jornalista e consultor na �rea de comunica��o corporativa.
Detox de corpo e alma, com ou sem golpe
H� dois h�bitos, talvez "quase v�cios", que me perseguem praticamente a vida toda: comer e ler.
O primeiro deles vem desde os tempos da adolesc�ncia: comer, comer bem, comer bem no sentido de comida boa, saborosa, caprichada, bem temperada. Este gosto foi evoluindo, ao longo dos anos, para aquilo que passaram a chamar, de forma pern�stica, de "gourmandise", que nada mais � que a arte de comer bem, o prazer de comer bem, buscando a sofistica��o do prazer da degluti��o.
Para quem assume este tipo de pr�tica, sem abandonar antigos h�bitos como a queda por aquilo que o Ruy Castro um dia chamou de "baixa gastronomia" –ou seja, chouri�o, coxinha, ovo empanado, torresmo, empadinha e quetais–, a coisa foge do controle, passa das medidas.
E foi justamente isso que aconteceu nos �ltimos anos: passei das medidas, arredondei, abandonei os meus confort�veis 82, 85 quilos regulamentares e cheguei ao limiar da terceira idade com nada menos que 103 quilos.
Com todos os efeitos delet�rios que isso acarreta: uma pan�a horrorosa, refluxo, sono de p�ssima qualidade, dores no joelho e na lombar, dificuldade para amarrar os sapatos, cansa�o permanente, digest�o demorada, colesterol descontrolado, press�o alta, �cido �rico, glicemia no limite.
Fora as biritas: como recusar um bom Pinot Noir? E a cerveja nos come�os, meios e fins de semana? O u�sque Deward's que aprendi a beber com o velho e bom David Zinng nunca falta na prateleira... E por a� vai. Ou foi, n�o vai mais, porque a medida radical tornou-se o caminho escolhido para o detox corporal. Radical mesmo, porque adotei as pr�ticas do tal m�todo Ravenna, que pelo menos at� agora tem funcionado: j� l� se foram seis quilos em quase um m�s.
Sem passar fome, de fato, mas sem uma gota de �lcool, sem uma colherinha de a��car, sem chocolate, sem massa, sem p�o, biscoito, sem arroz, feij�o, nada que possa se converter em gordura. Ou seja, sem fome, mas com muita vontade comer coisas gostosas. Um sofrimento, claro.
Vale a pena? Segundo todas as informa��es que colhi seguindo meu outro v�cio, que � ler, sim, vale se eu quiser passar com dignidade o �ltimo quarto da minha vida. Ent�o vamos l�, s� faltam uns 12 quilos...
*
Sobre o outro h�bito com o qual tenho "trabalhado" recentemente, este � a mania de ler. Mania, mesmo: desde que consegui ler meu primeiro livro, a hist�ria de um califa que virava cisne, capa azul, edi��o da Melhoramentos, se n�o falha a mem�ria, sempre li de tudo, qualquer coisa: s�o, h� muitos anos, dois ou tr�s livros ao mesmo tempo (n�o na mesma hora, claro), jornais, revistas, an�ncios de qualquer tipo, placa de rua, balan�os, comunicados � pra�a, bula de rem�dio (estas de hoje todas explicadinhas n�o t�m a menor gra�a...), dicion�rios, enciclop�dias, manuais diversos etc.
Jornais, menos hoje em dia; mas, quando estava em plena atividade na carreira jornal�stica, lia ao menos quatro di�rios (Folha, "Estado", "Globo" e "JB") e tr�s revistas semanais. Antes, bem antes, al�m da grande m�dia, lia tamb�m tudo da imprensa alternativa: "Movimento", "Bondinho", "Ex", "Versus", "Pasquim", "Opini�o", "Em Tempo", "Flor do Mal".
E, dando um enorme pulo no tempo, tamb�m me rendi � leitura port�til, eletr�nica e online, que � o grande hosp�cio das redes sociais, em que a velocidade alucinante com que se escreve acaba colocando o leitor-v�tima no centro de um redemoinho atordoante de certezas, cobran�as, abusos e, ok, alguma divers�o.
At� agora, pelo menos, o excesso de leitura nunca comprometeu meu discernimento, gra�as. Ler muito, ler tudo � uma coisa; concordar com quase nada � outra. E � a� que se chega � necessidade do detox. Sorry, � uma urg�ncia como a de perder peso.
Em nome da sa�de. Detox do excesso de leitura que de um tempo pra c� tem feito muito mal, levando � necessidade de dar um basta ou ao menos um tempo na leitura invasiva, agressiva, que te cerca e te oprime qual uma invas�o b�rbara.
E como grita! Grita na radicalidade das colunas, no enunciado das capas de revistas e nos sites de todos os matizes, de qualquer cor ou lado. No destempero de quem chama Dilma de "vaca" e "ladra", na desonestidade de quem quer escamotear a corrup��o nojenta atribuindo-a aos "outros".
A informa��o cedendo � opini�o, o equil�brio sucumbindo � raiva, e at� mesmo o prazer da leitura do que um dia foi o divertido Facebook, o Twitter ou o inofensivo Instagram convertendo-se no chafurdar em rebotalhos de um campo de batalha. Cansou.
*
Independentemente do que ler ou n�o ler mais, minha posi��o eu a tenho e a compartilho com a do ministro do Supremo Marco Aur�lio de Mello, cuja postura, em geral equilibrada, destoa: "O impeachment da presidente Dilma Rousseff n�o vai resolver as crises pol�tica e econ�mica que atingem o pa�s. � uma esperan�a v�. Imposs�vel de frutificar. N�s n�o teremos a solu��o e o afastamento das mazelas do Brasil apeando a presidente da Rep�blica. O que n�s precisamos na verdade nessa hora � de entendimento, � de compreens�o, � de vis�o nacional."
Desculpe, ministro, mas n�o vai rolar. Mas eu tamb�m acredito que "se n�o houver fato jur�dico que respalde o processo de impedimento, esse processo n�o se enquadra em figurino legal e transparece como golpe". O fato jur�dico � a comprova��o de um crime, um crime de responsabilidade.
Se houver crime comprovado, fora Dilma.
Se n�o houver, fora golpe.
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