� jornalista e consultor na �rea de comunica��o corporativa.
A tecnologia a servi�o da ignor�ncia
Dois temas que, esta semana, acrescentaram ainda mais d�vidas sobre a nossa cada vez maior depend�ncia da tecnologia da comunica��o. � a chamada "faca de dois legumes": quanto mais uso internet e telefones espertos para "facilitar" a minha vida, mais alienado posso me tornar, mais me afasto da realidade, mais imbecil posso ficar? Parece que sim.
Veja dois exemplos recentes:
1 - menino de 11 anos ultrapassa a barreira de seguran�a do zoo e vai brincar junto � jaula do tigre, fazer carinho na fera. O pai, uma anta que deveria estar ele sim numa jaula, v�, mas nada faz. E as pessoas que a tudo assistem e que poderiam fazer alguma coisa, fazem sim: filmam a cena com seus celulares.
Ou seja, o ser humano moderno tende a enxergar a realidade apenas como uma possibilidade de compartilhamento virtual; a realidade s� existe para que eu possa existir nas redes sociais, � isto.
Salvar o menino n�o resultaria em nenhum "curtir" ou compartilhamento, n�o vou perder tempo com isto!
Mas o filminho do menino brincando com o tigre e sendo atacado pela fera na rede, ah, isto sim aumenta meu n�mero de seguidores...
Na internet as cenas s�o realmente impressionantes e mereceram milhares de "likes".
J� na vida real, o menino teve seu bra�o amputado...
2 - Um disputado restaurante de Nova York constatou que as reclama��es de seus clientes aumentaram muito nos �ltimos tempos. A frequ�ncia continuava boa, a comida aparentemente ainda agradava, mas muita gente passou a reclamar do atendimento, do tempo de espera, da qualidade do servi�o.
Os donos do restaurante recorreram a uma consultoria para resolver o problema. Como o estabelecimento possui diversas c�meras de vigil�ncia interna, a consultoria resolveu pegar um filme de anos atr�s e comparar um atual para ver se encontrava alguma coisa errada. E encontrou.
No v�deo antigo, as pessoas chegavam, eram recebidas pelo recepcionista, encaminhados para a �rea de espera (quando era o caso), recebiam drinques, minutos depois eram chamados � mesa, faziam seus pedidos, comiam, pediam a conta, pagavam e iam embora. Tempo m�dio de perman�ncia no local: 1h.
No v�deo recente, a maior parte dos clientes j� chegava ao restaurante com o celular em punho. Antes mesmo de falar com o recepcionista, digitavam, tiravam fotos, postavam nas redes sociais sua localiza��o e coisas do g�nero.
Quando eram chamados � mesa, alguns ainda permaneciam no mesmo local, porque estavam muito ocupados digitando seus posts. J� sentados, em vez de olhar o card�pio e escolher, mais posts, mais fotos, mais tec-tec-tec, os quais continuavam enquanto os pratos n�o chegavam.
Quando a comida estava � mesa, antes de desfrutar de suas qualidades gastron�micas reais, de degustar seus ingredientes, aproveitar o bom da vida, mais fotos dos pratos, dos pr�prios e os dos companheiros, fotos dos amigos com os pratos, pedidos aos gar�ons para tirar fotos deles, dos amigos e dos pratos, e por a� vai.
Ao longo da refei��o, esta era interrompida a todo instante para que o cliente pudesse, claro, postar mais uma coisa ou outra, quem sabe uma avalia��o online e em tempo real das qualidade do bife que estava comendo.
Ao fim do regabofe, antes de pedir sobremesa, caf� ou conta, mais posts, mais fotos, mais cliques.
Conta finalmente paga, mais uns posts antes de levantar e ceder o lugar para quem estava esperando (ou postando fotos...) na entrada do restaurante.
Conclus�o: desde o surgimento dos smart (!) phones, o tempo de perman�ncia m�dio no restaurante praticamente dobrou, passou de 1h para 1h55.
Ou seja, os respons�veis pela "piora" do atendimento eram na verdade os pr�prios clientes, que em vez de apenas desfrutar uma boa refei��o, viajavam na realidade paralela para a qual a tecnologia frequentemente nos arrasta.
Talvez os clientes nem lembrem do que comeram. Mas tudo bem, n�o � mesmo?, afinal est� tudo postado, � espera de um "like"...
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