Ex-secret�rio de Reda��o da Folha, jornalista, coautor de 'Como Viver em SP sem Carro', faz pesquisas no Warburg Institute, em Londres, com o apoio da Capes. Escreve �s segundas.
Hoje � dia da maldade, de gente dilacerada na rua
Edu Silva - 14.jul.2017/Futura Press/Folhapress | ||
Acidente na av. Bandeirantes (zona sul de SP) em julho; o comiss�rio de bordo Alexandre Stoian morreu |
Hoje vai ser mais um dia violento nas ruas: cerca de 50 pessoas ser�o vitimadas, dez por atropelamentos. Mais de dois paulistanos v�o morrer no tr�nsito. Em dois ou tr�s dias, S�o Paulo vai produzir mais v�timas que o recente ato terrorista de Barcelona. Mas isso n�o vai causar como��o. Nos acostumamos com a chacina di�ria, como se ela fizesse parte da normalidade da vida, seus n�meros n�o tiram sono.
No Brasil, os mortos no tr�nsito s�o cerca de 40 mil por ano; mais de 200 mil feridos. Em 2016, 854 paulistanos morreram e 19.235 ficaram feridos.
Esses n�meros deveriam ser suficientes para virar o est�mago de qualquer cidad�o. Eles revelam uma trag�dia nacional. Os Estados Unidos est�o at� hoje com a Guerra do Vietn� entalada na garganta. � um dos maiores traumas nacionais. Pois todo o per�odo de envolvimento dos EUA, 20 anos, tirou a vida de 60 mil norte-americanos. � 1,5 ano de tr�nsito brasileiro.
H� muitos dados e muitas formas de analisar a quest�o, mas come�o pelo mais gritante: a viol�ncia no tr�nsito � um crime de g�nero. Os homens s�o respons�veis por 85% dos acidentes com v�timas. Quer dizer que 16,3 mil em SP foram v�timas de machos armados (com um ve�culo).
O sexo masculino se revela ainda mais perigoso quando olhamos os casos fatais: a propor��o sobe para 93% dos acidentes com mortes. Ou seja: 794 mortes no tr�nsito de S�o Paulo em 2016 foram causadas por homens.
H� outros n�meros que chamam aten��o por indicar que a viol�ncia do tr�nsito tem uma forte liga��o com (maus) h�bitos da sociedade: os dias mais letais s�o sexta e s�bado e o m�s mais violento � dezembro. O aumento de acidentes coincide com o lazer.
O pa�s precisa discutir essa rela��o, entender como mudar o padr�o. A boa not�cia � que se trata de um problema com grande potencial de melhora entre todas as mais graves mazelas nacionais: o fato de se tratar de um crime com caracter�sticas t�o bem definidas, comportamentais, facilita o planejamento de campanhas educativas e a��es para mudan�a de h�bitos, como foram outras em nossa hist�ria recente.
Afinal, nos �ltimos 25 anos, o Brasil deu exemplo ao mundo quando interrompeu a progress�o da Aids ou reduziu o consumo de cigarros. Menos brasileiros morrem agora dessas duas doen�as.
Para isso, � preciso fazer a��es permanentes, de vez em quando n�o basta. A Prefeitura de S�o Paulo inicia uma campanha nesta semana e promete torn�-la constante. Vamos ver se ela causa impacto. Publicidades educativas devem ser feitas para convencer. H� casos de sucesso mundial, como o da Austr�lia (imagens muito chocantes), que podem inspirar as nossas. As que temos visto por aqui s�o como placebo: s� fazem efeito em quem j� est� convencido.
Tamb�m a��es de controle do comportamento dos motoristas, especialmente durante o fim de semana (como blitz com baf�metro), deveriam ser multiplicadas. Embora o prefeito Doria tenha feito a campanha eleitoral muito centrada no ataque ao que chamava de "ind�stria da multa", um aumento de fiscaliza��o de cinco regras bem conhecidas (queimar faixa de pedestres; acelerar no sinal amarelo; desrespeitar o vermelho; usar o celular e excesso de velocidade) pode melhorar o respeito geral.
Se nada disso der certo, proibir os homens de dirigirem na cidade pode eliminar 90% dos acidentes.
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