Ex-secret�rio de Reda��o da Folha, jornalista, coautor de 'Como Viver em SP sem Carro', faz pesquisas no Warburg Institute, em Londres, com o apoio da Capes. Escreve �s segundas.
A pra�a da Bandeira envergonha a Bandeira Nacional
Divulga��o | ||
Fotografia do italiano Marco Maria Zanin, em exposi��o na Jana�na Torres Galeria |
A grande pra�a central de S�o Paulo marca o momento em que as avenidas Nove de Julho e 23 de Maio se juntam no cora��o da cidade, o Anhangaba�. Quem olha para o alto v� ondular ao vento o "lindo pend�o da esperan�a", "s�mbolo augusto da paz", cuja "nobre presen�a � lembran�a, a grandeza da p�tria nos traz", como dizem os versos do Hino � Bandeira, que d� nome ao local.
Mas quem move os olhos, da grande bandeira sobre o mastro, em dire��o ao ch�o, v� um cen�rio deserto de vida, uma mistura de tons de cinza, claro do concreto e escuro do asfalto, e o colorido de centenas de �nibus empacotados. Constata ent�o que a "pra�a" da Bandeira �, na verdade, uma garagem de �nibus privados ocupando um espa�o p�blico que poderia formar, com o Anhangaba�, um grande corredor democr�tico, misturando o umbigo paulistano com o s�mbolo p�trio.
Mas a "pra�a" da Bandeira, em vez, simboliza o que houve de mais tr�gico e vergonhoso no urbanismo local: a cont�nua submiss�o de pra�as e parques � condi��o de suporte de avenidas e viadutos de concreto que consagraram o interesse da ind�stria automobil�stica sobre a dimens�o humana. Em vez de homenagear, a "pra�a" agride a Bandeira Nacional.
A "pra�a" n�o � mais pra�a, desde que foi transformada no "Terminal Bandeira", que o prefeito Jo�o D�ria visitou recentemente. Para piorar os maus tratos, no final dos anos 1960, ela foi cortada por um "minhoc�o" horroroso, como outros constru�dos no centro da cidade naqueles anos de ditadura.
Um processo semelhante fez terra arrasada do "parque" D. Pedro 2�, que na mesma �poca virou um imenso estacionamento de �nibus e carros encimado por um cipoal de viadutos. Ali, pequenas nesgas de jardim n�o conseguem sugerir que ali um dia existiu a grande �rea verde que servia como um dos principais pontos de encontro de paulistanos, antes da cria��o do Ibirapuera.
Sucessivas administra��es servis � l�gica perversa do privil�gio ao tr�nsito motorizado foram destruindo um a um "espa�os p�blicos" da cidade, tal como define o autor Mauro Calliari no rec�m-lan�ado "Espa�o P�blico e Urbanidade em S�o Paulo" (BEI, 2016) : lugares que t�m uma escala humana, para n�o serem opressivos, e s�o palcos da vida, representada pelos encontros entre os habitantes das cidades.
Com essas qualidades, explica o ensaio, os espa�os p�blicos geram "prazer sensorial". Pense: que del�cias um ser humano pode experimentar diante dos "minhoc�es" constru�dos nos anos 1960 e 70 sobre ex-pra�as como Marechal Deodoro ou 14 Bis, Bandeira ou D. Pedro 2�? Ao contr�rio, grandes vias de tr�nsito intenso e terminais de transporte criam "fraturas" dentro do tecido urbano, afastam os locais de conv�vio das pessoas, desertificam as �reas em volta e atraem atividades marginais, incluindo crimes e drogas. � por isso que a Cracol�ndia se localiza ao lado das grandes esta��es ferrovi�rias, por exemplo.
Ao andar de �nibus, em 6/2, Jo�o D�ria esteve no "Terminal Bandeira", como noticiou a imprensa. Foi at� abordado por um simp�tico morador de rua. Imagino que nem tenha podido notar que sob aquele polo de log�stica, um dia, existiu uma pra�a. Para termos realmente uma cidade linda, a administra��o deveria pensar em como tirar os terminais e devolver ao prazer humano as pra�as centrais, como Bandeira, Princesa Isabel e o Parque D. Pedro.
Livraria da Folha
- Cole��o "Cinema Policial" re�ne quatro filmes de grandes diretores
- Soci�logo discute transforma��es do s�culo 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD re�ne dupla de cl�ssicos de Andrei Tark�vski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade