Não vou chover no molhado sobre a dificuldade em manter um discurso sobre o distanciamento entre esporte e política. Quanto mais o tempo passa maiores são os indícios de uma relação que está fadada, senão a ser feliz para sempre, pelo menos ser infinita enquanto durar.
Quando escrevo política penso na arte da negociação e não apenas nos jogos partidários, pró ou contra algum posicionamento ideológico. Por isso entendo que o esporte estará sempre associado a uma atividade política porque pensado como fenômeno ele está inserido no intricado jogo das relações de um determinado grupo social.
No Brasil o esporte tem uma relação matrimonial com a iniciativa privada, apesar de flertar com o poder público desde sempre. A base do esporte nacional que teoricamente começa na escola, tem nos clubes privados o espaço de fato para o desenvolvimento de talentos que podem ser originários do quadro de associados habilidosos ou sócios militantes.
Entretanto, a estrutura que sustenta a máquina competitiva está nas mãos das federações e confederações que seguem um sistema federativo organizado em níveis estaduais e nacional. E aí começa uma confusão que se não gera uma crise de identidade, promove desentendimento, cujos desdobramentos atingem, inevitavelmente, o atleta.
A criação de mecanismos como a Lei Pelé e a Lei Agnelo Piva pareceu ser a boia salva-vidas de um esporte que historicamente ficava à deriva entre a educação, o turismo e si mesmo. Dinheiro público passou a jorrar como água nas antes secas torneiras de um esporte que sobrevivia heroicamente de esforços individuais, carente de políticas de médio e longo prazos.
E aqui está a afirmação da relação próxima entre esporte e política, principalmente em um país em que essa prática é um direito constitucional. No momento em que dinheiro público passa a sustentar a organização esportiva não resta dúvidas de que mais do que proximidade há uma relação de dependência que mobiliza a vida das instituições esportivas e, na ponta da corda, dos atletas.
O bônus dessa relação de dependência é que os recursos recolhidos das loterias facilitaram como nunca a base material tão desejada de décadas passadas. Entretanto, a contrapartida exige um conhecimento de gestão pública que poucos possuem. Inúmeros rituais precisam ser seguidos na contratação de serviços e compras de equipamentos para que se cumpram as exigências previstas na lei. Caso contrário, como um efeito dominó, cai todo o sistema.
Em ano de Jogos Pan-americanos e em vésperas de Jogos Olímpicos poucos são os que acompanham os bastidores da estrutura do esporte para entender porque alguns resultados esperados não acontecem.
Os olhos desatentos de espectadores e desinteressados de forma geral parecem encontrar um ponto de fixação: o alto do pódio, onde obrigatoriamente os atletas brasileiros devem estar, segundo a compreensão de quem está distante do cotidiano esportivo. Desejosos de uma cena vitoriosa para acalentar dores imediatas, pouco ou nada sabem de bastidores que envolvem planejamento, gestão e competência técnica.
Acreditam de antemão na potência do selecionado brasileiro desmerecendo, inclusive, a competência dos adversários.
Mas, as coisas não são bem assim. Com problemas na prestação de contas, várias confederações colocam em risco o recebimento das verbas públicas do COB, comprometendo a vida e a carreira de muitos atletas que se dedicaram a chegar no seu melhor nesse momento. E isso precisa ser exposto para que expectativas irreais não sejam criadas.
Preparar uma equipe para chegar entre os primeiros é fruto de um processo que exige cada vez mais expertise. Já não há mais espaço para improvisação, nem amadorismo.
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