O extremismo político tomou conta do palco, à esquerda e à direita, e eu confesso que ri com o artigo de Colin Wright no Wall Street Journal. Conta o autor que ficou feliz quando Elon Musk compartilhou no Twitter o seu cartum, embora Colin tenha recebido "hate mail" em quantidades industriais.
O cartum, aparentemente inofensivo, é esse mesmo que você pode ver aqui:
Explico. Em 2008, Colin Wright definia-se como de centro-esquerda. Os seus companheiros "liberais", no sentido americano e progressista do termo, estavam um pouco mais à esquerda, "ma non troppo".
As coisas começaram a mudar em 2012, quando os "liberais" começaram a correr para os extremos, arrastando o chão com eles. Colin, esse, ficou no mesmo lugar, com as mesmas ideias. Mas, agora, estava muito próximo do centro.
Em 2021, não havia dúvidas, o autor estava à direita do centro. Não porque mudou de camiseta, mas porque o ambiente mudou –e os "liberais" de ontem, ou uma parte significativa deles, mergulharam no "wokestão", esse charco onde a liberdade de expressão é um perigo, o tribalismo é mais importante do que a justiça cega para todos, e os direitos das mulheres são menos importantes do que os direitos daqueles que se declaram mulheres.
Ri alto com o cartum de Colin Wright porque, seguindo a sua sugestão, eu próprio resolvi desenhar o meu cartum. Peço desculpa pelos meus talentos limitados, mas deu isso aqui:
Quer que eu explique?
Sempre fui um conservador liberal, para quem a busca de perfeição política é uma quimera perigosa e a confiança cega na natureza humana é um erro epistemológico.
Isso tem implicações: a recusa do radicalismo político, seja revolucionário ou reacionário, e a preferência por uma forma de governo limitada pela lei nunca me abandonaram.
Como diz um ilustre colega meu, evocando a imagem de Ulisses e das sereias, quero um político bem atado ao mastro do navio, e que ele não vá ceder aos encantos do abuso, da corrupção ou da arrogância.
Porque são os indivíduos, livremente, que devem procurar, acertar ou falhar por sua conta e risco. Nesse processo de busca da individualidade, as tradições têm um papel relevante. Não como imposição dogmática de valores ou condutas, mas como patrimônio que pode ajudar à construção de um caráter.
Com a devida vênia ao filósofo, as tradições são como uma língua: convém entender as regras, embora isso nada nos diga sobre o conteúdo do que podemos ou devemos dizer.
Fatalmente, tudo mudou em 2016, com a eleição de Donald Trump. Uma parte substancial da direita entregou-se a uma espécie de "wokismo" do avesso, trocando as virtudes da individualidade pelos confortos do tribalismo, do messianismo e da dogmática.
É a mesma direita, aliás, que aparece regularmente no meu email para me denunciar como esquerdista enrustido, falso conservador, globalista e até comunista, o que não deixa de ser uma originalidade no meu currículo. Essa turba voltou a emergir recentemente, depois de uma entrevista minha ao programa Roda Viva, para me acusar de todos os crimes ideológicos.
Perdoo-lhes, porque eles não sabem o que fazem. Nessas 45 primaveras, estive sempre no mesmo lugar. O que mudou foi o chão que pisamos.
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