Saltar para o conte�do principal

Publicidade

Publicidade

 
 

jo�o pereira coutinho

 

09/01/2012 - 07h01

Choros e risos

H� prazeres que nunca envelhecem. Os Monty Python s�o um deles: quem diria que, mais de quatro d�cadas depois da forma��o da trupe brit�nica, o humor dos Pythons continuasse fresco, sem uma ruga que seja?

Verdade que o "nonsense" sempre envelheceu melhor do que a "cr�tica social", aprisionada �s vulgaridades do tempo que passa. Mas os Monty Python, repito, n�o envelheceram. Refinaram.

Assisti nos �ltimos dias a todos os epis�dios televisivos de um f�lego s� - quase um dia inteiro de gargalhadas ininterruptas que n�o me mataram por acaso.

E, a prop�sito da experi�ncia, recordo o melhor "sketch" de todos: a Piada Mais Divertida do Mundo.

O leitor n�o conhece? Eu conto: estamos em plena Segunda Guerra Mundial. Os ingleses lutam desesperadamente contra os nazistas. E decidem usar uma piada assassina que, contada em alem�o e com megafone, provoca entre os soldades de Hitler um ataque de riso mortal.

Nunca sabemos o conte�do da piada (� em alem�o, relembro). Apenas vemos os efeitos devastadores dela, mais letal que uma bomba at�mica.

O "sketch" dos Monty Python seria apenas o primeiro de uma prof�cua tradi��o humor�stica que, nos anos seguintes, acabaria por transformar os nazistas em caricaturas ris�veis e dementes: da sitcom "All�, All�" ao musical de Mel Brooks "Os produtores", exemplos n�o faltam.

Divulga��o
Os integrantes do Monty Python
Os integrantes do Monty Python

Mas o que talvez poucos saibam � que a ideia para o "sketch", por inacredit�vel que pare�a, foi inspirada em acontecimentos reais.

As vers�es s�o v�rias e circulam em livros de hist�ria e mesmo na internet. Mas todas elas apontam para a mesma bizarria: em 1962, na atual Tanz�nia, uma escola foi obrigada a encerrar as portas depois dos alunos n�o controlarem o riso durante as aulas.

O problema � que o riso continuou fora da escola: quando as crian�as regressaram �s suas aldeias, a epidemia come�ou a contaminar os pais e os vizinhos durante horas ou dias.

N�o h� not�cias de mortes por desidrata��o ou colapso card�aco. Mas o fen�meno chegou �s primeiras p�ginas dos jornais e abismou os leitores: em �frica, havia uma epidemia de riso que punha em risco a sa�de das popula��es.

Foi o "jackpot" para os Monty Python, os reis do humor surreal, que criaram um dos mais hilariantes "sketches" de com�dia de todos os tempos. E foi o in�cio de um mist�rio m�dico, que a ci�ncia nunca conseguiu resolver completamente. Seria um v�rus a provocar o riso? Ou seria antes uma esp�cie de colapso psicol�gico generalizado, agravado pela pobreza e pela fome?

Essa �ltima explica��o foi ganhando mais for�a entre os especialistas. O riso n�o era uma express�o de alegria ou humor; mas, pelo contr�rio, uma express�o de desespero e esgotamento ps�quico que adquiriu contornos de histeria.

Exatamente como sucedeu agora com o pranto dos norte-coreanos depois da morte do "Querido L�der", Kim Jong-il.

O mundo assistiu �s imagens dos choros maci�os e perguntou: ser� verdade? Ser� encena��o?

Confesso que nunca me passou pela cabe�a duvidar da "sinceridade" daquelas l�grimas. Um pa�s onde metade da popula��o passa fome e onde reina o mais puro terror de Estado s� poderia produzir espect�culos do g�nero.

Mas seria um erro ver nas l�grimas dos norte-coreanos uma express�o de luto ou tristeza pela morte do seu torcion�rio.

Quando a mis�ria � grande e os corpos n�o aguentam, chorar ou rir deixa de ser uma express�o normal e sentimental.

Transforma-se apenas no retrato assassino de como vivem os miser�veis.

joão pereira coutinho

Jo�o Pereira Coutinho, escritor portugu�s, � doutor em Ci�ncia Pol�tica. � colunista do 'Correio da Manh�', o maior di�rio portugu�s. Reuniu seus artigos para o Brasil no livro 'Avenida Paulista' (Record). Escreve �s ter�as na vers�o impressa e a cada duas semanas, �s segundas, no site.

 

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da p�gina