Cronista, cr�tico de arte e poeta.
Cada um cria, � sua maneira, uma realidade que s� existe em sua mente
Gente � bicho complicado. E, ao dizer isso, n�o me excluo, pois tamb�m sou complicado. S� que, mod�stia � parte, procuro, tanto quanto poss�vel, manter-me coerente com o que suponho ser a realidade dos fatos.
Digo isso porque, com frequ�ncia, conversando com essa ou aquela pessoa, surpreendo-me com a capacidade que elas t�m de amoldar a realidade ao que creem –ou lhes conv�m– ser a verdade.
�s vezes, tento mostrar-lhes que a coisa n�o � bem assim, mas de nada adianta, pois, ao que tudo indica, a verdade n�o lhes importa e, sim, a vers�o que inventaram.
J� contei aqui a conversa que mantive com uma jovem universit�ria a prop�sito de um jornal que seu grupo editava na faculdade.
– O que esse jornal afirma –disse-lhe eu– d� a entender que o comunismo n�o acabou.
– E n�o acabou mesmo –respondeu ela. O que acabou n�o era o comunismo verdadeiro.
Rubem Grillo/Editoria de Arte/Folhapress | ||
Ou seja, como ela necessitava acreditar no sonho marxista, tudo o que ocorreu, desde a revolu��o sovi�tica de 1917 at� hoje, era falso comunismo. Nem L�nin, nem Stalin, nem Mao Ts�-tung, nem Fidel Castro: nenhum deles era comunista de verdade. S� ela e seu pequeno grupo de universit�rios.
Por isso, digo que gente � bicho complicado. Claro que nem todo mundo chega ao exagero dessa jovem carioca, mas cada qual � sua maneira inventa uma realidade que s� existe em sua mente. � claro, por�m, que n�o ocorre s� com gente da �rea pol�tica e muito menos da chamada esquerda.
Na �rea da religi�o e, sobretudo, das seitas religiosas, a realidade � muitas vezes coisa ignorada. S�o exce��es, mas conseguem adeptos e criam institui��es que, de uma maneira ou de outra, atuam na sociedade. H� mesmo os espertos que fundam seitas ou "igrejas" e, depois que conseguem um n�mero consider�vel de seguidores, as vendem a supostos profetas. Bem, como diz a Maria, minha empregada, neste mundo h� de um tudo.
Sim, h�, mas nem sempre a coisa chega a esse ponto. H� exemplos mais discretos, embora sejam, de qualquer forma, uma maneira de desconhecer a verdade. E, mesmo admitindo que s�o exemplos diversos dos mencionados, n�o deixam de me espantar, por exemplo, a insist�ncia com que algumas pessoas teimam em afirmar que o processo de impeachment contra Dilma Rousseff � um golpe.
� verdade que quem inventou isso sabe que � mentira e muitas dessas pessoas que o repetem tamb�m sabem, mas, apesar de o saberem e, por isso mesmo, fingem que acreditam.
N�o estou dizendo nada de novo e, sim, t�o somente, manifestando minha surpresa, uma vez que muitas dessas pessoas que o afirmam s�o plenamente informadas de tudo o que aconteceu: de como surgiu o processo do impeachment e de como se desenvolveu ao longo de mais de nove meses, obedecendo a todas as normas e exig�ncias legais.
Basta dizer que, em certo momento desse processo, 44 testemunhas depuseram em defesa da acusada, e isso sem falar nas infind�veis sess�es de debates, em que os seus defensores lan�avam m�o de sofismas e barganhas para anular o processo.
Todos os recursos foram utilizados para impedir que o impeachment fosse adiante. Na etapa final, o processo foi presidido, nada mais, nada menos, pelo ministro Ricardo Lewandowski, presidente do Supremo Tribunal Federal. Ainda assim, aquelas mesmas pessoas insistem em dizer que se trata de um golpe.
Confesso que tenho dificuldade de entender esse tipo de comportamento. Com facilidade compreendo que uma pessoa desinformada ou inculta deixe-se levar por falsas verdades e demagogias. Mas, quando se trata de algu�m que tem pleno conhecimento dos procedimentos legais e das institui��es envolvidas no caso, a� n�o d� para entender.
Ou d�, se assumirmos que o cara engana a si mesmo e, nem � noite, ao deitar a cabe�a no travesseiro, admite que est� se enganando.
Livraria da Folha
- Cole��o "Cinema Policial" re�ne quatro filmes de grandes diretores
- Soci�logo discute transforma��es do s�culo 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD re�ne dupla de cl�ssicos de Andrei Tark�vski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade