Cronista, cr�tico de arte e poeta.
Encontro com Oswald
Na rua do Ouvidor, entre a avenida Rio Branco e a rua da Quitanda, ficava naquela �poca a Livraria Jos� Olympio, onde, certa tarde, deparei com Graciliano Ramos, sentado numa cadeira e fumando cigarro.
Foi ali tamb�m que, poucos meses depois, comprei um exemplar de "Serafim Ponte Grande", de Oswald de Andrade, a pre�o de refugo. Havia, num canto, uma ruma de exemplares do livro, postos em liquida��o.
Levei o livro para casa e, ao l�-lo, surpreendeu-me a linguagem saborosa do autor. Disse isso a M�rio Pedrosa, que concordou comigo e me emprestou um exemplar do livro de poemas de Oswald, "Pau Brasil". Era um volume pequeno, quadrado, tendo na capa o losango da bandeira brasileira. Fascinou-me o sabor de mato verde que experimentei ao ler os seus versos.
Naquela �poca, mor�vamos num mesmo quarto de uma pens�o no Catete, eu, Oliveira Bastos e Carlinhos Oliveira. Falei de Oswald com Bastos, que era ent�o um jovem cr�tico liter�rio, e lhe dei para ler os livros dele. Bastos tamb�m se encantou e, assim, Oswald, cujos livros �quela altura quase ningu�m comprava, tornou-se nosso �dolo.
Era o ano de 1954, e eu dera por terminado "A Luta Corporal", que seria editado naquele mesmo ano, �s minhas custas. E foi ent�o que ocorreu um fato inusitado: no dia 10 de setembro, data de meu anivers�rio, fui comemor�-lo na casa de Amelinha, minha namorada, que morava num pequeno apartamento na Rua Fialho, na Gl�ria.
A� tocou a campainha, ela foi abrir a porta e invade a casa um sujeito grandalh�o, em mangas de camisa e suspens�rios, rindo �s gargalhadas: era nada mais nada menos que Oswald de Andrade. Ele avan�ou para mim e me abra�ou.
Atr�s dele, contendo o riso, entrou Oliveira Bastos, o autor daquela proeza. Sem nada me dizer, pediu-me uma c�pia do meu livro in�dito de poemas e o levou a Oswald, em S�o Paulo.
"Adorei seus poemas", disse-me o poeta, "e direi isso em Genebra, este ano, onde darei um curso sobre a literatura brasileira. Vou conclu�-lo falando de 'A Luta Corporal'".
Se eu j� estava atordoado com a inesperada presen�a dele ali, no dia de meu anivers�rio, essa not�cia me p�s a nocaute. N�o sabia o que dizer nem o que fazer.
"Sua poesia tem o sabor de folha verde" –foi tudo o que pude falar, antes que ele de novo me abra�asse e fosse embora. Nunca mais o vi, mesmo porque, um m�s depois, ele morria em sua casa, em S�o Paulo.
Isso que acabo de contar explica por que, no ano seguinte, quando almocei com Augusto de Campos, na Spaghetl�ndia, no Rio, discordei de sua opini�o sobre Oswald de Andrade. Era a opini�o generalizada que o meio intelectual tinha dele, e com alguma raz�o. De fato, Oswald era autor de uma s�rie de proezas que levavam as pessoas a v�-lo como um irrespons�vel, e at� como mau-car�ter.
Por isso disse, naquela ocasi�o, que n�o me referia � pessoa de Oswald, mas � qualidade de sua literatura.
E o resultado dessa conversa foi que ele certamente foi reler Oswald e sem d�vida percebeu suas qualidades de escritor, reviu sua opini�o sobre ele e, juntamente com Haroldo e D�cio, contribuiu para a redescoberta e valoriza��o de sua obra.
Realmente, Oswald n�o era um exemplo da seriedade que costuma distinguir os grandes homens. Ele era, pode-se dizer, um tanto irrespons�vel, como demonstra aquele epis�dio quando, discutindo com algu�m, para ganhar a discuss�o, atribuiu a M�rio de Andrade a opini�o de que Villa-Lobos era um compositor med�ocre. Interpelado por M�rio, que nunca dissera aquilo, respondeu: "Eu menti". Diante disso, M�rio n�o p�de fazer outra coisa, sen�o rir.
A verdade � que, se admiro o escritor Oswald de Andrade, tenho tamb�m simpatia por seu jeit�o irrespons�vel. E com toda a raz�o porque, se ele n�o fosse meio brincalh�o, meio moleque, n�o teria ido me abra�ar no dia de meu anivers�rio, numa quitinete na Rua Fialho, no bairro da Gl�ria. Gente s�ria n�o faz essas coisas.
Livraria da Folha
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