Cronista, cr�tico de arte e poeta.
Hora da verdade
Naquela quinta-feira, dia 12 de maio, quando a presidente Dilma Rousseff recebeu a intima��o para deixar o governo por at� 180 dias, chamou a aten��o o contraste entre a atitude dela e a do Lula, em face da indisfar��vel derrota que eles dois e o populismo petista acabavam de sofrer: enquanto ela discursava interminavelmente, amea�ando o seu sucessor, Lula se mantinha calado e visivelmente abatido.
Ao contr�rio dela, para quem o mundo real n�o deve ser levado em conta, ele, sempre ligado � realidade, mostrava-se profundamente atingido pelos fatos, pois sabe muito bem o que significa o impeachment da presidente que ele inventou.
Ao v�-lo com aquele olhar vazio, como se desligado do momento, enquanto Dilma gritava bravatas, refleti sobre a rela��o que os uniu durante todos estes anos: ele a tornou, sucessivamente, ministra das Minas e Energia, presidente do Conselho de Administra��o da Petrobras, chefe da Casa Civil e finalmente presidente da Rep�blica.
Sem pretender decifrar a raz�o dessas nomea��es, n�o resta d�vida de que ele a elegeu presidente da Rep�blica para que, ao fim dos quatro anos do mandato, pudesse voltar � chefia do governo. Todo mundo sabia disso, mas, para surpresa geral, n�o foi o que ocorreu: Dilma candidatou-se � reelei��o. Houve quem acreditasse que ela teria dado um golpe em seu criador, o que me parece uma hip�tese invi�vel.
No meu entender, foi o pr�prio Lula que, ao ver o estado cr�tico a que Dilma levara o pa�s, tirou o corpo fora e a convenceu (o que n�o ter� sido dif�cil) a se candidatar � reelei��o.
Essa me parece uma vers�o bem mais plaus�vel, uma vez que, se ele tivesse insistido em candidatar-se, ela jamais se atreveria a contrari�-lo, mesmo porque, sem o apoio dele, n�o seria reeleita. A sua recandidatura, a meu ver, foi obra do pr�prio Lula que, esperto como �, n�o se disporia a herdar tamanho abacaxi. Se o tivesse feito, quem teria sido impedido, agora, seria ele, e n�o ela, conforme ocorreu. Como se sabe, macaco velho n�o mete a m�o em cumbuca.
J� Dilma pode ser tudo, mas esperta n�o �. Nesse particular, ela � melhor que Lula, o qual, como dizia Leonel Brizola, "seria capaz de pisar no pesco�o da m�e". Dilma n�o seria capaz disso, mesmo porque, comparada com Lula, parece at� ing�nua.
Atrevo-me a pensar que ela tem dificuldade em se ligar objetivamente com o mundo real. A sua participa��o num grupo guerrilheiro, que assaltava bancos para, com o dinheiro roubado, financiar a guerrilha, n�o � propriamente sinal de bom senso. N�o pretendo, ao dizer isso, desconhecer a generosidade e a coragem dos que se atreveram a tal proeza, mas, a meu ju�zo –e como os fatos mesmos comprovaram–, tal op��o estava longe da sensatez e da objetividade.
Pois bem, minha tese � que a Dilma que optou pela guerrilha ainda est� presente na Dilma de agora. Certamente n�o pretende desencadear um movimento armado contra o governo de Michel Temer, embora o tom de seus discursos, ao deixar o pal�cio do Planalto, desse a entender que sair� �s ruas com seus seguidores para defender a democracia.
E isso � que � preocupante, uma vez que a nossa democracia n�o est� amea�ada e, sim, longe disso, funcionando plenamente, a ponto de p�r na cadeia altas figuras do mundo empresarial, acusadas de corrup��o. Como a guerrilheira do passado, Dilma prefere a bravata a encarar a realidade.
J� Lula, n�o. Ele sabe muito bem que a aventura populista do petismo chega ao fim. Dilma fez guerrilha, n�o fez pol�tica, nunca se candidatou sequer a vereadora. Lula, pelo contr�rio, fez pol�tica sindical, tornou-se l�der oper�rio e fundou um partido que faria hist�ria na vida pol�tica brasileira, chegando mesmo a ocupar a Presid�ncia da Rep�blica durante mais de 13 anos.
No curso desse tempo, Lula afirmou-se como um defensor dos trabalhadores e dos pobres at� que se revelassem os desatinos do mensal�o e da Lava Jato. Agora, com o impeachment de Dilma, a era Lula chega ao fim, e ele sabe disso. Da� a express�o de des�nimo estampada em seu rosto naquela quinta-feira, dia 12 de maio.
Livraria da Folha
- Cole��o "Cinema Policial" re�ne quatro filmes de grandes diretores
- Soci�logo discute transforma��es do s�culo 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD re�ne dupla de cl�ssicos de Andrei Tark�vski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade