Cronista, cr�tico de arte e poeta.
Ao mestre M�rio, com saudade
Depois de muitos anos, passei esta semana em frente ao pr�dio onde morou M�rio Pedrosa, na rua Visconde de Piraj�, em Ipanema. Fui subitamente arrastado ao passado e me vi entrando por aquele port�o, subindo de elevador at� o oitavo andar e logo me deparando com ele, de meias e chinelos, na cadeira de embalo onde se sentava para conversar conosco.
Digo conosco porque est�vamos quase sempre em grupo quando �amos visit�-lo. Visitar talvez n�o seja a palavra certa, j� que �amos para conversar sobre as quest�es da arte concreta, por ele introduzida no Brasil naquele come�o da d�cada de 1950.
Principalmente sobre isso, mas tamb�m sobre literatura, arte e pol�tica, uma vez que M�rio, embora tendo h� muitos anos abandonado a milit�ncia partid�ria, continuava a pensar e a discutir aquelas quest�es. Claro que isso n�o exclu�a o papo amig�vel, bem-humorado, que era um dos tra�os de seu temperamento.
Costumo dizer que aprendi muito com ele, n�o apenas nas conversas, mas tamb�m nos livros que me emprestava. Eram livros de cr�tica de arte, de hist�ria da arte, de filosofia. N�o fosse isso, dificilmente, por exemplo, teria eu lido os fil�sofos pr�-socr�ticos.
Quando entrei em crise, ao desintegrar a linguagem po�tica nos �ltimos poemas de "A Luta Corporal", foi a ele que recorri. Mostrei-lhe os poemas, ele os leu e me disse: "Voc� se meteu numa encrenca, mas esse � seu caminho. Precisa dar um tempo". E meu deu para ler um livro em que conheci Her�clito, Parm�nides, Pit�goras. N�o resolveu meu problema, mas me afastou dele por algum tempo.
M�rio n�o vivia nos dando li��es, nem a mim nem aos artistas que aderiram ao concretismo e, quando ocorreu a ruptura dos dois grupos –os concretistas paulistas e os cariocas– n�o tomou partido, muito embora n�o concordasse com a vis�o excessivamente teorizante dos paulistas.
Essa ruptura foi precipitada por um artigo de Haroldo de Campos propondo que, a partir de ent�o, a poesia concreta fosse feita com base em equa��es matem�ticas.
Eles nunca fizeram poema algum baseado nessa teoria, enquanto o grupo do Rio prosseguiu em suas realiza��es, a partir da intui��o e da inventividade.
N�o � verdade, portanto, que a arte neoconcreta tenha nascido em contraposi��o ao grupo paulista. Aquela ruptura se deu em junho de 1957 e o neoconcretismo nasceu em 1959, quando redigi o Manifesto Neoconcreto. E n�o nasceu por pretendermos inventar um novo movimento; nasceu quase que por acaso.
Foi assim: no final de 1958, Lygia Clark sugeriu que o grupo do Rio fizesse uma exposi��o de seus trabalhos mais recentes e que eu escrevesse o texto de apresenta��o da mostra. Aceitei a proposta, mas para isso teria que conhecer os trabalhos a serem expostos.
Pois bem, depois que os vi, convenci-me de que o que faz�amos – tanto os artistas pl�sticos como os poetas– j� n�o se identificava com o concretismo; era outra coisa. Pedi, ent�o, uma reuni�o do grupo e sugeri que pass�ssemos a nos definir como "neoconcretos" e que, em vez da apresenta��o, escreveria um manifesto lan�ando a nova tend�ncia.
Assim foi que, meses depois, em mar�o de 1959, abria-se, no Museu de Arte Moderna do Rio, a primeira exposi��o neoconcreta. Como se v�, o neoconcretismo surgiu do modo pr�prio como o grupo do Rio desenvolvia suas experi�ncias.
Outro aspecto a ressaltar � que o manifesto neoconcreto, ao contr�rio dos demais, n�o prometia nada, n�o profetizava o futuro, apenas procurava definir o que de novo surgira do trabalho de seus integrantes. Noutras palavras, tanto os artistas pl�sticos quanto os poetas n�o partiam de teorias para realizar suas obras; partiam da pr�pria experi�ncia, do que descobriam em seu trabalho criativo.
M�rio Pedrosa n�o participou de nada disso, pois n�o estava no Brasil. Ganhara, em 1958, uma bolsa da Unesco para estudar arte japonesa no Jap�o e l� ficou at� meados de 1959. De volta ao Rio, brincou: "Voc�s me deram o golpe. Esperaram eu viajar para sepultar o concretismo". E eu lhe respondi: "Quem mandou voc� ir para o Jap�o?"
E rimos os dois, nos divertindo com a brincadeira.
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