Cronista, cr�tico de arte e poeta.
As Bienais e as vanguardas
A Bienal de Veneza deste ano, inaugurada no dia 9 de maio, � mais um acontecimento do chamado campo das artes pl�sticas que leva � reflex�o as pessoas que se interessam por esse tipo de express�o art�stica.
Criada em 1895, na cidade italiana que se tornou, desde ent�o, refer�ncia obrigat�ria na hist�ria das artes pl�sticas modernas, foi ela a origem de v�rias outras mostras bienais de car�ter internacional –inclusive no Brasil, caso da Bienal de S�o Paulo, inaugurada em 1951.
Desse modo, a hist�ria da Bienal de Veneza se confunde com a pr�pria hist�ria da arte do s�culo 20, que, no curso destes anos, sofreu mudan�as radicais.
Nascida no momento em que a arte ocidental iniciava um processo radicalmente inovador, tornou-se naturalmente a exibi��o bienal das mais diversas manifesta��es das vanguardas que, a partir de ent�o, determinaram o curso das realiza��es art�sticas nesse terreno.
Esses movimentos n�o foram poucos, do cubismo ao expressionismo, do neoplasticismo ao dada�smo e ao surrealismo, passando em seguida pelo concretismo, tachismo, pop art e neoconcretismo at� romper os limites do que se considerava arte e que passou a se chamar, � falta de outro nome, de arte contempor�nea.
Essa tend�ncia, na sua extrema diversidade e radicalismo, n�o cabe na defini��o usada at� ent�o para designar as distintas manifesta��es que as artes pl�sticas adotaram desde a implos�o cubista, no come�o do s�culo 20, em Paris.
Como j� tive oportunidade de observar, o cubismo estabeleceu uma ruptura na rela��o entre arte e natureza ao invert�-la: o pintor, ent�o, em vez de partir da realidade para fazer o quadro, parte da tela para invent�-lo.
Desde ent�o, ganhou ele uma liberdade sem limites para fazer o quadro, uma vez que, agora, tudo o que puser na tela vira express�o, vira arte, seja areia, arame, barbante, papel de jornal ou estopa.
Quando Picasso cola na tela um recorte de jornal, naquela �poca, inventa o "ready-made". Marcel Duchamp aprendeu a li��o e a radicalizou: p�s nome num urinol, assinou-o e o exp�s como obra de arte.
Esse gesto de Duchamp –que completar� um s�culo daqui a dois anos– determinou uma atitude inusitada na rela��o artista-obra, j� que o fazer art�stico tornou-se desnecess�rio. Afirmou, ent�o, o pr�prio Duchamp: "Ser� arte tudo o que eu disser que � arte".
A verdade, por�m, � que ele nunca deixou de fazer arte, uma vez que "O Grande Vidro" e "�tant Donn�s" s�o obras suas, com as quais despendeu anos (oito com a primeira e mais de 20 com a segunda).
N�o resta d�vida, no entanto, que essa ruptura com o conceito de arte se afirmou nas �ltimas d�cadas, e particularmente as bienais passaram a aceit�-lo.
Elas tiveram, nesse processo, um papel importante. O fato de terem se tornado a vitrine de tudo o que se fazia de mais avan�ado em mat�ria de arte no mundo inteiro fez delas tamb�m um fator estimulante da produ��o art�stica e, naturalmente, das novidades, a tal ponto que, a partir de determinado momento, muitos artistas concebiam instala��es apenas para serem expostas nas bienais.
N�o por acaso, os novos procedimentos art�sticos –como performance e instala��es– s�o na verdade realiza��es improvisadas e ef�meras, feitas para acontecerem nas bienais e durarem o tempo dessas mostras.
Todos esses fatores determinaram o car�ter atual das bienais e o vale-tudo da chamada "arte contempor�nea". At� algumas d�cadas atr�s, o prop�sito do artista era criar algo que sobrevivesse a ele, que se perpetuasse na admira��o das pessoas.
Por isso mesmo, a realiza��o da obra implicava o dom�nio de uma linguagem original e a capacidade de transcender a mera realiza��o artesanal.
Hoje, como disse h� pouco, as obras, como as bienais –com exce��es, � claro–, t�m dura��o prevista, como se fossem ambas a mesma realiza��o: s�o feitas para durar pouco.
A atual Bienal de Veneza n�o foge � regra, conforme as informa��es que nos chegaram pela imprensa. Uma Igreja Cat�lica foi convertida em mesquita isl�mica; artistas do Paquist�o e da �ndia exploram quest�es da divis�o territorial; outras instala��es denunciam a viol�ncia contra mulheres, travestis e transexuais.
Algumas delas s�o manifesta��es louv�veis, sem d�vida, mas nada t�m a ver com artes pl�sticas.
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