Eduardo Sodré

Jornalista especializado no setor automotivo.

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Êxito chinês entre carros mais caros explica pedido de recomposição de imposto para eletrificados

Montadoras já instaladas no país têm volume, mas ficam atrás em rentabilidade e dependem do sucesso de híbridos flex

Ao mesmo tempo em que trai seu próprio discurso de previsibilidade, a Anfavea (associação das montadoras) cumpre seu papel de representante setorial ao pedir a recomposição imediata do Imposto de Importação para carros híbridos e elétricos. A medida, descartada pelo governo Lula, representaria uma quebra de acordo preestabelecido.

Pela norma original, que prevê um escalonamento, a alíquota de 35% para os automóveis híbridos e puramente elétricos só seria recomposta em julho de 2026. Nesta segunda (1º), passam a vigorar as seguintes taxas: 18% para carros 100% elétricos, 24% para os híbridos plug-in (também podem ser recarregados na tomada) e 25% para os demais híbridos.

Foto da lateral do Haval, que  H6 será o primeiro carro da GWM comercializado no Brasil
Haval H6 será o primeiro carro da chinesa GWM produzido no Brasil - Marcos Camargo/Divulgação

A Anfavea pediu que os 35% passem a vigorar agora, mas o cenário é totalmente desfavorável para pleitos desse tipo. O alvo óbvio são as fabricantes chinesas –que, além de terem superado a resistência de grande parte do público consumidor com seus eletrificados, já fizeram seguidos anúncios de linhas de montagem no país.

O crescimento das vendas dos novos concorrentes tem assustado marcas com parques industriais de grande porte no Brasil. O temor é resultado de um erro estratégico: não houve essa preocupação quando o programa Mover (Mobilidade Verde e Sustentabilidade) ainda era embrionário. Agora, a onda que já ameaçava a Europa chegou ao mercado nacional.

As chinesas vão bem nas importações e têm fábricas nacionais em etapas finais de adaptação (BYD e GWM) ou em fase de prospecção (Neta e Omoda/Jaecoo). Nesse cenário, as associadas da Anfavea perdem participação de mercado nos segmentos de maior valor agregado. É lá que estão, por exemplo, os SUVs com preços próximos ou acima de R$ 200 mil.

Hoje, essas marcas asiáticas estão posicionadas em segmentos rentáveis e oferecem tecnologias que caíram no gosto do consumidor de maior renda. E não são os 100% elétricos que preocupam, mas, sim, os modelos que conciliam queima de combustível e eletricidade.

A produção nacional de montadoras como General Motors, Stellantis e Volkswagen está concentrada nos carros compactos. Os dados da Fenabrave (associação dos distribuidores de veículos) mostram que esses veículos são prioritariamente negociados por meio de venda direta –indo parar, em sua maioria, nos pátios de locadoras.

Nesses casos, os descontos podem ultrapassar os 30% sobre o valor de nota, sem considerar as diferenças tributárias. Grosso modo, é como se um carro vendido por R$ 100 mil a uma pessoa física saísse por R$ 70 mil para a PJ.

Veículo mais vendido do país, a picape Fiat Strada (a partir de R$ 103.990) teve 49.050 unidades emplacadas entre janeiro e maio, sendo que 62,4% dessas foram adquiridas por meio de venda direta.

Segundo colocado no ranking, o hatch Volkswagen Polo teve 48.181 licenciamentos no mesmo período, e as vendas diretas responderam por 66,9% desse total. Mesmo que a conta inclua pequenas empresas e isenções legais previstas em lei (que contemplam pessoas com deficiência, por exemplo), são os grandes frotistas os principais compradores.

Enquanto isso, as marcas chinesas mantêm o foco no rentável varejo. O híbrido plug-in BYD Song Plus (R$ 239,8 mil) teve 8.128 unidades vendidas entre janeiro e maio, e apenas 6,9% desse total foi comercializado para PJs.

As montadoras instaladas há mais tempo no Brasil fazem investimentos bilionários para lançar seus modelos híbridos flex, mas temem não recuperar a lucratividade e perder participação de mercado. Mesmo que esses modelos acessem tarifas mais baixas devido à eficiência energética e ao uso do etanol, o valor final de venda será determinante para o sucesso.

Baixar preços sem mexer nas tarifas é considerado pouco viável, dadas as exigências de segurança e emissões previstas em lei e as expectativas dos consumidores. Se não parece possível oferecer mais por menos, o caminho escolhido pela Anfavea é tentar forçar o aumento de valor dos importados chineses, que acessam incentivos no país de origem.

Mas há os efeitos colaterais, que atingem os híbridos e elétricos importados pelas próprias associadas. No fim, a imagem da entidade diante do público consumidor e do governo deve sair prejudicada dessa disputa.

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