Escritor e tradutor liter�rio.
Gastando os bei�os
Existem jogos estranhos, jogos imperfeitos, jogos estranhos e imperfeitos e existe "Chulip". Em jogos estranhos e imperfeitos, o fasc�nio nasce da intera��o entre aquilo que n�o poderia ser (mas est� bem ali na tela) e aquilo que poderia ter sido (mas escapou aos desenvolvedores).
Isso est� presente em "Chulip", que poderia ser um dos melhores exemplos da categoria se n�o fosse �nico a ponto de se tornar inclassific�vel. Cria��o de Yoshiro Kimura, o jogo foi desenvolvido pela Punchline e lan�ado para o PS2 em 2002.
Apesar da leve esquisitice da cena de abertura, o ar buc�lico do in�cio do jogo engana. Os primeiros momentos do jovem protagonista, rec�m-chegado na Cidade da Vida Longa, sugerem uma esp�cie de "Animal Crossing" no interior do Jap�o dos anos 1960, com cen�rios mais realistas e personagens humanos no lugar dos animais da franquia da Nintendo.
Cartunista Alpino | ||
Quando levamos nosso anti-her�i para explorar a cidade com mais cuidado, vestido de quepe e uniforme cinza de estudante, surgem ind�cios da mistura de fofo, sombrio e demente que caracteriza o universo de "Chulip". Num desses passeios ele encontra a garota com quem sonha na abertura, e que beija diante da �rvore dos Amantes.
Mas no mundo real ele � rejeitado por ser um pobret�o desconhecido. Decidido a conquistar a menina com uma carta de amor, descobre que seu material de escrit�rio foi roubado. Parte ent�o em uma jornada para recuperar os itens perdidos, miss�o que tamb�m exige cair nas gra�as dos moradores locais. E em "Chulip" isso se faz com beijos.
N�o � simples. Os beijos n�o podem ser roubados, e cada personagem --de moradores comuns, divididos entre quem mora na superf�cie e os habitantes subterr�neos, at� alien�genas-- tem suas idiossincrasias. � preciso descobrir o que fazer para deixar cada um deles animado a ponto de permitir o beijo.
Depois de muita explora��o meticulosa, di�logos absurdos (nem sempre propositais: a tradu��o � problem�tica) e fracassos em acertar o momento exato de realizar certas a��es, a sensa��o de vit�ria � genu�na quando uma tentativa de beijo enfim d� certo. Esse al�vio � refor�ado pela ador�vel tosquice da celebra��o: ao som da m�sica-tema quase sinistra, por uns segundos somos lan�ados no espa�o sideral enquanto a c�mera gira ao redor dos beijoqueiros e fogos de artif�cio explodem.
Tanta dificuldade � uma das imperfei��es do jogo. Na maioria das vezes n�o h� indica��o alguma do que deve ser feito para ganhar a simpatia de um personagem. Como "Chulip" se divide em per�odos de 24 horas, h� apenas uma chance por dia, o que n�o combina com uma mec�nica baseada em tentativa e erro. Na edi��o americana, de 2007, o manual reconhece esse problema e traz um passo-a-passo.
"Chulip" vendeu mal mesmo no Jap�o, e nunca entendi como acabou lan�ado no Ocidente. Mas o jogo tem seus f�s, e prova disso � ter sido relan�ado na PSN em 2012. Jamais entraria em listas de melhores de todos os tempos, mas quem passou horas matutando estrat�gias para beijar um dinossauro cin�filo n�o esquece a experi�ncia.
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