Os meses de pandemia estão impondo transformações, mas por mais que as circunstâncias se alterem, parece que certas coisas nunca mudam. Os reiterados casos de agressão protagonizados por gente que se mostra incapaz de respeitar diferenças e insiste em fazer do cabelo afro um alvo são um exemplo.
Numa demonstração de incivilidade, dias atrás o narrador Romes Xavier e o comentarista Vinícius Silva abriram a boca para proferir monstruosidades. Entre outras coisas, chamaram o cabelo do jogador de futebol Celsinho, do Londrina, de “negócio imundo”. O episódio repercutiu mal e a dupla saiu com a clássica desculpa “não foi essa a intenção”.
Na mesma semana, o radialista Cláudio Guimarães resolveu repetir a dose de barbárie e chamou o cabelo do jogador de “ninho de cupim”. Dias antes, uma alta autoridade havia associado cabelo black power a um criadouro de baratas.
No meu universo, é possível vislumbrar só uma explicação para comentários pejorativos sobre corpos negros: racismo. Por mais que existam questões sociais “maiores” a enfrentar, o cabelo afro segue motivando manifestações de racismo, preconceito e discriminação no Brasil e no mundo.
Nas Olimpíadas de Tóquio, a Federação Internacional de Natação (Fina) havia proibido o uso de toucas especiais para cabelos afro, tranças e dreadlocks, pois a peça não se ajusta “à forma natural da cabeça”. A repercussão foi tão negativa que a decisão foi revista.
Atletas —e pessoas em geral— buscam inclusão, respeito e equidade de tratamento. Quem é negro sabe, e quem não é pode imaginar, que encaixar o volume dos cabelos afro no espaço das toucas comuns de natação é tarefa no mínimo desafiadora. O equipamento projetado para cabelos crespos pode eliminar uma barreira à participação de afrodescendentes nos esportes aquáticos.
Há mudanças em curso. Mas não dá para esquecer que o racismo desumaniza e vilipendia corpos negros. E o cabelo ainda é uma questão porque segue alvo de ataques abjetos.
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