Graduado em qu�mica e jornalismo pela USP, tem especializa��o em jornalismo cient�fico pelo MIT.
Fora do Facebook
Uma bomba atingiu o mundo das not�cias esta semana: dois sites jornal�sticos muito importantes, o sacrossanto "The New York Times" e o irreverente "Buzzfeed'', est�o a ponto de liberar seus conte�dos para que sejam lidos dentro dos dom�nios do Facebook.
� uma revolu��o, uma profunda quebra de paradigma. Hoje, se o leitor clica em um link de not�cia que aparece no Facebook, � levado para o site que originalmente produziu o material –o "Buzzfeed" e os pr�prios jornais "The NYT", "The Guardian", "El Pa�s", "G1", Folha etc.
O problema � que esse clique, que tira o usu�rio do "Face" e o transporta a outro site, leva tempo –nos EUA, onde a telefonia celular � decente, a m�dia � de oito segundos. Para quem est� vendo a not�cia pelo telefone (e cada vez mais gente faz isso), � uma eternidade.
Proposta do "Feice": trazer a not�cia para dentro dele mesmo e assim agilizar a parada. Isso significa um monte de coisas, mas a principal � que o produtor do conte�do perde controle sobre quem est� lendo sua not�cia. As informa��es, estatisticamente t�o relevantes, ficam na m�o do Facebook.
� apavorante: a ubiquidade do FB supera os piores pesadelos dist�picos. Na fic��o de "1984", o poder absoluto do Grande Irm�o se sustentava em um Estado totalit�rio.
Na realidade do s�culo 21, � o pr�prio usu�rio que, alegremente, em ambiente "democr�tico", informa tudo sobre sua vida, seus h�bitos e suas vontades. Uma assustadora ilus�o de liberdade. S� n�o falo em aliena��o para n�o soar ainda mais demod�. Nem usu�rio do Facebook eu sou.
Deixando claro: n�o � exatamente que eu n�o tenha conta no "FB". Abri uma, h� cerca de um ano e meio, para acompanhar uma pol�mica surgida dentro da rede sobre o coletivo Fora do Eixo e a M�dia Ninja. Sem cadastro, n�o teria acesso aos textos. � um tema que me interessa, da� a concess�o.
Ao me registrar, tomei o cuidado de n�o informar meu nome completo, nem a cidade onde moro. Zero informa��o. Imagino que nem com muita vontade algu�m consiga me achar na rede social –e, pensando bem, que infeliz nesse mundo teria vontade de me achar?
Como, no Facebook, n�o tenho nenhum amigo (vida virtual e vida real se igualam), n�o consigo seguir absolutamente mais nada do que est� acontecendo.
A grande maioria das pessoas, me parece, s� libera seus perfis para os chegados. Fico fora do esquema. At� hoje, n�o me fez a menor diferen�a.
Mantenho dist�ncia dessa rede social porque, a meu ver, ela amplifica a n�veis infinitos justamente as duas atividades que menos me interessam neste mundo:
1) Divulgar ao restante do planeta o que penso sobre todo e qualquer assunto e a quantas anda minha vida pessoal;
2) Ficar sabendo o que o restante do planeta pensa sobre todo e qualquer assunto e a quantas andam suas vidas pessoais.
Sempre brinco com colegas, meio a s�rio, que, se n�o consigo me interessar nem pela minha pr�pria vida, que dir� pela dos outros. Assim, n�o acho que o Facebook seja meu lugar.
E falo em termos gen�ricos, sem tocar numa particularidade do "Feice" no Brasil: a pestil�ncia do embate pol�tico sect�rio e da milit�ncia paga, que encontrou terreno f�rtil no esgoto virtual.
Sei, no entanto, que essa minha atitude distante se equilibra em uma premissa cada vez mais fr�gil: a de que existe uma distin��o clara entre o mundo on-line e o mundo real. � uma linha divis�ria que est� se apagando.
Surgiu um fio de esperan�a na �poca da pol�mica sobre a cor de um vestido, h� algumas semanas. Aquele que, para certas pessoas, parecia branco e dourado; para outras, preto e azul.
Essa hist�ria aparentemente t�o banal "viralizou'' por causa do "Buzzfeed", que descobriu o caso no blog pessoal de uma convidada de um casamento e o transformou em uma not�cia que rodou o mundo.
Entrevistado sobre a enorme repercuss�o, um alto dirigente do site declarou: "Dessa vez, o mundo da internet invadiu o mundo real". Fiquei contente: at� algu�m do "Buzzfeed'', um site t�o moderno, admitia que mundo on-line e mundo real s�o coisas diferentes.
Mas a alegria vai durar pouco: a mudan�a � avassaladora. Facebook e vida unidos em um plasma insepar�vel. Melhor ficar longe disso–s� espero que seja poss�vel.
Livraria da Folha
- Cole��o "Cinema Policial" re�ne quatro filmes de grandes diretores
- Soci�logo discute transforma��es do s�culo 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD re�ne dupla de cl�ssicos de Andrei Tark�vski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade