Graduado em qu�mica e jornalismo pela USP, tem especializa��o em jornalismo cient�fico pelo MIT.
Papel = internet
Surpresa no meio de uma viagem por um lugar distante e praticamente sem internet: o site do "New York Times", um dos melhores jornais do mundo, estava diferente. Cheguei a pensar que fosse defeito da transmiss�o, e a p�gina n�o tivesse "montado" direto. Mas, com uma lenta pesquisa (o normal seria dizer "r�pida pesquisa", por�m n�o com a conex�o que eu tinha), deu para constatar: era mesmo um novo projeto gr�fico.
Sa�ram os t�tulos em azul, dando lugar a letras pretas, em it�lico, iguais �s do jornal de papel. As p�ginas de reportagens ficaram mais limpas, com o texto centralizado. Os coment�rios de leitores foram i�ados da parte de baixo da tela —agora correm paralelos, na mesma altura do texto principal.
S�o muitas novidades, algumas delas impercept�veis para o leitor comum. De todas, a que me parece mais importante � que, visualmente, o site do "New York Times" ficou praticamente id�ntico ao jornal impresso.
Essa � uma mudan�a crucial de conceito. Nos prim�rdios da web, o leitor deve se lembrar, muitos ve�culos tradicionais nem usavam seus pr�prios nomes nos sites. O "Washington Post", por exemplo, na internet se chamava "digitalink.com" ("tintadigital.com"). A revista "New Scientist" era "planetscience.com".
O racioc�nio por traz disso era �bvio: a nave-m�e � o impresso, n�o vamos queimar nossa marca nessa aventura; a gente adota outro nome na internet e depois v� no que d�. Papel era papel, internet era internet.
Vinte anos depois, o "NYT", t�o imitado e influente, d� um passo corajoso: em identidade visual, papel e on-line praticamente n�o t�m mais distin��o. A "homepage" do site e a capa do jornal f�sico s�o g�meas quase id�nticas.
E isso, no caso do "New York Times", tem um valor simb�lico muito forte. Segundo uma reportagem recente do jornal ingl�s "The Guardian", na grande maioria dos sites noticiosos l�deres de audi�ncia, a homepage, p�gina de abertura, n�o � t�o importante. S� 10% dos leitores come�am por ela e depois v�o clicando nas not�cias. A grande maioria j� entra direto nos textos, vindos de links em redes sociais e de pesquisas no Google.
No caso do "NYT", essa estat�stica � muito diferente. A marca � t�o forte que nada menos que metade dos leitores inicia a leitura do site pela homepage. Para esse p�blico, digitar nyt.com, quando se est� em busca de not�cias, � uma a��o autom�tica.
Outro ponto a destacar: assim como em v�rios outros sites importantes com origem em ve�culos impressos, inclusive no Brasil, os recursos audiovisuais da internet s�o bastante explorados no novo projeto gr�fico americano.
At� h� alguns anos, uma revista ou jornal impresso que obtivesse um v�deo sensacional, um grande furo de reportagem, pouco teria o que fazer. Poderia, no m�ximo, montar uma sequ�ncia de imagens no papel inerte: o que se chama, no jarg�o jornal�stico, de "cineminha". E depois torcer para que uma emissora de TV pedisse o v�deo, e pusesse no ar com o devido cr�dito.
Isso mudou, o que eventos recentes no Brasil deixam claro. Os v�deos da barb�rie no pres�dio de Pedrinhas, no Maranh�o, foram divulgados pela vers�o on-line da Folha, na origem um jornal impresso. Foi tamb�m esse o caso do v�deo em que Chico Buarque dava ao pesquisador Paulo C�sar Ara�jo uma entrevista que ele, Chico, vinha negando ter concedido (furo do site do jornal "O Globo").
A inova��o apareceu at� em um caso folcl�rico, o do not�rio Rei do Camarote. No fim do ano passado, o sujeito virou febre na internet gra�as a um v�deo editado com muita intelig�ncia (e veneno) pelo site de uma revista de papel, a "Veja S�o Paulo".
Enquanto escrevo esta coluna, ou�o uma entrevista do roqueiro Stephen Malkmus, da banda Pavement, na r�dio BBC 6. Ele agradece pela emissora estar tocando bastante uma can��o sua. S� que n�o diz "emissora", nem "r�dio". Diz "canal".
N�o d� para culpar o velho Stephen pela imprecis�o. O mundo est� mesmo assim: r�dios transmitem imagens, jornais e revistas fazem v�deos, a TV se aproxima da internet, o pr�prio conceito de canal ficou muito mais amplo.
Na segunda d�cada do s�culo 21, uma palavra antiga alcan�a finalmente seu significado pleno: multim�dia. A gente j� usava, mas n�o sabia que ela queria dizer tanta coisa.
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