Graduado em qu�mica e jornalismo pela USP, tem especializa��o em jornalismo cient�fico pelo MIT.
Aqui n�o tem tarifa zero
Eles n�o pedem redu��o de tarifa, nunca usaram transporte p�blico, se bobear n�o sabem nem que existem �nibus e trens.
Tamb�m n�o querem saber quem est� no governo, n�o se preocupam com a democracia ou com a falta dela, n�o apanham da pol�cia, nunca viram uma passeata.
Ignoram os estudos e nem para sexo ligam muito.
Querem, isso sim, cultuar celebridades, melhor ainda, querem ser celebridades. Vivem para consumir, e � o seguinte: n�o pretendem pagar.
Eles s�o o "Bling Ring" ("A Gangue de Hollywood", na pouco sutil tradu��o brasileira), retratados no novo filme de Sofia Coppola. Estreia no dia 2 de agosto no Brasil. Vi h� algumas semanas nos EUA.
"Ring", aqui, n�o � "anel", significado mais comum. � "bando", ou, mais precisamente, "patota". E "Bling" � uma onomatopeia, o "plim-plim" met�lico das joias quando resvalam umas nas outras.
O nome original do filme resume a principal atividade dessa patota adolescente: fazer furtos, preferencialmente de joias e acess�rios de alto valor, nas casas de celebridades.
Aconteceu de verdade. Entre 2008 e 2009, quatro garotas e um menino, todos de fam�lias ricas da regi�o de Los Angeles, descobriram um novo tipo de divers�o. Pela internet, ficavam sabendo quando seus famosos preferidos estavam fora da cidade. E, pela mesma rede, encontravam facilmente os endere�os das estrelas.
Para brasileiros, pode parecer estranho, mas essas celebridades, quando iam viajar, n�o se dignavam nem a trancar a casa. Tamb�m n�o tinham um staff de funcion�rios 24 horas, ou seguran�as.
Assim, ficava f�cil para o "Bling Ring" atacar. Entre as v�timas, Paris Hilton, Orlando Bloom e Lindsay Lohan. Foram mais de R$ 6 milh�es em mercadorias furtadas.
Para as filmagens, Paris cedeu a pr�pria mans�o, uma esp�cie de masmorra kitsch cuja est�tica faz Hebe Camargo parecer uma campe� do minimalismo. S� por mostrar esse monumento � opul�ncia sem no��o, o filme j� vale.
O que torna essa hist�ria t�o interessante, a meu ver, � o perfil social dos ladr�ezinhos. No padr�o americano, s�o de classe m�dia alta. Mas muito diferentes, por exemplo, da juventude do romance "Abaixo de Zero", de Bret Easton Ellis, tamb�m ambientado em Los Angeles, s� que nos anos 80.
Os jovens de "Abaixo de Zero" j� s�o a elite da elite de L.A. N�o precisam cultuar celebridades, porque convivem com elas. Se, em uma festa, veem a atrizinha do momento jogada no ch�o com uma seringa de hero�na espetada no bra�o, passam direto, ocupados de si pr�prios.
O pessoal de "Bling Ring", n�o. A turma mora em Los Angeles, verdade. Mas � uma outra L.A., aquela do lado de l� das montanhas, o chamado Vale de San Fernando. Onde tamb�m existe muita grana, mas faltam o glamour e a tradi��o de Beverly Hills. Mal comparando, se Beverly Hills � a zona sul do Rio, o Vale � a Barra da Tijuca.
� nessa pequena diferen�a entre o mundo do "Bling Ring" e o mundo das celebridades (t�o pr�ximo, mas ao mesmo tempo t�o distante do Vale de San Fernando) que est� a for�a do filme.
Os mais velhos talvez se lembrem de "Valley Girl" ("Garota do Vale"), can��o de Frank Zappa que retrata exatamente esse universo. As jovens de Zappa, como as de Sofia Coppola, s� pensam em joias, roupas e sapatos. E precisam explicar que moram no Vale, "mas na parte boa".
Coppola tomou algumas decis�es radicais para construir o filme. A fim de retratar a aus�ncia dos pais na cria��o da molecada, ela os fez literalmente ausentes. Com uma �nica exce��o, pais e m�es simplesmente n�o aparecem. S� mesmo no �ltimo ato do longa, quando cai a casa dos jovens ladr�es, � que os coroas surgem. Como perfeitos patetas, sem a menor ideia do que est� acontecendo.
Outra decis�o importante da diretora tem a ver com o perfil psicol�gico dos adolescentes. Ela optou por n�o investir nisso. Os personagens s�o como s�o, ponto. Sem explica��es. Especialmente no caso de Rebecca, a l�der da gangue, t�o jovem e j� t�o fria e manipuladora, senti falta de um aprofundamento maior.
Para os padr�es de Sofia Coppola, disc�pula de Antonioni pouco chegada a di�logos, "Bling Ring" tem at� muitas falas. E, como sempre nos filmes dela, a fotografia � deslumbrante.
Entre poucos erros e muitos acertos, uma estreia e tanto. N�o perca.
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