Graduado em qu�mica e jornalismo pela USP, tem especializa��o em jornalismo cient�fico pelo MIT.
A hora e a vez do digital-popular
Antigamente era o poder que cooptava os jovens, mas neste caso acho que aconteceu o contr�rio.
Falo da ocupa��o em massa de cargos na �rea cultural da Prefeitura de S�o Paulo por militantes do "Existe Amor em SP".
Esse movimento, alegadamente apartid�rio, surgiu na �poca das elei��es municipais. Em tese, apenas combatia a candidatura de Celso Russomanno, sem apoiar ningu�m. Em outubro passado, juntou 10 mil pessoas na pra�a Roosevelt, "para defender a cultura".
A not�cia da ades�o foi dada pelo blog "Pol�tica Paulistana", assinado por Diego Zanchetta no portal do "Estad�o". O contra-ataque � nota, como sempre acontece nessa turma superconectada e com bastante tempo livre, foi imediato e em bloco.
V�rios dos nomes citados --e outros que trafegam na mesma �rbita, que se pode chamar de "indie estatal"-- escreveram longu�ssimos textos na internet atacando furiosamente a reportagem. Fazem parte desse grupo militantes "full time", jornalistas, empres�rios, agitadores culturais etc. Detalhe curioso: nenhuma informa��o foi desmentida.
A bronca toda � porque eles simplesmente acham muito bossa nova, muito natural, que os participantes de um movimento "apartid�rio" sejam, poucos meses depois, chamados a trabalhar e/ou colaborar na administra��o petista.
Que um rep�rter se atreva a divulgar o fato �, para eles, mais um ataque trai�oeiro, mais uma manipula��o da "imprensa golpista".
Percorri o "Pol�tica Paulistana". Pode ser ingenuidade minha, mas n�o enxerguei nenhum vi�s antipetista. � um blog sobre administra��o municipal, com algumas notas favor�veis e outras desfavor�veis � prefeitura. Nada fora do normal.
Entro em terreno perigoso. Se disser que, lendo o "Pol�tica Paulistana", conheci boas iniciativas do prefeito Fernando Haddad, corro o risco de ser chamado de "vendido", "petralha". Se eu lembrar que a "Virada Cultural" (evento em que esse pessoal rec�m-admitido mergulhou e do qual j� parece dono) foi criado pelo ex-prefeito Jos� Serra, vou ser carimbado como "direitista", "rea�a".
Tentando sair desse debate manique�sta, queria chamar a aten��o para outros pontos.
A entrada do pessoal do "Existe Amor em SP" para a administra��o Haddad vai muito al�m de arrumar uma boquinha no servi�o p�blico. At� porque v�rios cargos s�o de participa��o volunt�ria e n�o remunerados. Trazem mais influ�ncia que retorno financeiro.
O que ela sinaliza, a meu ver, � a cristaliza��o, tamb�m em S�o Paulo, da ideologia digital-popular das administra��es de Gilberto Gil e Juca Ferreira no Minist�rio da Cultura. Na fachada, um discurso prafrentex: software livre, videogame tamb�m � cultura, Creative Commons e sua vis�o libert�ria de direitos autorais. Mas, no alicerce, impera a tese de que n�o existe vida cultural fora do guarda-chuva estatal ou paraestatal.
Est� se criando toda uma gera��o de p�blico dependente de cultura subsidiada, em especial na m�sica. Uma audi�ncia acostumada a festivais gratuitos bancados por secretarias de Cultura, e shows a pre�os irris�rios nos Sescs.
Os indies estatais adoram posar de portadores de uma nova verdade, a verdade do s�culo 21. Mas existe coisa mais antiga do que artista se pendurar no Estado?
E n�o vai aqui nenhuma cr�tica a piori ao incentivo estatal � cultura. Outro dia, um amigo, muito mais informado que eu sobre o universo digital, me explicava que a maioria das exporta��es do Canad� vem da chamada economia criativa. O que s� foi poss�vel gra�as a incentivos dos governos provinciais a essa �rea.
Na Finl�ndia, programas de fomento � cultura digital est�o por tr�s de um fen�meno avassalador, o videogame "Angry Birds".
Mas nem no Canad� nem na Finl�ndia a vida pol�tica � t�o rasteira e polarizada, nem apoio pol�tico e incentivo financeiro andam t�o juntos quanto no Brasil.
Esse povo que entrou agora para a prefeitura pode parecer culturalmente diversificado, mas ideologicamente forma um mon�lito. Lulismo ferrenho, incapacidade (ou desinteresse) de pensar cultura sem muleta do governo.
Apesar de os adeptos do indie estatal se fazerem de v�timas e perseguidos, seus principais gurus est�o muito bem representados em colunas na grande imprensa, programas de TV, s�o curadores de festivais, trafegam pelo bastidores das estatais que financiam cultura, s�o especialistas em ganhar editais.
Com habilidade nos bastidores e a��es ardilosas, o ide�rio e a praxis digital-popular tomam conta da �rea de cultura da Prefeitura de S�o Paulo. Coopta��o invertida, novidade do s�culo 21.
Livraria da Folha
- Cole��o "Cinema Policial" re�ne quatro filmes de grandes diretores
- Soci�logo discute transforma��es do s�culo 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD re�ne dupla de cl�ssicos de Andrei Tark�vski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade