Graduado em qu�mica e jornalismo pela USP, tem especializa��o em jornalismo cient�fico pelo MIT.
Luxo e pobreza no rock
Um trabalhava nas madrugadas como frentista, era anor�xico, tornou-se m�sico sem estudo formal, virou �dolo (pelo menos de outros m�sicos), tem horror ao mundo corporativo das gravadoras e, agora, afundado em d�vidas, precisou pedir dinheiro aos f�s pela internet para pagar o aluguel atrasado.
O outro tem origem de classe m�dia, cresceu saud�vel, frequentou faculdade de m�sica, criou um selo pr�prio para lan�ar o primeiro disco, sempre fez tudo sozinho, ganhou um Oscar e hoje mora em uma mans�o envidra�ada nas montanhas de Los Angeles.
O primeiro � o ingl�s Vini Reilly, 59, l�der e guitarrista da banda Durutti Column (n�o se sinta ignorante se n�o conhecer --99,9999% da humanidade est�o no mesmo barco). Seus discos, sem exce��o cultuados por especialistas de todo o mundo, sempre venderam muito pouco.
O segundo, quem viu a entrega do Oscar 2012 talvez se lembre, � o americano Trent Reznor, 47, l�der da banda Nine Inch Nails e autor da trilha sonora de "A Rede Social", pela qual foi premiado pela Academia. Sucesso de cr�tica e p�blico (pelo menos no mundo do rock alternativo), j� vendeu 16 milh�es de CDs.
S�o praticamente da mesma gera��o, mas tiveram destinos cruelmente opostos.
Vini � filho do p�s-Guerra. Como tantos de seus contempor�neos e conterr�neos do rock, n�o frequentou "art school", aprendeu nas ruas o muito que sabe.
Trent, n�o se pode dizer que tenha sido criado a pera com leite, mas, em compara��o � dureza da inf�ncia e adolesc�ncia de Reilly, � um perfeito filhinho de papai.
O som de Vini Reilly, primordialmente um guitarrista, costuma ser chamado de p�s-punk. Mas essa � s� uma defini��o cronol�gica. Musicalmente, ele n�o tem nada a ver com as outras bandas desse per�odo. Durutti Column incorpora os viol�es do flamenco, alguns climas de jazz e de m�sica ambiente. � um esfor�o e tanto cham�-lo de rock.
Sobre a m�sica de Trent Reznor e seu Nine Inch Nails, n�o h� d�vida. � rock, da vertente industrial. Violento, confessional e fortemente baseado em sintetizadores. Vi o grupo em in�cio de carreira, nos EUA, em mar�o de 1990. Os m�sicos trocavam socos entre si e tratavam a plateia a golpes de correntes e cusparadas de cerveja.
Ambos, Vini Reilly e Trent Reznor, s�o absurdamente talentosos. Topei com os dois, metaforicamente, no come�o do ano.
Com Trent, em um perfil publicado na revista "New Yorker" de 17/12/2012. Com Vini, lendo, nos primeiros dias de 2013, o blog de m�sica do di�rio ingl�s "Guardian".
A reportagem da "New Yorker", assinada por Alec Wilkinson, faz uma radiografia detalhada de Reznor. Mostra que ele foi o primeiro a introduzir melodia na aspereza do rock industrial. E que tamb�m foi pioneiro nesse g�nero ao atuar como "frontman", face p�blica de uma banda. At� ent�o, o rock industrial, de origem europeia e com forte influ�ncia marxista, rejeitava o individualismo.
O post do "Guardian" sobre Vini Reilly era tristeza pura. Relatava como um sobrinho do m�sico, para o tio n�o ser despejado, entrou no site oficial da banda pedindo doa��es. A mobiliza��o foi imediata.
Em poucas horas, o sobrinho voltou a fazer contato, dizendo que j� tinham arrecadado R$ 9,5 mil e n�o era preciso mais mandar dinheiro.
A hist�ria de Reznor � tumultuada, principalmente pelos problemas que teve com coca�na e hero�na. Mas � uma hist�ria de showbizz, como tantas que se conhecem nesse meio.
J� a de Reilly � absolutamente incomum. Para come�ar, ele n�o conseguia aceitar a ideia de ter seu trabalho em lan�amento comercial.
Quando um dia foi visitar a sede da gravadora Factory e viu seu primeiro �lbum sendo embalado (por ningu�m menos que o pessoal do Joy Division, que era do mesmo selo e dava uma for�a ao amigo), saiu correndo de pavor.
Tamb�m era, e �, dono de uma autocr�tica incapacitante. Considera todos os seus �lbuns -com exce��o de "Keep Breathing", de 2006- fracassos musicais.
Reznor esbanja vigor f�sico. Reilly se recupera de tr�s acidentes vasculares cerebrais nos �ltimos dois anos. O americano enxergou um caminho relativamente suave em meio a um g�nero musical essencialmente abrasivo.
Ironicamente, o ingl�s, de matriz musical mais pl�cida, mergulhou em abismos que ele pr�prio criou.
Trent Reznor se vira sozinho. Tor�amos por Vini Reilly.
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