Como no fantástico miniconto do escritor guatemalteco Augusto Monterroso —"Quando acordou o dinossauro ainda estava lá"—, Bolsonaro continua vivo. Depois de quatro anos no poder, quase metade dos eleitores decidiu que a destruição do país que ele promoveu e promete promover mais deve prosseguir. Faltou fazer certas coisas.
Se (de acordo com as pesquisas) Lula passou a campanha inteira do primeiro turno como o adversário a ser alcançado, no segundo Bolsonaro é o candidato a ser batido —e não será fácil. O voto útil trabalhado pela campanha lulista veio de forma inversa: eleitores de Tebet e sobretudo de Ciro, a terceira via inexistente, migraram para o lado do capitão. O antipetismo, embora menor do que em 2018, ainda desequilibra —ou, no caso, equilibrou as duas maiores preferências.
A extrema direita e o reacionarismo deram provas de sua força. Uma força sorrateiramente oculta, mas que na hora agá revela-se nas urnas. Apesar de seus desempenhos pífios e até criminosos, sete ex-ministros asseguraram vagas no Congresso: Damares Alves, Tereza Cristina, Rogério Marinho, Marcos Pontes e Sergio Moro no Senado; na Câmara, Ricardo Salles e Eduardo Pazuello, este o "cumpridor de ordens" no combate desastroso à Covid. Contrariando as previsões, o vice-presidente Hamilton Mourão se elegeu senador no Rio Grande do Sul.
Descolando-se do presidente, mas mantendo a linha conservadora, Romeu Zema e Cláudio Castro levaram de lavada os governos de Minas e do Rio. Em São Paulo, o bolsonarista Tarcísio de Freitas herdou os eleitores do PSDB, partido em extinção, e chegou para a segunda rodada à frente do petista Fernando Haddad.
A impressão é que, se não tivesse existido a pandemia e se Lula não fosse um fenômeno político, capaz de vencer em todos os estados do Nordeste, Bolsonaro estaria hoje melhor na foto. Centrão, máquina estatal e bilhões da PEC Kamikaze acabaram funcionando.
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