� jornalista gastron�mica, 'foodtrotter' e autora de 'Jantares de Mesa e Cama'. Escreve aos domingos, a cada duas semanas.
Em pontos tur�sticos como Trancoso, tradi��es da cozinha s�o esquecidas
Vitch� Palacin-01.set.2005/Folhapress | ||
Casas do Quadrado de Trancos |
Esses dias vi bem de perto, pela primeira vez, um tatu. Bicho lindo! A cabecinha delicada, o casco articulado e o rab�o eram cinza bem clarinho. Parecia adormecido dentro da panela —estava prestes a virar ensopado, temperado com cominho e coentro.
Eu estava visitando a um casal de velhos nativos de Trancoso, um dos povoados � beira-mar mais antigos do Brasil e hoje destino favorito de f�rias de milion�rios e famosos. N�o os nomeio porque ca�ar bicho silvestre � contra a lei.
Alheios � proibi��o, seguem ca�ando como aprenderam com seus ancestrais e como sempre fizeram. Carne de ca�a, mais abundante que peixe ou polvo, era a base da alimenta��o quando ainda n�o havia luz nem �gua corrente.
Sa� dali e fui prosear com dona Ordana, 90, que, al�m de fazer o beiju de coco mais famoso daquelas bandas, tinha uma farinheira a poucos metros do mar e criava porcos.
� noite, comi um polvo � lagareiro no El Gordo, qui�� o mais caro entre os car�ssimos restaurantes para turistas de Trancoso. O contraste com o que eu havia visto de dia n�o poderia ser mais gritante.
Vejo com bons olhos muito do que o progresso e a grana dos forasteiros trouxeram. R�cula era uma raridade, hoje abunda na feira. Ali se acha pizza, sushi e comida indiana. Por outro lado, lastimo fazerem t�o pouco do passado e irem aposentando, uma por uma, as receitas de antigamente.
Os restaurantes da Trancoso de hoje servem os mesmos peixes que comemos em S�o Paulo: badejos e robalos trazidos de Porto Seguro, salm�o chileno que chega congelado. "N�o uso no restaurante os peixes dos pescadores locais porque o fornecimento � inst�vel e meus clientes t�m pavor de espinhas", diz Silvia Calazans, do famoso Restaurante da Silvinha.
Dona Evane, outra lend�ria cozinheira local, serve em sua Barraca do Z� Barbudo lagostas e moquecas feitas de peixe trazido de longe. Mas em casa faz pernil assado, feij�o tropeiro e galinhada para a filharada. "Ah, turista n�o quer saber dessas comida n�o!", diz ela.
Faz sentido oferecer no menu o que os clientes mais pedem. Mas de moqueca em moqueca e lagosta em lagosta a culin�ria "pra turista" vai se uniformizando ao longo de toda a costa brasileira. � pena que os "hits" dos restaurantes de praia releguem as receitas e as tradi��es regionais ao esquecimento.
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A coluna "A Gourmet" � publicada aos domingos a cada 15 dias na "revista s�opaulo"
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