Nature 'despublica' influente estudo sobre Alzheimer por causa de imagens manipuladas

Pesquisa se torna a 2º com mais citações a ser retratada; primeiro autor discorda da retratação

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São Paulo

A Nature "despublicou" —o que no universo científico significa que retratou— nesta segunda-feira (24) uma influente pesquisa sobre Alzheimer, inicialmente publicada em 2006. Segundo a revista científica, imagens do estudo apresentavam manipulação excessiva, como corte, duplicação e uso de ferramenta para apagar partes de figuras.

Ser retratado, em linhas gerais, significa que os resultados do trabalho devem ser desconsiderados.

O artigo, dessa forma, torna-se o segundo com mais citações (pouco mais de 2.300) a ser retratado —considerando a contagem até o momento da despublicação—, segundo o site Retraction Watch, que acompanha os movimentos de retratação em revistas. Essa lista está atualizada até 19 de junho, o que faz com que a pesquisa "despublicada" pela Nature ainda não esteja presente.

Médico analisa exame de paciente com Alzheimer em hospital em Boston - Brian Snyder - 30.mar.23/Reuters

"Os dados não podem ser verificados nos registros. Consideramos que o curso de ação apropriado é retratar o artigo", diz a Nature, em nota.

A Folha mostrou, na semana passada, as críticas existentes sobre o estudo, o silêncio de seu primeiro autor, Sylvain Lesné, em relação às acusações, e o movimento de sua autora correspondente, Karen Ashe, que inicialmente defendia que a pesquisa não deveria ser "despublicada", mas que, recentemente, havia afirmado que o paper deveria ter como fim a retratação. Ashe, porém, publicou estudo semelhante, com outros coautores, em outra revista, após refazer os experimentos que levaram aos resultados inicialmente mostrados na Nature.

A imagem mostra um resultado típico de Western Blot, uma técnica de laboratório usada para detectar proteínas específicas em uma amostra. Há várias bandas escuras distribuídas horizontalmente ao longo do gel, indicando a presença de proteínas em diferentes pesos moleculares.
Figura presente no estudo sobre Alzheimer publicado na Nature que, segundo a pesquisadora Karen Ashe, teria sido manipulada; imagem é um westen blotting, um método, em linhas gerais, usado para detectar proteínas; imagem mostra níveis de aglomerados de beta-amilóide - Reprodução

A Nature afirma, em nota, que Lesné foi o único autor a não concordar com a retratação. Segundo a revista, Austin Yang, outro dos autores, não respondeu às tentativas de contato da Nature.

Ashe, que é professora do Departamento de Neurologia da Universidade de Minnesota (Estados Unidos), havia tornado pública, recentemente, a decisão sobre o pedido de retratação no PubPeer, uma espécie de fórum online para discussões de artigos científicos revisados por pares.

Há várias bandas escuras distribuídas horizontalmente
Figura presente no estudo sobre Alzheimer publicado na Nature que, segundo a pesquisadora Karen Ashe, teria sido manipulada; imagem é um westen blotting, um método, em linhas gerais, usado para detectar proteínas; imagem mostra níveis de aglomerados de beta-amilóide - Reprodução

A docente afirmou ter tomado conhecimento das acusações contra o estudo em 2022. Também desde 2022 havia uma nota na página do estudo alertando que havia preocupações com relação a algumas imagens presentes na pesquisa.

O estudo retratado apontava que a Aβ*56 (leia beta-amilóide estrela 56) exercia um papel relevante na deterioração da memória no Alzheimer, mesmo sem a formação de placas beta-amilóides ou perdas neuronais. Essa proteína também poderia contribuir, segundo o estudo desenvolvido em camundongos, para os déficits cognitivos do Alzheimer.

Isso, consequentemente, colocaria a Aβ*56 como um potencial alvo terapêutico contra o Alzheimer.

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