Sem verba, institutos nacionais de pesquisa correm risco de fechar
Kelly Lima | ||
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'Tesour�metro' localizado no campus da UFRJ, no Rio, calcula o montante subtra�do dos or�amentos dedicados � pesquisa nacional e �s universidades p�blicas nos �ltimos dois anos |
A ci�ncia brasileira anda � m�ngua. Os recursos federais para o setor, que j� vinham em trajet�ria descendente nos �ltimos anos, dever�o ser em 2017 os menores em mais de uma d�cada.
Do or�amento de R$ 6 bilh�es proposto no come�o do ano, apenas R$ 3,3 bilh�es poder�o ser usados ap�s o corte de 44% nos recursos de livre aplica��o do Minist�rio da Ci�ncia e Tecnologia (fundido pela gest�o Temer com o das Comunica��es –tornando-se o MCTIC).
Enquanto o dinheiro foi escasseando, a comunidade cient�fica s� fez aumentar. Nos �ltimos dez anos, o n�mero de pesquisadores em atividades no Brasil mais do que dobrou. Se a ci�ncia nacional fosse um pa�s, seria poss�vel afirmar que, na �ltima d�cada, seu PIB per capita reduziu-se a menos da metade –algo pr�ximo de uma cat�strofe.
Embora tenha impacto sobre toda a cadeia –das ag�ncias p�blicas de fomento aos estudantes de p�s-gradua��o, passando pelos pesquisadores–, a pen�ria financeira tem afetado especialmente as institui��es de pesquisa ligadas ao MCTIC.
No fim da �ltima semana, o quase septuagen�rio Centro Brasileiro de Pesquisas F�sicas, sediado no Rio, enviou ao Tribunal de Contas da Uni�o um of�cio no qual descreve o cen�rio de quase colapso enfrentado pela institui��o.
Segundo o documento, ao qual a Folha teve acesso, "as dificuldades or�ament�rias colocaram a institui��o em situa��o de risco operacional".
"Se nada mudar, eu n�o terei como pagar em setembro a conta de luz e o sal�rio dos funcion�rios terceirizados", disse � reportagem o diretor do CBPF, Ronald Shellard.
Shellard afirma que o instituto est� pleiteando recursos para conseguir "literalmente sobreviver" at� o final do ano. "N�o estamos pedindo nem os R$ 3 milh�es necess�rios para a manuten��o dos caros equipamentos da institui��o".
EVOLU��O DO N�MERO DE PESQUISADORES EM ATIVIDADE NO BRASIL - Em mil
Al�m do comprometimento das atividades do CBPF, a falta de recursos pode ter impacto direto sobre centenas de institui��es p�blicas do Rio, como universidades, hospitais, ag�ncias de fomento e �rg�os de Estado, j� que o instituto de f�sica abriga o principal n� da internet acad�mica no Rio. "Se cortarem a luz, acaba a conex�o de internet das institui��es do Rio de Janeiro", diz o diretor.
Membro do CBPF desde 1994, Shellard diz nunca ter presenciado no centro uma priva��o de recursos t�o grave como a atual.
A situa��o enfrentada pela institui��o carioca se reproduz, em menor ou maior grau, em outros institutos ligados ao MCTIC –todos penalizados com um corte de 44% em seus or�amentos.
Augusto Gadelha, diretor do Laborat�rio Nacional de Computa��o Cient�fica, em Petr�polis, � direto sobre o estado de sua institui��o: "Mantido o corte, n�s teremos de fechar as portas em outubro".
O laborat�rio abriga o supercomputador Santos Dumont, o �nico representante nacional na lista das 500 m�quinas mais potentes do mundo. Mant�-lo funcionando implica uma conta de luz de cerca de R$ 500 mil por m�s. Segundo Gadelha, ele tamb�m poder� ter de ser desligado em outubro.
"Isso significa que cerca de cem projetos de pesquisa de todo o pa�s que utilizam o supercomputador ter�o de ser interrompidos", diz
A situa��o � a mesma no Museu Em�lio Goeldi, em Bel�m (PA), institui��o criada h� 150 anos. "Com os atuais recursos, n�s n�o conseguiremos chegar at� o final do ano", afirma Nilson Gabas, diretor do museu de hist�ria natural.
Isso representaria o fechamento n�o s� das unidades de pesquisa como tamb�m de um parque composto por um zool�gico e um jardim bot�nico, que recebe cerca de 400 mil visitantes ao ano.
GRANDES E PEQUENOS
J� os dois maiores institutos nacionais, a despeito das dificuldades, vem conseguindo sobreviver na crise, pois contam eventualmente com recursos de fora do MCTIC e certa capacidade de remanejamento interno.
O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, em S�o Jos� dos Campos (SP), cortou todos os investimentos e deve adiar o lan�amento do novo sat�lite de monitoramento da Amaz�nia, mas conseguir� aguentar at� o final do ano, segundo seu diretor, Ricardo Galv�o.
No Instituto Nacional de Pesquisas da Amaz�nia, em Manaus, seu diretor, Luiz Renato de Fran�a, teve de reduzir ao m�ximo os recursos para a pesquisa e fez acordos com a companhia de luz para baratear a conta da institui��o.
Centros menores, contudo, t�m margem de manobra bem mais limitada. O Laborat�rio Nacional de Astrof�sica, em Itajub� (MG), teve de demitir praticamente todos os funcion�rios terceirizados, de acordo com Bruno Castilho, diretor da institui��o, comprometendo com isso a seguran�a dos equipamentos do centro.
A falta de recursos, al�m disso, impede o laborat�rio de honrar os compromissos brasileiros firmados para o uso de grandes telesc�pios internacionais, como o Observat�rio Gemini, no Chile. Se a situa��o persistir, adverte Castilho, o Brasil pode vir a ser retirado do cons�rcio internacional que utiliza os observat�rios.
No Centro de Tecnologias Estrat�gicas do Nordeste, no Recife, o diretor Andr� Galembeck j� teve de demitir metade dos funcion�rios terceirizados. Agora, estuda "na melhor das hip�teses" reduzir a jornada do restante.
"Corro o risco tamb�m de ter de fechar laborat�rios que inclusive me ajudam a ter receita, pela parceria com empresas", diz Galembeck.
O temor � que, com a aprova��o do teto de gastos p�blicos, a situa��o de escassez se mantenha nos pr�ximos anos. A Folha apurou que a proposta or�ament�ria preliminar do minist�rio para 2018 � pr�xima do valor que restou neste ano ap�s o contingenciamento.
Procurado, o MCTIC diz que "atua junto aos Minist�rios da Fazenda e do Planejamento pelo descontingenciamento de recursos" e que acompanha as "atividades dos institutos de pesquisa de maneira a evitar que impactos significativos venham a ser observados".
Para o f�sico Luiz Davidovich, presidente da ABC (Academia Brasileira de Ci�ncias), a ci�ncia brasileira passa por um processo de "dizima��o".
"Os nossos economistas seguem uma l�gica de padeiro. Na crise, cortam gastos", diz Davidovich, "mas ci�ncia n�o � gasto, � investimento". Segundo ele, nos pa�ses desenvolvidos, cada d�lar investido na �rea tem retorno, em m�dia, de cinco vezes esse valor.
"O governo manifesta sua ignor�ncia quanto ao papel da ci�ncia e tecnologia para o desenvolvimento nacional. Estamos perdendo terreno para outros pa�ses em �reas estrat�gicas", lamenta o presidente da ABC.
Editoria de Arte/Folhapress | ||
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SITUA��O DAS INSTITUI��ES LIGADAS AO MCTIC DEPOIS DO CORTE DE 44% - Or�amento, em R$ milh�es
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