Sem verba, Brasil vira s�cio de reator de fus�o nuclear
Os f�sicos brasileiros que estudam fus�o nuclear parecem finalmente ter conseguido fundir seu conhecimento e gerar for�a para que essa linha de pesquisa tome rumo no Brasil. Ap�s uma longa negocia��o, um acordo permitir� ao pa�s participar do maior experimento de fus�o do mundo, e a partir deste ano brasileiros concentrar�o seus esfor�os num novo laborat�rio, na cidade de Cachoeira Paulista, no Vale do Para�ba.
Dentro de alguns meses, um acordo formal deve ser assinado para que o pa�s possa enviar pesquisadores ao Iter --prot�tipo de reator gigante que est� sendo constru�do em Cadarache (Fran�a), numa colabora��o entre diversos pa�ses. O Brasil, por�m, n�o vai injetar verba no projeto diretamente.
"Vamos ser colaboradores n�o cotistas. Participaremos do projeto, mas n�o teremos direito a royalties das tecnologias que ser�o geradas l�", explicou � Folha Odair Gon�alves, presidente da Cnen (Comiss�o Nacional de Energia Nuclear). O dinheiro gasto no in�cio da colabora��o, diz, ser� apenas com bolsas de cientistas e cobertura de infraestrutura para comunica��o e viagens.
A fus�o nuclear � hoje o Santo Graal da f�sica aplicada. Ao imitar o modo de produ��o de energia do Sol, ela oferece a possibilidade de gerar for�a sem emitir gases-estufa e usando combust�vel barato --hidrog�nio, o elemento mais abundante do Universo, que pode ser extra�do da �gua. Se um dia se tornar vi�vel, quase n�o vai gerar lixo radioativo, diferentemente de sua prima "suja", a fiss�o, que move as usinas nucleares atuais.
Como o Brasil possui uma matriz energ�tica variada e relativamente limpa, os f�sicos avaliaram que n�o vale a pena gastar pesado com pesquisas de fus�o, ainda. Cotistas do Iter est�o entrando com verbas na escala de centenas de milhares de d�lares porque alguns deles, como a China, t�m um futuro energ�tico bem mais sombrio.
Se o Brasil tivesse decidido ficar totalmente fora do Iter, por�m, poderia vir a se arrepender no futuro, diz Gon�alves. Caso a fus�o nuclear se mostre vi�vel tecnologicamente e economicamente --algo ainda incerto--, o Brasil se arriscaria a ter de pegar o bonde andando depois, sem ter experi�ncia acumulada na �rea. A solu��o encontrada foi a de fornecer apenas cientistas ao projeto, sem abrir a carteira.
Fus�o em Cachoeira
"Apesar de n�o ter abrigado nenhum grande experimento, o Brasil tem atuado na pesquisa de fus�o com bastante reconhecimento internacional", diz Ricardo Galv�o, diretor do CBPF (Centro Brasileiro de Pesquisas F�sicas), no Rio.
Hoje, o pa�s possui dois tokamaks --prot�tipos de reatores experimentais de fus�o. Um deles fica no Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), em S�o Jos� dos Campos, e outro no no Instituto de F�sica da USP. Galv�o vem sempre a S�o Paulo para participar de trabalhos pr�ticos.
Com o tamanho de um pneu de trator, por�m, a c�mara do tokamak da USP parece uma maquete comparada � do Iter, que tem as dimens�es da c�pula de uma catedral. Mas o pequeno experimento tem seu valor. "Uma publica��o feita para reunir as bases f�sicas necess�rias ao projeto do Iter cita um trabalho que foi feito nesta m�quina aqui", diz Galv�o, abrindo a porta do galp�o que abriga o prot�tipo da USP.
A entrevista que o f�sico concedeu � Folha sobre a energia que iluminar� o futuro ironicamente come�ou durante um blecaute que havia atingido o campus da USP, na �ltima quinta-feira. Um sistema de seguran�a havia desconectado o fornecimento de luz do laborat�rio, e Galv�o desceu ao por�o para relig�-lo manualmente ap�s o fim do apag�o.
Os tokamaks do Inpe e da USP possivelmente ser�o levados ao novo laborat�rio de Cachoeira Paulista, que pretende concentrar os esfor�os do pa�s para pesquisa em fus�o. O objetivo � que o conhecimento produzido l� seja aplicado no Iter e em futuros reatores.
Aposta no escuro
Se o fornecimento de luz em S�o Paulo n�o � perfeito hoje, tamb�m n�o faltam preocupa��es para os pesquisadores que veem na fus�o o futuro da gera��o de energia. O pr�prio Iter, que ainda � um experimento, j� enfrenta dificuldades.
"Os materiais dentro do Iter ter�o de suportar um enorme bombardeamento de n�utrons e tamb�m enorme calor", explica Neil Calder, porta-voz do projeto em Cadarache. "A temperatura n�o ser� problema. J� para os n�utrons, n�s temos materiais que podem resistir a eles, mas a quest�o � saber por quanto tempo."
Entre as pe�as do reator que mais preocupam os cientistas est�o os ladrilhos especiais que revestem a c�mara onde ocorre a fus�o e um dispositivo chamado diversor, que coleta a maior parte do calor gerado no reator. "O problema crucial est� mesmo nos materiais", pondera Galv�o. "Na minha opini�o, n�o se pode afirmar que vamos ter um reator a fus�o antes de o teste de materiais no Iter ser satisfat�rio."
Para o f�sico do CBPF, se a quest�o de material for resolvida, "n�o h� duvidas" de que vai ser poss�vel produzir energia por fus�o numa usina. "O problema ent�o passa a ser a quest�o econ�mica. N�o temos como saber ainda quanto vai ser necess�rio de investimento tecnol�gico at� l�, nem quanto vai custar o quilowatt-hora."
E o Iter, claro, n�o est� imune � crise econ�mica mundial. A estimativa atual de or�amento do projeto --10 bilh�es-- foi feita em 2001, e as in�meras turbul�ncias financeiras desde ent�o for�aram os cientistas a fazer uma revis�o. O novo n�mero ser� divulgado em junho. Mesmo que tudo d� certo, a fus�o ainda vai demorar a entrar na matriz el�trica. "De modo otimista, pode-se ver o in�cio de usinas de fus�o comerciais em 2040 ou 2045", diz Calder.
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