Andando pelas ruas da ilha de São Luís do Maranhão, é bem provável que passe alguém cantando a toada: "Maranhão, meu tesouro, meu torrão; Fiz esta toada pra ti, Maranhão." Com esse versos, Humberto de Maracanã eternizou a cultura do bumba meu boi, ressoando a alma do Maranhão em sua toada mais emblemática.
Quando chega o mês de maio, matracas e pandeirões começam a ecoar na zona rural da Ilha de São Luís, anunciando a chegada do período junino. São os ensaios dos inúmeros grupos de bumba meu boi que movimentam a capital maranhense, preparando-se para a grande festa que atravessa o mês de junho. Nesse momento, os brincantes se reencontram, e a comunidade se une em torno da tradição.
Os festejos de São João são um momento de alegria e devoção para os brincantes dos bois por toda ilha. A preparação é intensa, com a composição de novas toadas e o comando de muitas apresentações. Vale lembrar que em 2019 o bumba meu boi do Maranhão foi reconhecido como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade.
Humberto de Maracanã (1939-2015) foi um ícone do bumba meu boi, que iniciou sua trajetória no grupo em 1973 e tornou-se amo em 1981. Sob sua liderança, o Boi de Maracanã, que há mais de 100 anos desfila pelas ruas maranhenses, se consolidou como uma referência cultural, permitindo a participação de mulheres e crianças. Antes de morrer aos 75 anos, Humberto foi reconhecido como "mestre em cultura popular" pelo Ministério da Cultura e recebeu honrarias por sua contribuição.
Hoje, Maria José de Lima Soares, presidenta do barracão e viúva de Humberto, é quem inicia o cortejo como de costume no primeiro encontro do Boi de Maracanã, que ocorre no Domingo de Páscoa. Nessa ocasião, os organizadores se confraternizam e planejam as atividades juninas. São mais de 50 apresentações em arraiais e terreiros de São Luís, além de quatro ensaios oficiais ao ar livre na comunidade, que se estendem até o amanhecer. Esses encontros são essenciais para que cada cantador apresente as novas toadas compostas para a temporada.
Com mais de um século de existência, o Boi de Maracanã reúne cerca de 600 integrantes fantasiados, incluindo percussionistas e brincantes, muitos deles oriundos da comunidade do Maracanã, situada a aproximadamente 25 quilômetros do centro de São Luís. A área é famosa pela exuberância natural e pelas plantações de juçara, o açaí maranhense, e sedia anualmente a Festa da Juçara em outubro.
O Boi de Maracanã segue o sotaque de matraca ou também chamado sotaque da ilha, típico da zona rural de São Luís, onde se destaca pelo uso de matracas e pandeirões, que criam uma massa sonora pesada e envolvente. O tambor-onça e o maracá completam a sonoridade única desse sotaque. Os personagens tradicionais incluem índias, vaqueiros, rapazes, caboclos de pena e o miolo (boi), atraindo multidões durante as apresentações.
Os dias 13 (Santo Antônio), 24 (São João), 29 (São Pedro) e 30 de junho (São Marçal) marcam o calendário oficial dos festejos juninos em São Luís. No dia 23 de junho, ocorre o batizado dos bois, quando recebem a bênção de um padre, novas vestimentas para animar o público e novo bordado para o couro do boi. Diferentemente do restante do Brasil, o dia mais importante em São Luís é 29 de junho, Dia de São Pedro, quando a cidade celebra um feriado municipal.
Durante as festas, o Boi de Maracanã é um dos preferidos dos ludovicenses. O cortejo é admirado tanto pelos intelectuais quanto pelos mais populares, e a disputa sobre quem é o maior fica para os brincantes discutirem. Essa rivalidade saudável é marcada pelas toadas de pique, improvisadas para empolgar a multidão. Essa competição, sempre lúdica e sem violência, é parte essencial do espetáculo.
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