Mortes: Professor e militante, mudou o estudo da geografia no Brasil
Carlos Walter Porto-Gonçalves foi um dos responsáveis pela criação da primeira reserva extrativista do país, no Acre
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Na introdução de seu livro "Os (Des)caminhos do Meio Ambiente", publicado em 1989, o geógrafo Carlos Walter Porto-Gonçalves reflete sobre o costume dos ecologistas de envolver-se em praticamente qualquer tema, da extinção de espécies de baleias, passando pela corrida armamentista até as formas de exploração de seres humanos pelo poder político.
"Procurei refletir sobre o porquê de invadirmos tantos campos diferentes, empregando deliberadamente um estilo que transita entre rigor científico-filosófico e o manifesto político", escreve Porto-Gonçalves. Como se vê, ele próprio se identificava com esses movimentos.
O estilo que ele descreve serve como referência para sua própria postura ao longo da vida. Como professor e pensador, foi fundamental para a transformação do ensino da geografia nas universidades. Ao mesmo tempo, foi um militante engajado na preservação dos biomas brasileiros e dos povos originários.
Porto-Gonçalves nasceu em 1949 no Rio de Janeiro, filho de um operário e de uma costureira. Seu primeiro contato profissional com indígenas ocorreu logo após se formar em geografia, na década de 1970, em uma comunidade de goytacazes que viviam da pesca na região da Lagoa Feia, no norte do estado.
Convocado a fazer um parecer sobre a secagem da lagoa, essencial para a subsistência da comunidade, Porto-Gonçalves percebeu que os indígenas sabiam, da sua própria forma, tudo que ele havia levado quatro anos para aprender de forma técnica.
Ele defendia que a universidade deveria ensinar os alunos a enxergar os impactos humanos e sociais do trabalho do geógrafo —discussão fundamental entre a década de 1970 e 1980, que fez com que a ciência deixasse para trás o foco numérico e técnico que marcou a profissão durante a ditadura militar.
Seu livro publicado em 1989 foi dedicado a Chico Mendes. O professor teve papel decisivo na demarcação da primeira reserva extrativista do país —em Xapuri, no Acre—, mensurando a terra e elaborando um memorial descritivo do terreno e contribuindo para que esse se tornasse um conceito adotado pela legislação ambiental brasileira.
Anos depois, em 2004, ele ganharia o Prêmio Chico Mendes, concedido pelo Ministério do Meio Ambiente, na categoria de Ciência e Tecnologia. Entre outros prêmios de destaque que ele recebeu, está o Casa de Las Américas, pelo ensaio "A globalização da natureza e a natureza da globalização".
"Apesar do seu enorme reconhecimento como geógrafo, não era o grande propósito da vida dele ter uma carreira acadêmica propriamente", conta o amigo e parceiro intelectual Rogerio Haesbaert, com quem Porto-Gonçalves dividiu a autoria de um livro ("A Nova Des-ordem Mundial", editora Unesp) e as salas de seus laboratórios no curso de pós-graduação em geografia da UFF (Universidade Federal Fluminense).
Nos últimos anos, atuava como professor visitante na Universidade Federal de Santa Catarina enquanto se tratava de um câncer de abdômen. Carlos Walter Porto-Gonçalves morreu dia 6 de setembro, aos 74 anos, em Florianópolis (SC). Ele deixa a mulher e uma filha.
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