2h40 de exame: 'Fazer ressonância era desesperador, parecia um micro-ondas'

Convivendo há 17 anos com um carcinoma medular de tireoide, o gerente de controladoria Higor Mourão, 44, demorava cerca de 2h40 para fazer uma ressonância na coluna como parte do tratamento. Entre as queixas para fazer o exame, ele cita a longa duração, o desconforto e a alta temperatura.

"O que mais me incomoda é o calor, depois de 1 hora a máquina começa a esquentar, parece um micro-ondas, sinto falta de ar, é desesperador, dá vontade de sair", conta. Atualmente, Higor faz a ressonância em um laboratório que utiliza inteligência artificial através de um acelerador que reduz o tempo do procedimento em até 50%. A seguir, ele conta como foi a experiência e compartilha como descobriu a doença:

"Deixei minha esposa no ponto do fretado como de costume e fui trabalhar, mas no caminho passei mal, me senti fraco, com náuseas, enjoo e voltei para casa. Fui ao PS e fui diagnosticado com uma virose. Minha esposa, a Karla, comentou com o médico que meu pescoço, do lado esquerdo, estava inchado havia mais de um mês.

Na época, não achei que fosse nada sério, fazia academia, era forte, musculoso e tinha o trapézio alto. O médico solicitou um ultrassom, o resultado mostrou que tinha nódulos na tireoide e estava com uma cadeia enorme de linfonodos no pescoço.

Na semana seguinte passei com um cirurgião de cabeça e pescoço. Ele me examinou, solicitou uma bateria de exames e pediu para levar alguém da família na próxima consulta. Pelo tom, imaginei que poderia ser algo grave e fui pesquisar na internet. Achei três tipos de câncer na tireoide, mas me identifiquei com o carcinoma medular devido a um sintoma recorrente: estava com diarreia havia mais de um ano e ninguém descobria o motivo.

No dia do retorno levei minha esposa e meus pais. O médico confirmou que eu tinha câncer medular de tireoide. Ele explicou que a doença tem início na tireoide, mas depois vai se espalhando pelos ossos e sistema linfático.

O médico disse que naquele momento o meu caso era cirúrgico e que teria algumas sequelas. Ele tiraria a minha corda vocal, eu ficaria mudo, e tiraria os nervos do ombro esquerdo, perderia totalmente os movimentos desse lado. Na época, tinha 28 anos, estava casado havia 11 meses e ele me deu só seis meses de vida.

Busquei a opinião de um outro especialista, ele faria os mesmos procedimentos, porém disse que eu ficaria sem voz apenas por alguns dias e que perderia apenas 10% do movimento do braço esquerdo. Operei no dia 15 de novembro de 2007.

Durante a cirurgia os médicos retiraram a tireoide, a paratireoide, a veia jugular e 82 linfonodos —alguns com mais de 6 cm de diâmetro. O resultado da biópsia mostrou que já estava com câncer havia dois anos e com metástases que tinham se espalhado pelo sistema linfático, sem ter conhecimento.

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Seis meses após a cirurgia, tive metástase no fígado e tomei quimioterapia por um tempo. Fiquei quase dois anos estável fazendo acompanhamento, mas sem tomar nenhuma medicação —nesse período minha primeira filha, a Clara, nasceu.

Em 2011, a doença voltou de forma agressiva e atingiu os ossos do braço, crânio, costela, ilíaco, cabeça do fêmur, quatro vértebras quebraram por conta da metástase e passaram a pressionar o canal da medula. Corria risco de ficar paraplégico se sofresse uma queda brusca devido ao número de lesões.

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Imagem: Arquivo pessoal

Fiquei debilitado, sentia muitas dores, não tinha força nas pernas e fiquei sem andar. Alguns médicos queriam operar a coluna, mas uma das sequelas seria perder o movimento de rotação e não conseguir agachar. Não aceitei porque isso me limitaria nos cuidados e nas brincadeiras com a minha filha, ela estava com um aninho.

Fomos para o plano B, fui submetido à uma radioterapia mais potente, fiz fisioterapia e, de 2011 a 2018, tomei uma medicação em protocolo de estudo no hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP, no interior de São Paulo. A doença estabilizou e em 2014 tive o meu segundo filho, o Lucas.

Em setembro de 2018, parei de tomar o remédio devido a um comprometimento nos rins. Em três meses, a doença voltou mais agressiva do que nunca, tive novas metástases no pulmão, fígado, rins e, principalmente, na coluna. Não conseguia ficar 20 segundos em pé, parei de andar novamente, sentia dores insuportáveis na coluna e no abdome, vivia à base de morfina e de outros remédios para dor, fui internado sete vezes em quatro meses e emagreci 22 kg —pesava 76kg e fui para 54 kg.

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Em 2019, fui aprovado para participar de um outro protocolo de estudos, mas dessa vez no MD Anderson Cancer Center, em Houston, Texas (EUA), para onde viajo a cada três meses atualmente. A viagem é cansativa, vou em um dia e volto no outro, totalizando 20 horas de voo.

O tratamento inclui parte dos exames, acompanhamento com os especialistas e o acesso à uma quimioterapia oral chamada selpercatinibe, um inibidor de um receptor denominado RET, que ajuda a prevenir o crescimento de células cancerosas. Gastei cerca de R$ 500 mil em quatro anos de tratamento no MD Anderson. Atualmente, pago US$ 700 dólares (cerca de R$ 3.850) a cada trimestre.

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Imagem: Arquivo pessoal

'Fazer ressonância da coluna era desesperador: esquentava e parecia um micro-ondas'

De toda a rotina envolvendo o tratamento, o que mais me incomoda é realizar a cada três meses a ressonância total da coluna que inclui sacro, lombar, torácica e cervical. Faço com e sem contraste, por isso o exame dura em média 2h40 minutos.

Às vezes é necessário repetir alguma imagem e demora mais. Meu recorde dentro da máquina já foram 4 horas. Para quem faz o exame em menos partes do corpo, tende a ser mais rápido e tranquilo.

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Nos primeiros anos, fazia de boa, mas depois criei uma rejeição, ficava ansioso e de mau humor só de agendar e pensar no tempo que ficaria na máquina. Com o passar do tempo minha experiência só piorou. É horrível fazer o exame com dores na coluna, o lugar onde a gente deita é duro, eles amarram o corpo, colocam uma máscara no rosto, é desconfortável.

O que mais me incomoda é o calor, depois de 1 hora a máquina começa a esquentar, parece um micro-ondas, sinto falta de ar, é desesperador, dá vontade de sair.

Teve uma vez que pedi para parar porque não aguentei, meu avental ficou encharcado de tanto suor. Ao longo dos anos criei algumas estratégias, entro na máquina e permaneço lá de olhos fechados, não penso no exame, ocupo minha mente com outros pensamentos e peço para deixar o ar-condicionado na temperatura mínima.

Há alguns meses, mudei de laboratório e realizei a ressonância da coluna em 1h10 graças ao uso da inteligência artificial através de um acelerador que diminui o tempo do exame em até 50%. Minha experiência melhorou 100%, é mais tranquilo e confortável. A ressonância passou a ser um exame como qualquer outro, não fico mais ansioso e preocupado.

'Minha esposa e meus filhos são a maior motivação para me manter vivo'

Higor com a esposa e os filhos
Higor com a esposa e os filhos Imagem: Arquivo pessoal
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O carcinoma medular de tireoide não tem cura, mas desde 2021 estou em remissão e não tenho mais nenhuma metástase detectada em exames de imagem. Convivo há quase duas décadas com a doença, faço tudo o que está ao meu alcance para enfrentá-la, busco os melhores médicos e tratamentos. O que não está [ao meu alcance], deixo para Deus resolver.

Pra mim seria tranquilo morrer, ir para um lugar tranquilo, não sofrer e não sentir mais dores, mas luto por amor à minha família. Só quero continuar aqui enquanto tiver condições de cuidar da minha esposa e dos meus filhos, eles são a minha maior motivação para me manter vivo."

Por que há ressonâncias tão demoradas?

Para cada segmento do corpo a ser estudado com detalhe, a realização da ressonância demora, em média, de 20 a 30 minutos.

Isso varia de acordo com a condição/doença, local a ser estudado e se o procedimento será realizado com e/ou sem contraste. Ao estudar mais de um segmento, como abdome e pelve, ou coluna total (cervical, torácica e lombar), o exame pode durar cerca de 1h30. Há casos específicos, como do Higor, que podem demorar mais tempo.

Outros fatores podem influenciar na percepção de que o procedimento é demorado, como pré-exame, anamnese, retirada de adornos, posicionamento na mesa, etc.

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Vale ressaltar que para a aquisição adequada de imagens para fins diagnósticos, o paciente deve ficar imóvel durante o exame. No caso de movimentações, ainda que pequenas e involuntárias, é necessário repetir as imagens, o que prolonga sua duração.

Entre as principais queixas de pacientes que realizam a ressonância, é comum algum grau de fobia de lugares fechados, já que a máquina consiste de um longo tubo estreito. Para aliviar esse incômodo, alguns laboratórios dispõem de dispositivos que reproduzem vídeos para maior conforto dos indivíduos.

Em raras situações, é possível que ocorra aumento da temperatura da máquina com possível risco para queimaduras em pacientes com dispositivos implantados e pigmentos presentes em tatuagens. Qualquer desconforto deve ser reportado à equipe.

Atualmente, existe uma tecnologia que utiliza inteligência artificial por meio de um acelerador da ressonância magnética, que consegue filtrar os dados obtidos durante o exame, removendo ruídos e amplificando sinais relevantes. A ferramenta se assemelha a um trabalho de remasterização de uma fita de áudio ou vídeo antiga.

O acelerador pode diminuir o tempo da ressonância em até 50%, gerando menos desconforto e claustrofobia aos pacientes. Outra vantagem é o maior detalhamento e nitidez na qualidade das imagens, o que permite diagnósticos mais precisos.

Fonte: Fernando Yamauchi, radiologista do Alta Diagnósticos, da Dasa.

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