O Observatório Itaú Cultural está atualizando a metodologia do seu Painel de Dados e migrando a visualização de dados para a tecnologia Power BI. Essas alterações visam ampliar as possibilidades de análise e refletir de forma mais precisa sobre o cenário da economia criativa no Brasil, ao mesmo tempo que mantém a base conceitual de intensidade criativa, elemento nuclear das estatísticas do Painel desde o lançamento da metodologia original. Este boletim retrata as principais alterações e suas justificativas[1].

 

  • Alterações na lista de setores considerados criativos

De acordo com a metodologia de intensidade criativa, os setores criativos são aqueles em que há os maiores percentuais de trabalhadores exercendo ocupações criativas sobre o total de trabalhadores empregados[2].  Dessa forma, essa metodologia se mostra dinâmica, visto que alguns setores podem diminuir sua intensidade criativa ao longo dos anos (por conta de mudanças estruturais na sua estrutura produtiva), perdendo o caráter criativo, enquanto outros podem seguir o caminho contrário e tornarem-se setores criativos (BAKHSHI; FREEMAN; HIGGS, 2013).

Tendo em vista esse contexto, a nova metodologia do Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural buscou revisar sua lista de setores considerados criativos, de acordo com a análise da evolução das intensidades criativas de cada setor ao longo dos anos. Com essa revisão, foram identificados dois setores da economia que não mais possuem altas intensidades criativas, sendo eles: Reparação e manutenção de equipamentos de informática e comunicação (que fazia parte da categoria setorial de Tecnologia da Informação) e Preparação de fibras, fiação e tecelagem (que fazia parte da categoria setorial de Moda).

O Gráfico 1 apresenta a tendência de queda na intensidade criativa que levou a essa decisão. Ambos tiveram seus picos de intensidade criativa próximo ao ano de 2016 - 39% de trabalhadores criativos na atividade de Preparação de fibras, fiação e tecelagem e 34% na de Reparação e manutenção de equipamentos de informática e comunicação -, passando para uma tendência de queda, até valores próximos a 10% no 3º trimestre de 2022. O restante dos setores criativos da metodologia original segue apresentando intensidades criativas mais altas do que o restante da economia, mantendo, portanto, seu caráter criativo.

Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural (metodologia antiga).

Notas: Períodos sem dados se referem a amostras não significativas, que impediram a estimação estatística.

As ocupações criativas, por sua vez, seguem as mesmas da metodologia original, visto que a lista original ainda reflete as principais características de um trabalhador criativo, conforme determinado por Bakhshi, Freeman e Higgs (2013):

1. novos processos: capacidade de resolver problemas ou de atingir objetivos de maneira inovadora, com o emprego claro e frequente da criatividade;

2. resistência à mecanização: incapacidade de a tarefa ser realizada por máquinas;

3. não repetição e não uniformização de função: o impacto no processo produtivo é diferente a cada vez que atua, a depender do contexto específico da tarefa e das capacidades cognitivas por ela acionadas;

4. contribuição criativa à cadeia de valor: a atuação em qualquer setor trará inovação e/ou criações;

5. interpretação, não mera transformação: o trabalho não apenas copia ou adapta coisas já existentes para diferentes formatos ou diferentes cenários.

 

  • Alterações nas categorias ocupacionais e setoriais

A nova metodologia do Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural também alterou o mecanismo de agrupamento das ocupações e setores criativos em categorias. Buscou-se aumentar a quantidade de categorias, desagregando mais os dados setoriais e ocupacionais, para que fosse possível acompanhar alguns setores isoladamente. Para além da criação de novas categorias setoriais, também foram criados novos agrupamentos – que agregam as diferentes categorias e buscam facilitar a análise de tendências mais amplas. Os novos agrupamentos são: Cultura, Consumo e Tecnologia. As principais desagregações e a composição dos novos agrupamentos são ilustradas na figura abaixo:

Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural (2023).

Além disso, alguns códigos de ocupação e de atividade econômica migraram de categoria. O Quadro 1 reflete essas alterações para os Códigos de Ocupações Criativas (COD), referentes aos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Além dos desmembramentos em mais categorias, a ocupação de Fotógrafos migrou da categoria Cinema, Música, Fotografia, Rádio e TV para a categoria de Artes Visuais.

Buscou-se fazer os mesmos desmembramentos nas categorias setoriais regidas pela Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) 2.0 Domiciliar na PNAD Contínua, porém foi necessário realizar algumas adaptações. Os códigos de atividade econômica/setor (CNAE 2.0 Domiciliar) são mais difíceis de serem desagregados na PNAD Contínua. O código 59000 (Atividades cinematográficas, produção de vídeos e de programas de televisão, gravação de som e de música), por exemplo, compreende as atividades de audiovisual e de música conjuntamente, impossibilitando, de forma direta, sua desagregação. Como solução para esta questão, o Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural adotou um método de inferência por meio de ponderação, separando o valor total entre música e audiovisual, conforme a composição das ocupações destas categorias. Por exemplo: caso houver 10 mil trabalhadores nas ocupações da música (2354 - Outros professores de música e 2652 - Músicos, cantores e compositores) e 30 mil nas ocupações do audiovisual (1431 - Gerentes de centros esportivos, de diversão e culturais, 2654 - Diretores de cinema, de teatro e afins, 3521 - Técnicos de radiodifusão e gravação audiovisual e 2656 - Locutores de rádio, televisão e outros meios de comunicação), infere-se que 25% dos trabalhadores do setor 59000 são da música e 75% do audiovisual. Esse mesmo exemplo segue para os demais códigos CNAE Domiciliar 2.0 que não podem ser desagregados diretamente: 62000 (Atividades dos serviços de tecnologia da informação) e 90000 (Atividades artísticas, criativas e de espetáculos), conforme indica o Quadro 3.

Além dos desmembramentos, houve a migração de um código de atividade econômica para outra categoria: o código 63000 (Atividades de prestação de serviços de informação) passou da categoria Tecnologia da Informação para Publicidade e Serviços Empresariais, visto que compreende agências de notícias, clipagem de notícias, dentre outros serviços ligados à comunicação, que se adequam mais assertivamente no conceito de sua nova categoria (Quadro 2).

No caso dos dados de quantidade de empresas formais, extraídos da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), o sistema de classificação de atividade econômica utilizado é mais completo. Por utilizar o sistema de classificação da CNAE 2.0 em nível de subclasse – mais detalhado –, foi possível realizar a desagregação sem inferência por ponderação, ficando a divisão como mostra o Quadro 3. Por possuir maior detalhamento, também foi possível migrar alguns códigos para outras categorias mais adequadas ao seu conceito. Assim como no caso da CNAE 2.0 Domiciliar, as subclasses CNAE 2.0 iniciadas em 63, que compreendem as agências de notícias, clipagem de notícias, dentre outros serviços ligados à comunicação, foram migradas da Tecnologia da Informação para Publicidade e Serviços Empresariais. Os códigos 7420001 (Atividades de produção de fotografias, exceto aérea e submarina), 7420002 (Atividades de produção de fotografias aéreas e submarinas) e 7420003 (Laboratórios fotográficos), ligados à fotografia, migraram da categoria Cinema, Música, Fotografia, Rádio e TV para Artes Visuais, seguindo o padrão do código ocupacional COD de Fotógrafos, que também sofreu a mesma migração.

  • Inclusão de mais códigos de produto nos indicadores de comércio internacional

Os indicadores de importação e exportação de produtos criativos tiveram a inclusão de mais bens que são considerados produto da economia criativa. A lista de produtos adicionados é baseada em trabalhos da Agência Brasileira de Promoção de Exportações (Apex)[3], que os considera como parte da economia criativa. São produtos referentes às seguintes categorias: Editorial, Música, Arquitetura, Design e Publicidade e Serviços Empresariais. Além disso, por conta da nova segmentação de categorias, os produtos antes inclusos na categoria Artes Cênicas e Artes Visuais agora fazem todos parte da categoria Artes Visuais, conforme apresenta o Quadro 4.

            Para além das alterações de códigos, foi inserida também a variável de análise de exportações líquidas. Essa variável é calculada a partir da subtração do valor das exportações do montante de importações, para cada nível de desagregação específica.

 

  • Mais variáveis e desagregações, novo eixo de análise e nova plataforma de visualização de dados

          1. Novas variáveis e desagregações

Os dados referentes ao mercado de trabalho da economia criativa, extraídos da PNAD Contínua do IBGE, agora contam com uma gama maior de desagregações e de variáveis. Na metodologia original, o Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural apresentava dados completos para três segmentos de trabalhadores da economia criativa: Trabalhadores Criativos (todos os trabalhadores da economia com ocupações criativas), Empregados dos Setores Criativos (todos os trabalhadores empregados pelos setores criativos, sejam eles criativos ou não) e Trabalhadores Incorporados (todos os trabalhadores criativos trabalhando em setores não criativos). Pelo conceito, observa-se que algumas partes dos trabalhadores incluídos em um segmento também fazem parte de outro, conforme mostra a Figura 1.

Fonte: Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural (2023).

A nova metodologia do Painel ainda compreende esses segmentos, mas também apresenta dados completos para os subsegmentos que compõem estes conceitos. Assim, para que se pudesse fazer análises mais detalhadas sobre os segmentos componentes da economia criativa, as informações completas foram extraídas para as seguintes categorias de trabalhadores: o total de Trabalhadores Criativos, que equivalem à soma dos especializados e dos incorporados; os Empregados dos Setores Criativos, que equivalem à soma dos especializados e dos de apoio que atuam nos setores criativos; os Trabalhadores de Apoio, que são os trabalhadores não criativos empregados nos setores criativos; os Trabalhadores Especializados, que são os trabalhadores criativos empregados nos setores criativos; e, por fim, os Trabalhadores Incorporados, os trabalhadores criativos que estão em outros setores da economia.

Além das desagregações já existentes na metodologia original (região/UF; sexo; faixa etária; escolaridade; contribuição para previdência; formalidade e remuneração média), agora também foram adicionadas as seguintes desagregações:

a. Raça/Cor dos trabalhadores (Branca, Preta, Amarela, Parda, Indígena, Ignorado): evolução para o total Brasil e região. Para o nível Brasil, esta desagregação apresenta cruzamento com as desagregações faixa etária, contribuição previdenciária, escolaridade e sexo.

b. Emprego extra: número de trabalhadores que possuem um emprego extra para além do principal. Os valores estão disponíveis para o total do Brasil, por região e por ano. Para o nível Brasil, esta desagregação apresenta cruzamento com as desagregações escolaridade, faixa etária, contribuição previdenciária e sexo.

c. Home office: total de trabalhadores que indica que trabalha principalmente de casa para o total Brasil e por região. Para o nível Brasil, esta desagregação apresenta cruzamento com as desagregações faixa etária, contribuição previdenciária e sexo.

d. Tempo de emprego (menos de 1 mês; de 1 mês a 1 ano; de 1 a 2 anos; 2 anos ou mais): faixa de tempo de emprego que o trabalhador indica estar no emprego atual para o total Brasil e região. Para o nível Brasil, esta desagregação apresenta cruzamento com as desagregações, escolaridade, faixa etária, contribuição previdenciária e sexo.

e. Trabalharia mais: quantidade de trabalhadores que indica que trabalharia mais horas do que as efetivamente trabalhadas em todos os empregos para o total Brasil e região. Para o nível Brasil, esta desagregação apresenta cruzamento com as desagregações, escolaridade, faixa etária, contribuição previdenciária e sexo.

f. Urbano/Rural[4]: quantidade de trabalhadores da economia criativa que indicam residência em áreas rurais e áreas urbanas para o total Brasil, ou seja, sem desagregação por UF ou região.

Todas as informações da PNAD Contínua foram também extraídas para o total de trabalhadores da economia brasileira, de forma a usar como referencial comparativo em relação aos trabalhadores da economia criativa e seus segmentos/subsegmentos. As alterações na metodologia, aqui listadas, foram realizadas com o intuito de aprofundar o entendimento sobre a condição econômica e socioeconômica dos trabalhadores, das empresas e do comércio internacional dos diversos segmentos componentes da economia criativa. Com essas alterações, que apresentam uma gama maior de detalhamentos e recortes, as análises realizadas pelos agentes do mercado e por pesquisadores da área podem trazer à tona mais discussões relevantes que contribuem para o fortalecimento desse setor na economia e na sociedade.

Por fim, a partir dos dados disponíveis no Portal do Empreendedor foi possível adicionar dados agregados sobre o total de Microempreendedores Individuais (MEIs) no Brasil por região, UF e pela desagregação de sexo. A seleção de CNAEs foi a mesma utilizada para o total de empresas criativas. 

            2. Novo eixo de análise

Como última inclusão no Painel de Dados, temos a criação de um novo eixo de análise chamado Indicadores Socioeconômicos. Este eixo apresenta novos indicadores sobre o agregado da economia da cultura e das indústrias criativas no Brasil. Ele busca trazer elementos de análise mais complexos e que permitam dimensionar óticas socioeconômicas específicas. Inicialmente, o principal indicador apresentado será o Produto Interno Bruto (PIB) da Economia da Cultura e das Indústrias Criativas (Ecic).

O PIB da Ecic é calculado por meio da ótica da renda, trazendo informações sobre a massa salarial, a massa de lucros e outros rendimentos, como impostos e royalties/direitos autorais. Ele usa como base as ocupações criativas, apresentadas nas variáveis sobre trabalhadores do setor, e as atividades econômicas criativas, apresentadas nas variáveis sobre empresas criativas. O cálculo do PIB da Ecic foi um processo de um ano de duração e contou com o suporte de especialistas nacionais e internacionais, focando em incorporar questões pertinentes ao setor, como a informalidade, diversidade de atividades, pluralidade territorial e digitalização. Para saber mais sobre a construção do PIB da Ecic, basta acessar a Revista Observatório Itaú Cultural aqui.

           3. Nova plataforma de visualização dos dados: Power BI

Por fim, buscando aprimorar a experiência do usuário e facilitar a compreensão dos dados, o Painel de Dados migrou para a tecnologia de Power BI, uma plataforma mais dinâmica que facilita a navegação, compreensão e análise de dados. Isso significou uma adaptação não só de tecnologia, mas também uma reestruturação no storytelling dos dados, trazendo mais informações, de maneira mais concisa e direta. O novo Painel de Dados integra, assim, aprimoramentos e novidades focadas na sua usabilidade e fácil navegação, trazendo dados relevantes ao setor criativo e cultural.

 


[1] O boletim traça um panorama das mudanças, para conferir a metodologia completa do novo Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural, clique aqui.

[2] O percentual mínimo médio, de acordo com a abordagem original do Departamento para o Digital, Cultura, Mídia e Esportes (DCMS) do Reino Unido, é de 30% de trabalhadores criativos na atividade.

[3] Ver https://paineisdeinteligencia.apexbrasil.com.br.

[4] O IBGE (2022) considera como situação urbana, as áreas correspondentes às cidades (sedes municipais), às vilas (sedes distritais) ou às áreas urbanas isoladas. A situação rural abrange toda a área situada fora desses limites. Este critério é também utilizado na classificação das populações urbana e rural. Para maiores informações acesse: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101992_notas_tecnicas.pdf.