A hora de doar é sempre, e precisamos falar sobre isso

Artigo originalmente publicado no jornal Correio Braziliense

As tragédias nos lembram da urgência da doação, mas é importante frisar a necessidade da continuidade. Afinal, se os problemas são recorrentes e de longo prazo, a ajuda também precisa ser

Por Luisa Gerbase de Lima, gerente de comunicação e conhecimento do IDIS

O Brasil e o mundo assistiram, com tristeza e revolta, à tragédia que acometeu o Rio Grande do Sul e soma números assustadores de vítimas, além dos estragos em habitações, infraestrutura e consequências para a economia local. As cenas ainda geram comoção e sensibilizam pessoas. A solidariedade se manifesta de maneira acalentadora. Essa que é — ou deveria ser — tendência.

Dia a dia, acompanhamos a mobilização de organizações da sociedade civil, empresas, celebridades e de muitos, muitos indivíduos. Doam dinheiro, bens, tempo, na forma de voluntariado, e contribuem para que tudo chegue a quem mais precisa. Alguns podem ter se admirado com a potência desse apoio, mas o que presenciamos foi a reafirmação de que, no Brasil, existe uma cultura de doação pujante e que precisa ser incentivada para além dos momentos de crise.

O processo de tomada de consciência sobre o papel e o poder do cidadão foi destacado na Pesquisa Doação Brasil, que mostrou que 84% dos brasileiros acima de 18 anos e com rendimento familiar superior a um salário mínimo fizeram ao menos um tipo de doação, seja de dinheiro, bens ou tempo, em 2022, sendo esse o maior percentual registrado na série. Mantém-se relevante também a consciência do protagonismo cidadão, refletido nos 86% de doadores que o fazem porque acreditam que cada um de nós precisa participar da solução de problemas sociais, para além dos governos, empresas e organizações sociais. Tendência que é ainda mais relevante no recorte da geração Z, que diz acreditar ainda mais no poder transformador das ONGs, além de priorizar compras a partir de causas e crenças do que é melhor para o mundo.

O despertar da consciência participativa diante dos desafios sociais e ambientais é um fenômeno cada vez mais evidente e relevante em nossa sociedade. Independentemente dos desafios do aprofundamento da cidadania e da participação política, é inegável o crescente protagonismo da sociedade civil, seja em sua expressão organizada, seja no comportamento individual, assumindo um papel proativo para incidir sobre a desigualdade, em suas diferentes formas.

Ao mesmo tempo em que cresce a participação, cai a crença de que não devemos falar sobre doações. O ditado “o que a mão esquerda faz a direita não deve saber” começa a perder adeptos, e essa é uma ótima notícia. Quando falamos sobre doações é quando instigamos os outros também a agir. Ainda segundo a Pesquisa Doação Brasil, celebridades ou perfis nas redes sociais influenciaram a decisão de 17% da população que realizou alguma doação. Olhando o recorte da geração Z, a influência é ainda maior: chegando a 25%. Ou seja, quanto mais falam sobre doações, mais crescem as doações em geral!

Mas há sempre o clássico argumento que justifica a não doação: a desconfiança. Como vamos saber se o dinheiro chegará mesmo ao seu destino e se será aplicado na causa ou na ação desejada? Para superar essa barreira, as organizações sociais têm investido em instrumentos e mecanismos de transparência, além de práticas de comunicação que dão mais visibilidade ao fluxo dos recursos e aos impactos alcançados.

A imprensa também tem tido um papel importante, cobrindo com mais amplitude o tema, contribuindo para dar luz às iniciativas e esclarecendo notícias falsas quando são veiculadas. Destaca-se também a iniciativa Sociedade Viva, que usa a força da comunicação para mostrar à população a importância e o impacto do trabalho das ONGs para as pessoas e para a democracia.

As tragédias nos lembram da urgência da doação, mas é importante frisar a necessidade da continuidade. Afinal, se os problemas são recorrentes e de longo prazo, a ajuda também precisa ser. Enquanto a calamidade estampa o noticiário e domina a atenção dos espectadores, o pós-catástrofe acontece fora dos holofotes. Após o socorro emergencial, a destinação de artigos de urgência, será necessário reconstruir a vida.

Por isso, doar precisa ser hábito. Doar é investir em um legado para o país e no fortalecimento do papel da sociedade civil organizada como agente essencial no combate às desigualdades. É preciso doar, e precisamos falar sobre isso.

Ações de advocacy de fundos patrimoniais no Senado são destaque no Correio Braziliense

Representantes do IDIS buscam apoio de senadores para retomar a votação do Projeto de Lei (PL) nº 2440, de 2023, que prevê incentivo fiscal às doações realizadas por fundo patrimonial.

Em entrevista ao Correio Brasiliense, Paula Fabiani, CEO do IDIS e liderança do advocacy dos fundos filantrópicos, explicou a relevância do assunto e como está a articulação no Legislativo.

“Estamos buscando incluir esses incentivos, até porque existe uma relação muito positiva entre a criação dos incentivos e a propensão a doar”, contou. 

Confira a matéria na integra.

ONG articula junto a senadores a continuidade da votação do PL 2440/2023, que está parado no Senado desde agosto do ano passado - (crédito: Roque de Sá/Agência Senado)