"Não me pôs de lado. Eu tenho de agradecer ao meu filho mais velho o quanto ele foi compreensivo comigo e é por ele que eu estou aqui. Porque, senão, eu não estava. Porque morri no dia em que o Paulo morreu", disse a socialite na entrevista que deu a Cristina Ferreira pouco antes de deixar a cadeia.
"Quando eu visito a minha mãe, as outras reclusas têm famílias inteiras de cinco e seis pessoas. Durante estes anos todos, à exceção da irmã e de um melhor amigo, tenho sido só eu a visitar", afirmou David Motta.
Enquanto David Motta se manteve ao lado da mãe, Maria das Dores acabaria por ver o filho mais novo cortar de forma definitiva. Duarte tinha apenas oito anos quando o crime em que a mãe encomendou a morte do pai aconteceu e, desde o primeiro dia, recusou-se a manter qualquer relação com a progenitora. Não quis ir ao primeiro encontro promovido pelas psicólogas e desde então ficou entregue à guarda dos avós paternos.
Descrito como uma criança "superiormente inteligente", Duarte ficou em estado de choque e, apesar das várias tentativas, nunca se mostrou disposto a um reencontro com a mãe que, quando lançou o livro em que conta a história da sua vida, se mostrou devastada por não ter o filho ao lado, pedindo-lhe perdão.
"Duarte, perdoa-me. A minha sentença não é a prisão, é saber que, por aquilo que te fiz, não mereço voltar a ver-te. Mas, se algo desejaria, antes de morrer, era que um dia pudéssemos voltar a estar os três, juntos outra vez."
COMO TUDO ACONTECEU
Em 2007, Maria das Dores e o marido, Paulo Cruz, moviam-se entre um círculo de elite, mas não passavam pela melhor fase do casamento. Ela tinha perdido um dos braços num acidente de viação em que o marido ia ao volante, engordara bastante e as discussões entre o casal eram uma constante.
Aquilo que ninguém esperava é que esta fase terminasse com um crime bárbaro, que acabaria por mudar toda a sua vida. No dia do homicídio, Maria das Dores persuadiu o marido a ir até à casa nova, arrendada nas Avenidas Novas, no centro de Lisboa, enquanto dava ordens exatas ao motorista sobre o que teriam de lhe fazer.
Depois da condenação da mãe, David saiu do país e foi estudar Belas Artes na L'École des Métiers de la Communication, em Nova Iorque. Começou a carreira na "Vogue" americana, em 2008, no entanto, regressou no ano passado, onde marcou presença na ModaLisboa. O produtor assistiu ao desfile de Filipe Faisca com alguns amigos, nomeadamente José Castelo Branco, que o ajudou a tornar-se conhecido. Na altura afirmou que o regresso era "para já definitivo", garantindo contudo que o seu trabalho na moda o obrigava a "viajar muito".
"Disse só [ao motorista] que queria que lhe batessem. E ele perguntou: ‘mas bater como?’ e eu disse: ‘quero que o Paulo morra. Quero que o meu marido morra’. Disse isso", confessou a Cristina Ferreira,acrescentando que o crime aconteceu numa sequência de maus tratos psicológicos.
Foi depois de muita muita coisa. Muitos episódios de maus-tratos verbais. De me chamar ‘Maria gorda’, de dizer: ‘Olha aquela tão gira’. Depois de tantas coisas feias. E de eu cada vez me sentir mais pequenina. Quando toda a vida me senti uma mulher segura, uma mulher bonita. Sentia-me uma mulher segura, mesmo com apenas um metro e cinquenta e três centímetros. Era tratada como ‘não tens braço. Pesas 100 quilos’".
Agora, e depois de ter cumprido parte da sua pena, Maria das Dores mostra-se arrependida de ter mandado tirar a vida ao marido. "Ninguém tem o direito de tirar a vida a ninguém. É o que sei. E eu fi-lo. Portanto, tudo de mal que me aconteça é pouco. Tenho de pedir perdão às pessoas que vitimizei. Agora, não sou uma psicopata nem ando para aí a pensar em matar pessoas. Acho que a paixão que tinha por ele tocou o ódio, naquele dia. Tínhamos estado em Nova Iorque e as coisas tinham corrido tão mal. Ele tratou-me tão mal em dezembro, isto foi em Janeiro."
O PILAR DE MARIA DAS DORES
Ao longo de todo este tempo, David Motta foi sempre um pilar para Maria das Dores. Apesar de ter prosseguido os estudos nos Estados Unidos, onde se tornou um bem sucedido criativo na área da moda, trabalhando em várias publicações de renome, manteve sempre uma vigilância apertada com o que acontecia em Portugal, as visitas regulares à mãe, apoiando-a em tudo.
Quando Maria das Dores contou a sua história em livro, David estava na primeira fila sem esconder que, apesar de tudo, nunca poderia deixar de retribuir o amor que a mãe lhe deu.
"No dia do lançamento deste livro perguntaram-me como é que é ser filho da minha mãe. Sei lá eu, nunca tive outra. Foi esta que me trouxe ao mundo, foi esta que me amamentou, foi esta que me acompanhou quando estive muito doente ou quando chorava porque faziam troça de mim no colégio e foi também esta que me ensinou e proporcionou um número infinito de coisas e experiências que fazem de mim a pessoa que sou hoje. Por tudo isto estou-lhe imensamente grato, o que não implica que tivesse que a amar incondicionalmente, aliás sabia lá eu o que isso era até há 12 anos atrás", afirmou, quem já sentiu na pele, por várias vezes, o que é ser vítima de preconceito.
É talvez, além da grande amizade, todo este historial e compreensão do que é o 'outro lado da fama' que o fazem estar agora incondicionalmente ao lado de José Castelo Branco, quando este enfrenta, provavelmente, o momento mais desafiador da sua vida.