Com o antigo dono do BES a viver num mundo embaciado pela doença de Alzheimer, é a mulher, Maria João, quem assiste ao desmoronar de tudo. Sem os filhos, cada um no seu país, longe dos netos, tornou-se enfermeira numa casa silenciosa e viu todos os ilustres que se diziam amigos virarem-lhe costas. Da vida entre Nova Iorque, Brasil e Comporta restam apenas as memórias, mas quem a conhece diz que Maria João é resiliente, um rochedo, que não quebra. "Ele é um homem com muita capacidade, muito inteligente, mas não resistia se não fosse a mulher", fez saber um padre, amigo da família há mais de 20 anos.
Já teve tudo e tudo perdeu. Hoje, é a enfermeira de um Ricardo Salgado doente, que tem saudades da casa cheia, dos tempos áureos em que tudo era necessariamente mais fácil.
Nos anos de ouro havia flutes de champanhe a circular de mão em mão no jardim e uma comitiva de empregados trajados que, ao estalar de um dedo, corriam a perguntar se o 'senhor' precisava de alguma coisa. O mítico palacete rosa, na primeira linha do mar, em Cascais, era mais do que a residência de família de Ricardo Salgado, era o símbolo do status, do poder e a linha que separa os que têm dinheiro dos efetivamente muito (podres de) ricos. Perder a mansão é a facada mais certeira no coração dos Espírito Santo.
Há cerca de 20 anos, a filha de Ricardo Salgado casou com uma das maiores fortunas da Europa e agora é Philippe Amon quem mantém o estilo de vida da família: além da mesada de 40 mil euros, recebe os sogros todos os anos no seu castelo na Suíça, que é grande o suficiente para nem sequer se cruzarem durante uma semana.
Com a queda do BES, a família Espírito Santo foi, aos poucos, sendo sacudida da Comporta, que agora se assume como o território por excelência de Paula Amorim. A empresária rejuvenesceu a localidade alentejana e acabou com as festas ultra-exclusivas de Ricardo Salgado, que eram quase um mito da Comporta. Agora, o luxo é compartilhado com o mundo nos empreendimentos de Paula Amorim, uma porta aberta para a elite espanhola.
Uma década depois do escândalo em torno do caso BES, os três filhos de Ricardo Salgado mantêm o elevado estilo de vida a que foram habituados. O mais novo e a mulher mostram-se em viagens de jato privado pelo mundo, a do meio é casada com um milionário e mora na Suíça e o mais velho, que herdou o nome do pai, é o mais discreto, mas não se livra de polémicas, mesmo depois de ter feito as malas para o Canadá.
Catarina, filha de Ricardo Salgado, é casada com Philippe Amon, multimilionário que tem uma empresa responsável pelas tintas especiais que imprimem as notas em todo o mundo. São eles que têm ajudado o ex-banqueiro a manter o nível de vida.
Casou cinco vezes e a lista de romances é longa, mas nenhuma mulher enfrentou Pinto da Costa como Carolina Salgado, que hoje é a grande 'pedra no sapato' do dirigente portista que, aos 86 anos, continua sem poder sequer ouvir falar do seu nome.
Era terra de ninguém quando em 1971 o cantautor Zeca Afonso lhe dedicou uma canção. Hoje é o paraíso onde todos querem ter uma casa singela de paredes caídas de branco e telhados de colmo, para "brincarem aos pobrezinhos". A especulação imobiliária é tanta em Grândola que a câmara viu-se obrigada a suspender parte do PDM para travar o crescimento dos empreendimentos turísticos. Ali, o povo já não é "quem mais ordena".