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    Irã: o que o resultado do segundo turno vai significar para o mundo?

    Candidato reformista e um conservador linha-dura se enfrentam para substituir Ebrahim Raisi

    Líder supremo do Irã vota no segundo turno das eleições presidenciais
    Líder supremo do Irã vota no segundo turno das eleições presidenciais Reuters

    Nadeen Ebrahimda CNN

    As eleições presidenciais do Irã passam pelo segundo turno nesta sexta-feira (5), com um candidato reformista e um conservador linha-dura se enfrentando para substituir Ebrahim Raisi e em meio a uma apatia sem precedentes dos eleitores.

    Após nenhum dos quatro candidatos inicialmente obterem mais de 50% dos votos no dia 28 de junho, o legislador reformista Masoud Pezeshkian e o ex-negociador nuclear ultraconservador Saeed Jalili ficaram como os dois candidatos com mais votos, com Pezeshkian na frente por 3,9 pontos percentuais.

    No entanto, o primeiro turno registrou o menor índice de comparecimento às urnas em uma eleição presidencial desde que a República Islâmica foi estabelecida em 1979, destacando o descontentamento da população que está perdendo a fé no poder religioso no país.

    Pezeshkian e Jalili ocupam posições opostas no espectro político iraniano. Cada candidato pode liderar o Irã de uma maneira totalmente diferente em um momento em que a República Islâmica está lidando com problemas domésticos e internacionais delicados – incluindo uma economia em frangalhos, um movimento juvenil inquieto e tensões crescentes com Israel e os Estados Unidos.

    Veja o que esperar deste segundo turno das eleições e como os resultados podem impactar o Irã e o mundo.

    O que aconteceu no primeiro turno?

    A eleição foi antecipada depois que o presidente Ebrahim Raisi morreu em um acidente de helicóptero no 19 de maio no noroeste do país, junto com o Ministro das Relações Exteriores Hossein Amir-Abdollahian e outras autoridades.

    Os três conservadores e um único candidato reformista disputaram a principal cadeira eleita do país, depois que dezenas de outros candidatos foram impedidos de concorrer pelo poderoso Conselho Guardião de 12 membros, que tem a tarefa de supervisionar as eleições e a legislação e que se dirige diretamente ao líder supremo, o aiatolá Ali Khamenei.

    Segundo a agência de notícias estatal IRNA, durante o primeiro turno, Pezeshkian liderou com 42,5% dos votos, seguido por Jalili com 38,6%. Dos 60 milhões de eleitores qualificados, apenas 24 milhões votaram, resultando em um comparecimento de 40%.

    O baixo comparecimento recorde – em um país onde as eleições presidenciais costumam ter mais de 60% de participação – aconteceu apesar de Khamenei ter pedido aos iranianos que demonstrassem “participação máxima” para fortalecer a República Islâmica contra seus adversários.

    Os iranianos que conversaram com a CNN em Teerã antes da primeira votação expressaram pouca confiança nos candidatos, especialmente porque os candidatos são avaliados pelo Conselho dos Guardiões.

    De acordo com Trita Parsi, analista do Irã em Washington e vice-presidente executiva do Quincy Institute, o comparecimento às urnas sugere que “essa raiva e desilusão com o regime como um todo não se limita aos reformistas”. “Mesmo entre os conservadores, parece haver muita raiva e desilusão com o sistema, porque a participação deles também foi muito baixa.”

    Apesar disso, os analistas dizem que mudanças importantes podem ocorrer entre os eleitores. Alguns conservadores – inclusive aqueles que, no primeiro turno, apoiaram o linha-dura Mohammad Bagher Ghalibaf parecem estar transferindo seu apoio para o reformista Pezeshkian, em vez de seu oponente conservador Jalili.

    O grupo conservador está se fragmentando?

    “É evidente que houve uma divisão entre os conservadores”, disse Parsi à CNN. Inclusive dentro do Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica (IRGC), no qual Jalili serviu anteriormente.
    Analistas sugerem que alguns conservadores acreditam que é necessário se afastar de certas políticas intransigentes do falecido presidente Raisi, às quais Jalili provavelmente dará prosseguimento.

    Um desses conservadores é Sardar Mohsen Rashid, fundador e membro sênior do IRGC. Rashid declarou seu apoio a Pezeshkian na segunda-feira (1°) e convocou as pessoas a defendê-lo contra “ataques covardes”, de acordo com o site de notícias conservador iraniano Khabar Online.

    Em uma ação que chocou os que observavam a situação, o homem que liderou a campanha eleitoral de Ghalibaf, Sami Nazari Tarkarani, também declarou seu apoio ao reformista Pezeshkian, informou o Khabar Online.

    A divisão entre os conservadores também mostra que os sentimentos de dentro dos grupos que não são homogêneos, disseram os analistas.

    “O tipo de sentimento anti-instituicional não se limita apenas aos reformistas, mas também está presente nas fileiras do IRGC”, disse Parsi, acrescentando que as atuais divisões são particularmente notáveis devido aos esforços do regime para concentrar o poder apenas nas mãos dos conservadores.

    Sanam Vakil, diretor do Programa para o Oriente Médio e Norte da África do think tank Chatham House em Londres disse que a política iraniana é faccional e dividida, acrescentando que “nem todos no IRGC apoiam ou favorecem a política conservadora ou linha dura”.

    O que significaria uma vitória para Pezeshkian?

    De acordo com especialistas, em um debate presidencial realizado na segunda-feira, ambos os candidatos pareciam ter a intenção de angariar votos dos 60% do eleitorado que não participaram.

    “Pezeshkian está adotando uma retórica mais radical para atrair os não eleitores”, escreveu Sina Toossi, analista do Irã e membro sênior do Center for International Policy em Washington, DC, no X. “Enquanto isso, Jalili está tentando suavizar sua imagem e concordou com Pezeshkian várias vezes.”

    Segundo Toossi, Pezeshkian, que vem de uma família azeri-curda, e tem tentado atrair as minorias, mulheres e os jovens do país.

    Durante o debate, o candidato também disse que o regime nomeia pessoas de seus “próprios círculos e exclui o resto da população”.

    Pezeshkian criticou notoriamente a forma como o regime lidou com os protestos em massa de 2022, dizendo isso em uma entrevista à IRINN TV do Irã: “A culpa é nossa. Queremos implementar a fé religiosa por meio do uso da força. Isso é cientificamente impossível”.

    Ao falar sobre a pobreza no Irã, Pezeshkian disse durante o debate que “o problema dos pobres somos nós”, acrescentando que, se os candidatos quiserem aumentar o comparecimento às urnas, “eles (os eleitores) devem acreditar que as autoridades se sentam à mesma mesa que eles”.

    Milhões de pessoas no Irã estão abaixo da linha da pobreza, muitas vezes lutando para sobreviver em uma economia que há anos tem sido prejudicada pelas sanções dos EUA. A taxa de inflação anual do Irã não caiu abaixo de 30% em mais de cinco anos e, em junho, ficou em 36,1%, pressionando as carteiras em todo o país.

    Essa inflação persistente veio após a retirada do governo Trump do acordo nuclear de 2015 e a subsequente reimposição de pesadas sanções à República Islâmica.

    Pezeshkian enfatizou a necessidade de reiniciar o diálogo com o Ocidente e encontrar uma maneira de acabar com as sanções.

    O relacionamento do Irã com o Ocidente só piorou nos últimos meses, com Teerã apoiando grupos militantes em todo o Oriente Médio que têm como alvo os interesses de Israel e dos EUA em meio à guerra em Gaza. A República Islâmica também intensificou seu programa nuclear retirando a cooperação com a Agência Internacional de Energia Atômica, órgão de vigilância nuclear da ONU.

    O que significaria uma vitória de Jalili?

    Durante os debates presidenciais, Jalili também procurou atrair as mulheres e os jovens, dizendo que as vozes dos estudantes e dos jovens iranianos “devem ser ouvidas”.
    No entanto, ele manteve sua posição de que o Irã não deve depender do Ocidente para garantir o progresso, uma linha de pensamento repetida pelo líder supremo nas últimas semanas.

    “Devemos fazer com que o inimigo se arrependa de impor sanções”, disse Jalili, acrescentando que as ameaças ocidentais devem ser transformadas em uma oportunidade, uma ideia que era ecoada pelo falecido presidente Raisi, que procurou solidificar amizades com os inimigos dos EUA em meio ao isolamento ocidental.

    As opiniões opostas dos candidatos surgem no momento em que a tensão entre Irã e Israel se acentua. Pela primeira vez, os dois países trocaram ataques diretos em abril, quando o conflito em Gaza se ampliou, e agora Israel está se preparando para uma possível nova ofensiva contra o Hezbollah, o principal representante regional do Irã, no Líbano.

    A missão do Irã na ONU disse no sábado (29) que se Israel “embarcar em uma agressão militar em grande escala” contra o Líbano, então “uma guerra destruidora se seguirá”.

    “Todas as opções, incluindo o envolvimento total de todas as Frentes de Resistência, estão sobre a mesa”, disse no X.

    O ministro das Relações Exteriores de Israel, Israel Katz, respondeu no sábado, dizendo que “um regime que ameaça a destruição merece ser destruído”.

    Quanta autonomia cada candidato realmente teria?

    As tensões regionais acirradas levantam questões sobre se um presidente reformista pode realmente fazer a diferença. Os especialistas dizem que a chance pode não ser tão grande quanto alguns no Ocidente esperam.

    O líder supremo é o árbitro final da maioria das decisões no Irã. Mas “isso não significa que o presidente e sua equipe de política externa sejam irrelevantes”, disse Ali Vaez, diretor de projetos do Irã no think tank International Crisis Group.

    O presidente e seu gabinete implementam a política externa e têm muita influência sobre o aparato diplomático do país, disse Vaez a Becky Anderson, da CNN, em uma entrevista na segunda-feira.

    Na ocasião, ele observou que a presidência de Pezeshkian seria muito diferente da de Jalili, pois o reformista está cercado pelo “creme de la creme dos diplomatas iranianos”.

    No entanto, o histórico do Irã mostra que o país tende a adotar uma trajetória mais conservadora a longo prazo, mesmo quando há um presidente reformista no cargo, disseram os especialistas, acrescentando que é improvável que a política regional de Teerã em relação a Israel e seus representantes mude.

    No que se refere às principais políticas do Irã, como o apoio ao Hezbollah e a animosidade em relação a Israel, é improvável que um presidente reformista faça diferença, disse Parsi, acrescentando que, embora possa haver um melhor envolvimento com o Ocidente, é possível que o Irã tenha um melhor relacionamento com o Oriente.

    Apesar disso, Jalili poderá trazer políticas mais duras para a mesa de negociações e, potencialmente, repetir a abordagem de seu antecessor.

    Dependendo do ambiente no Ocidente, Jalili pode adotar uma “abordagem muito mais confrontadora em relação ao programa nuclear do Irã”, disse Vakil, acrescentando que, apesar das limitações na liberdade de ação do presidente, cada um traz seu “toque pessoal” ao governo do Irã.

    Este conteúdo foi criado originalmente em inglês.

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