Política
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Por , Valor — São Paulo

O Supremo Tribunal Federal (STF) proclamou nesta quarta-feira (26) o resultado do julgamento que descriminalizou o porte de maconha para o uso pessoal no Brasil. O tema, porém, também está sendo discutido no âmbito do Congresso Nacional por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que, caso seja aprovada como está, reverteria a decisão da Corte e voltaria a criminalizar o porte.

No julgamento do STF, que começou em 2015 e foi encerrado nesta quarta, os ministros estabeleceram o parâmetro de 40 gramas ou seis plantas fêmeas como critério limite para identificar usuários e diferenciá-los de traficantes. Além disso, o porte de maconha não vai gerar antecedente criminal para o usuário ou punição de serviço comunitário.

Tanto a PEC como a decisão do STF tratam se o porte de maconha para consumo próprio é um crime à luz da Constituição Federal. Enquanto o STF decidiu que a criminalização do usuário é inconstitucional, a PEC, que ainda está tramitando, prevê a criminalização do usuário de drogas em geral.

A PEC 45/2023, conhecida como PEC das Drogas, criminaliza o porte e o consumo de drogas independentemente da quantidade.

Já a discussão do STF é do Recurso Extraordinário 635.659, que descriminaliza o porte de maconha para uso pessoal e define como 40 gramas a quantidade que diferencie o porte para uso pessoal do tráfico.

Entenda a decisão do STF

O julgamento da Corte tem efeitos de repercussão geral e altera o entendimento sobre o artigo 28 da Lei 11.343/06, conhecida como Lei Antidrogas.

Sessão de julgamento do STF sobre ação que discute descriminalização do porte da maconha para uso pessoal — Foto: Antonio Augusto/SCO/STF
Sessão de julgamento do STF sobre ação que discute descriminalização do porte da maconha para uso pessoal — Foto: Antonio Augusto/SCO/STF

Pelo entendimento anterior, quem estava sob posse de drogas para consumo próprio estaria sujeito a pena de medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo; prestação de serviços à comunidade e advertência sobre os efeitos das drogas.

O que acontece é que a Lei Antidrogas não delimita a quantidade para diferenciar usuário de traficante. A lacuna na legislação exigia uma fixação adequada pelo Poder Judiciário, “evitando injustiças e desigualdades na aplicação da norma”, explicou Gustavo Batista, professor de direito penal da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).

A pena para tráfico de drogas é de cinco a 20 anos de reclusão, além de multa.

Já a PEC das Drogas, de autoria do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), inclui no artigo 5º da Constituição Federal — que define os direitos e garantias fundamentais —, a criminalização do consumo, em qualquer quantidade, junto com a proibição do tráfico.

"Ela [a PEC] não admitiria a posição do consumo como questão administrativa. Seria criminal. E, por isso, não seria possível a exceção que o Supremo está fazendo para a maconha até certa quantidade", explica Maurício Dieter, professor de direito penal e criminologia da Faculdade de Direito da USP.

Pela Lei Antidrogas, já há a definição do porte e a posse de drogas como crime, o problema é que não há definição de parâmetros que diferenciem usuário de traficante, o que gera, na visão dos especialistas ouvidos pelo Valor, o embate entre o Judiciário e o Legislativo.

A PEC, ainda segundo os especialistas ouvidos pelo Valor, teria como objetivo cessar discussões no Judiciário, já que estabelece que qualquer que seja a quantidade encontrada, será considerada crime.

O que diz o autor da PEC das drogas

Pacheco afirmou, na última terça-feira (25), que se opõe à decisão do STF. "Eu discordo da decisão do STF. Considero que uma descriminalização só pode se dar através do projeto legislativo, não por uma decisão judicial", disse o parlamentar a jornalistas.

Rodrigo Pacheco — Foto: Brenno Carvalho/Agência O Globo
Rodrigo Pacheco — Foto: Brenno Carvalho/Agência O Globo

De acordo com Pacheco, o STF invade a competência do Legislativo e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) ao tomar a decisão destacando um determinado tipo de entorpecente como a maconha. O presidente do Senado disse que a discussão pode ser feita, “mas há caminhos próprios para isso".

Andamento da PEC das Drogas

A PEC já foi aprovada no Senado e está em trâmite na Câmara de Deputados, onde foi formalizada na última terça-feira (25) a criação de uma comissão especial para sua análise, segundo ato publicado no Diário Oficial da Casa pelo o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

O ato foi assinado na semana passada, em 17 de junho, mas só foi publicado no Diário após o STF formar maioria para descriminalizar o porte.

A comissão tem o prazo de 40 sessões do plenário para discutir a PEC. O colegiado que apreciará o texto legislativo que pode reverter a decisão da Corte terá 34 membros titulares e 34 suplentes.

Ainda não há data marcada para a PEC ir a plenário. Se o prazo for superado sem a apreciação do tema, o presidente da Casa pode avocar o texto para votação diretamente em plenário.

Para ser aprovada, a PEC precisa ser discutida e votada em dois turnos no Senado e na Câmara com, ao menos, três quintos dos votos favoráveis dos deputados (308) e dos senadores (49).

O que acontece com a decisão do STF caso a PEC seja aprovada?

Se a PEC for aprovada, será submetida ao exame de constitucionalidade. Mas o Supremo não faz isso de maneira automática: é preciso que a Corte seja provocada. "Caso alguma entidade, com legitimidade, proponha uma ação constitucional pedindo seja declarada inconstitucional a PEC, o Supremo tem competência para declarar se essa PEC é constitucional ou não”, diz Dieter.

Neste caso, há três possibilidades:

  1. Ser aprovada e o STF não ser provocado a considerar a PEC inconstitucional;
  2. O STF obter controle constitucional concentrado. Ou seja, ser provocado e a PEC ser considerada adequada ou não à Constituição;
  3. O trecho considerado inconstitucional da PEC das Drogas ser substituído por outra PEC;

Caso aprovada, isso faria com que o julgamento do Supremo perdesse o efeito e o STF teria que ser "provocado a se manifestar se a emenda à Constituição realizada contraria outras disposições constitucionais mais elevadas, como o direito à dignidade e à intimidade", explica Emilio Figueiredo, advogado de "direito canábico".

De acordo com os especialistas ouvidos pelo Valor, a PEC pode ser considerada inconstitucional porque viola o direito fundamental à autolesão — ou seja, a liberdade para condutas que não afetam a saúde de outras pessoas, mas apenas a própria — que em princípio não poderia ser objeto de norma criminalizadora.

“A exposição ao mal para si mesmo, como no caso de ingestão de substâncias psicoativas ou a prática de esportes de risco, não deve ser criminalizada, embora possa ser proibida ou condicionada a regras estritas para evitar danos a terceiros. A criminalização, contudo, afrontaria o exercício da própria liberdade na busca pela felicidade, um dos fundamentos do Estado de Direito”, afirma Dieter.

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