Sinal de Haddad gera alívio nos mercados

Dólar tem segunda sessão consecutiva de queda contra o real após indicação de corte de gastos


Mendez, da Bahia Asset, tem adotado posições mais táticas nos ativos locais — Foto: Leo Pinheiro/Valor

Bastou um sinal do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que reforçou o compromisso do governo com o arcabouço fiscal - e, portanto, com a tentativa de cumprir a meta de déficit primário zero neste ano - para os ativos domésticos experimentarem um novo dia de alívio na sessão de ontem. O dólar caiu com força e ficou abaixo do nível psicológico de R$ 5,50; os juros futuros anotaram retirada relevante de prêmios de risco; e o Ibovespa teve nova rodada de valorização.

A percepção de risco fiscal continuou a guiar os mercados financeiros. Se, ao longo das últimas semanas, a deterioração nas perspectivas para as contas públicas levou a um aumento relevante dos prêmios de risco nos mercados, o mínimo sinal de compromisso do governo com o arcabouço fiscal e o anúncio de cortes de R$ 26 bilhões no Orçamento de 2025 ajudaram a estancar a piora e provocaram uma recuperação dos mercados ontem.

Assim, com os ativos brasileiros já bastante descontados e uma posição técnica favorável após diversos pregões de desvalorização, a sessão de ontem foi marcada por uma recuperação. O dólar encerrou o dia cotado a R$ 5,4869, em queda de 1,46%; o Ibovespa subiu 0,40%, a 126.164 pontos; e, no mercado de juros, a taxa do DI para janeiro de 2027 recuou de 11,815% para 11,595%.

Além disso, deu apoio à melhora dos mercados a informação de que a Casa Civil já começaria ontem mesmo uma rodada de conversas para fazer um pente fino nos gastos públicos e que os ministros do Desenvolvimento Social, Wellington Dias, e da Previdência, Carlos Lupi, participariam do primeiro encontro, conforme apurou o Valor.

Assim, em apenas dois dias, o dólar acumulou queda de 3,15%, em um sinal de distensão no mercado após a piora relevante da percepção de risco que levou a moeda americana a R$ 5,70 na terça-feira.

Esse movimento de correção do real, na avaliação do gerente da mesa de derivativos da Commcor, Cleber Alessie Machado, ficou dentro do esperado, dado o grau acentuado de depreciação visto recentemente. “A maior parte do mercado entendeu [o nível de] R$ 5,70 como exagerado, e agora parece que devolveu esse excesso porque o governo sinalizou uma predisposição de cortar [os gastos]”, diz. “A sinalização de ontem [quarta-feira] ajudou o mercado a respirar um pouco. [O câmbio] Estava sem goleiro”, diz o executivo.

Machado, contudo, pondera que o pregão desta sexta-feira, com o retorno dos negócios em Nova York após feriado, deve definir melhor qual será o nível de dólar que o mercado irá buscar diante de um cenário doméstico menos estressado. Para ele, a dinâmica deve seguir refém dos desenvolvimentos externos, em especial da política do Federal Reserve (Fed, banco central americano) e, mais adiante, da eleição presidencial dos EUA.

Na avaliação de Thiago Mendez, sócio e gestor da Bahia Asset Management, sem definições mais claras na parte fiscal e na condução da política monetária nos EUA, os ativos domésticos tendem a apresentar um comportamento mais “errático” à frente. Em declarações dadas durante o “call” mensal da gestora ontem, Mendez observou que as incertezas domésticas seguem bastante elevadas, ao lembrar que ainda há pela frente a troca no comando do Banco Central e toda a questão fiscal.

“Para o cumprimento do arcabouço, algumas medidas terão de ser tomadas e isso vai ser importante para os ativos”, disse o gestor, apontando que tem atuado de maneira “oportunística” nos mercados domésticos - ou seja, com posições mais táticas envolvendo os ativos brasileiros. A gestora encerrou posições no real e na bolsa brasileira e, no momento, está com apostas que ganham com o aumento da inclinação na curva de juros reais, ou seja, uma visão de que a diferença entre as taxas das NTN-Bs longas e os juros de papéis mais curtos irá aumentar.

Estrategistas do J.P. Morgan liderados por Emy Shayo Cherman afirmam que a maré parece estar mudando para os ativos locais. Depois do forte movimento de aversão a risco das últimas semanas, motivado por ruídos internos, o comprometimento do governo em cortar gastos e a crescente expectativa por cortes de juros nos EUA podem apoiar a dinâmica de recuperação dos ativos locais, incluindo o Ibovespa, durante o verão no Hemisfério Norte.

“Não vemos a janela atual como uma situação de compra na baixa, e sim como um acompanhamento da recuperação dos ativos brasileiros, considerando que o mercado está muito leve, barato e ‘subcomprado’ no momento, com os locais detendo grandes posições de caixa e resgates consideráveis de estrangeiros em todos os meses deste ano”, dizem os estrategistas do J.P.

Apesar da alta recente da bolsa, os estrategistas entendem que ainda há muito prêmio de risco na curva de juros, e que um ajuste disso deve contribuir para novos ganhos. Além disso, os múltiplos seguem descontados e o patamar atual de preço/lucro precifica um recuo de 20% nos lucros das empresas, “o que também é excessivo”, na visão dos profissionais do banco. (Colaborou Maria Fernanda Salinet)

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