‘Ninguém precisa de 4 casas’, diz Kevin Costner, que hipotecou propriedade de US$ 40 milhões para filmar a saga ‘Horizon’

Com custo total de US$ 100 milhões, o faroeste em quatro partes “Horizon: An American Saga” retrata a “conquista do Oeste”

Por — para o Valor, de Cannes


‘O filme é uma jornada, e não um filme de enredo’, diz Costner, que escreve, dirige, produz e atua em ‘Horizon’ — Foto: Divulgação

Aos 69 anos, Kevin Costner define a trajetória de mais de quatro décadas nas telas em três fases. “No início, eu não ganhava dinheiro. Depois, passei a ganhar muito. E agora tenho que usar dinheiro próprio para continuar nesse negócio”, conta o ator, produtor e diretor, sem esconder a frustração com Hollywood. Mesmo sendo um dos rostos mais conhecidos do cinema, o californiano não conseguiu financiar integralmente o projeto de megafaroeste que acalenta há 35 anos, “Horizon: An American Saga”.

Como os grandes estúdios não quiseram abraçar o projeto, concebido para passar a limpo a colonização do Oeste americano, o astro precisou arriscar o seu patrimônio. Parte de uma propriedade, à beira-mar, de 40 mil m², em Santa Barbara, foi hipotecada para garantir cerca de US$ 40 milhões. O montante foi usado para rodar os dois primeiros de uma série de quatro longas-metragens que vai cobrir 15 anos de história dos EUA, incluindo os períodos pré e pós-Guerra Civil (1861-1865).

E, se quiser realizar os dois filmes que faltam, Costner precisará financiar ele mesmo ou garantir a entrada de investidores. O orçamento total do projeto (escrito, dirigido, produzido e protagonizado pelo próprio) é de cerca de US$ 100 milhões.

“Como tive sorte na vida, adquiri terrenos e casas que são importantes para mim. Mas não preciso de quatro casas. Ninguém precisa. Então vou arriscar esses bens para fazer os meus filmes”, diz o ator, em encontro com jornalistas durante o 77º Festival de Cannes, onde apresentou a primeira parte da saga, fora de competição.

A fortuna de Costner, que chegou a receber mais de US$ 1 milhão por episódio da série “Yellowstone” (2018-2024), sobretudo nas últimas temporadas, é estimada em US$ 400 milhões. Este foi o valor apresentado no ano passado, nos documentos usados no seu processo de divórcio de Christine Baumgartner, após união de 18 anos.

Na época, houve especulação de que a designer de bolsas estava insatisfeita com a dedicação excessiva de Costner ao trabalho, situação agravada pela sua obsessão em realizar “Horizon”. O ator até decidiu deixar a bem-sucedida série “Yellowstone”, pedindo que matassem o seu personagem, o fazendeiro John Dutton, em função de conflitos com o cronograma de filmagem de seu faroeste.

“Gostaria de não ter que apostar as minhas casas para deixá-las aos meus filhos. Mas, se o que estou fazendo der certo, talvez eles ainda tenham essas quatro casas. Se eu estiver errado, eles terão que viver a própria vida”, comenta Costner, com sete herdeiros. Com Baumgartner, foram três filhos: Cayden, de 17 anos; Hayes, 15; e Grace, 14. Do casamento com a primeira mulher, Cindy Silva, nasceram Annie, 40, Lily, 37, e Joe, 36 — além de Liam, 26, filho que o ator teve com a namorada Bridget Rooney.

Costner terá uma ideia do retorno financeiro da ambiciosa empreitada no próximo fim de semana, quando “Horizon: An American Saga - Chapter 1”, com três horas de duração, chegar aos cinemas dos EUA, no dia 28. O segundo filme também tem estreia marcada em solo americano, em 16 de agosto.

Ambos ainda não têm data de lançamento no Brasil, ainda que tenham assegurado distribuição pela New Line/Warner Bros. para os EUA, Canadá, Reino Unido e alguns outros países.

Escrita por Costner, em parceria com Jon Baird, a saga “Horizon” é inspirada na “conquista do Oeste”. Atraídos pela promessa de conseguir terra e direitos políticos, os brancos invadem as terras povoadas havia milhares de anos pelos indígenas, criando um cenário hostil e levando a um inevitável banho de sangue. Na primeira parte, ambientada em 1859, só depois de um confronto trágico entre colonos e nativos, é que Costner ingressa na trama, quase com uma hora de filme.

Hayes Ellison, o caubói de poucas palavras que ele interpreta, é um dos vários personagens que têm suas vidas apresentadas nesta primeira parte, sem que suas histórias sejam desenvolvidas satisfatoriamente. “O filme é uma jornada, e não um filme de enredo”, diz. Costner está mais interessado em montar um mosaico sobre a vida no período de expansão territorial nos EUA e não em contar uma história específica na “fronteira selvagem”.

“Há um padrão na minha vida, com ‘Dança com Lobos’ (1990); ‘Sorte no Amor’ (1988); ‘Campo dos Sonhos’ (1989) e ‘Pacto de Justiça’ (2003). Os filmes que quero fazer são os mais difíceis”, diz Costner, vencedor de dois prêmios Oscar. Ele levou a estatueta de melhor diretor e de melhor filme (como produtor) por “Dança com Lobos”, faroeste que retratou várias facetas da natureza humana, sem fazer distinção entre branco e indígena.

“Eu acreditava que os nativos americanos de ‘Dança com Lobos’ deveriam ser pessoas muito equilibradas. Eu não pensava que estaria inovando, por retratá-los como eu queria vê-los, de um jeito que deixava a história melhor para mim”, recorda o diretor, que repete a representação respeitosa do indígena aqui, sem vilanizá-lo, como os faroestes do passado faziam. Quando eles partem para a violência, deixam claro se tratar de um último recurso para defender a sua terra e o seu povo.

“Há uma tendência em ver os faroestes como algo simples. Mas eles são complicados. Morar hoje em Cannes, Paris ou Los Angeles é simples, não que você não tenha problemas. Já no Velho Oeste, as pessoas não falavam a mesma língua e estavam em conflito umas com as outras o tempo todo. Elas tinham armas, mas não havia lei”, comenta Costner, fascinado pelo “mito do horizonte” daquela época.

Isso explica por que ele batizou a sua saga, assim como um dos assentamentos de colonos brancos da trama, de “Horizon”. “Os EUA de 200 ou 300 anos atrás eram como o Jardim do Éden. As pessoas que queriam uma nova vida arriscavam tudo para chegar a esse lugar que nem tinha nome. Um lugar onde não havia um prédio sequer”, diz o cineasta, lembrando que só mais recentemente os EUA começaram a valorizar suas paisagens naturais, para que as futuras gerações possam apreciá-las.

“Tomara que o filme sirva de cartão-postal, quando o público vir os locais de filmagem”, conta Costner, que escolheu o sul do estado de Utah, tomado por formações rochosas e outras maravilhas naturais, como locação principal da saga.

“Esses lugares existem. Seus rios correm e suas montanhas nunca se moverão. Só não podemos construir ali”, afirma ele, lamentando que, ao voltar ao local um ano depois, para a filmagem do segundo título, alguns armazéns já estavam lá. “Mas eles não aparecem no filme. É isso que o cinema pode fazer: preservar um modo de vida. As imagens que registrei são eternas.”

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