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Por , Valor — São Paulo

O desabafo de um engenheiro de software sobre um processo seletivo que ele desistiu de participar viralizou no LinkedIn nesta semana. Ao longo da seleção, após entrevistas, os recrutadores da empresa pediram que ele fizesse um projeto por uma semana inteira, mas ele recusou alegando que “sete dias era um tempo que ele não poderia abrir mão”.

“Fiz uma entrevista e tudo ocorreu perfeitamente. Eu curti a empresa, a empresa curtiu minha experiência. No final me avisaram que a próxima etapa seria um teste técnico. A estimativa seria sete dias seguidos para entregar, informei que sete dias é um tempo que eu não poderia abrir mão'”, diz o engenheiro de software Dellean Santos Teixeira, em sua publicação no LinkedIn.

Diante do desafio, Santos chegou a propor uma alternativa: ao invés de dedicar uma semana a um teste específico, ele sugeriu uma conversa técnica ou a análise de seu portfólio. Mesmo assim, a empresa recusou. "Eles falaram que era arrogância da minha parte não querer fazer o teste e eu perguntei para o sócio se ele estaria disposto a me dar sete dias da vida dele, e ele respondeu imediatamente 'É claro que não'", diz.

Candidato disse que foi chamado de arrogante por recusar teste de 7 dias durante processo seletivo — Foto: Reprodução/LinkedIn
Candidato disse que foi chamado de arrogante por recusar teste de 7 dias durante processo seletivo — Foto: Reprodução/LinkedIn

Esse não foi o único relato de profissionais da mesma área feita no LinkedIn. Após a publicação viralizar, outros usuários que trabalham com engenharia de software relataram passar pelos mesmos problemas que Teixeira expôs.

“Eles querem que trabalhe de graça para usarem seu código em produção. Daí quando falo que não faço testes desse tipo ainda fazem parecer que estou errado. É simples, quer que eu faça um trabalho para sua empresa? Me pague”, escreveu um segundo usuário.

Em outro comentário, um dos usuários disse que participou de um processo seletivo semelhante, que exigia a entrega de um projeto menos complexo, porém apresentava uma densidade maior de trabalho. “Eu já caí em golpe de empresa que pediu quase isso. Foi quase 10 dias, depois que entreguei nem falaram mais [comigo]”, escreveu.

A exigência de um teste técnico e sem compensação fez com que Teixeira pensasse que a empresa poderia, de alguma forma, tentar obter dele um trabalho gratuito.

“Eu sinceramente não sei dizer a intenção da empresa, não sei se foi falta de bom senso ou se tinha algo mais obscuro por trás, mas sim acontece com frequência. Quando me avisaram que poderia ser um golpe, [foi quando] parei para dar espaço para essa possibilidade”, disse Teixeia ao Valor.

Até onde os processos seletivos podem ir?

Especialistas em recursos humanos ouvidos pelo Valor explicam que analisar a capacidade de um candidato para o cargo é normal, mas que nesses casos é preciso estar atento ao que a empresa pede.

Segundo os especialistas, as companhias podem ir até o ponto onde os testes sejam razoáveis, proporcionais à função e não demandem um tempo excessivo do candidato. As empresas podem exigir também que o candidato demonstre suas habilidades e conhecimentos por testes práticos, como desafios técnicos ou problemas de lógica que possam ser concluídos em algumas horas.

No entanto, pedir projetos extensos ou sistemas completos que levem dias para serem desenvolvidos, sem garantia de retorno ou compensação, ultrapassaria os limites éticos e legais.

Cecília Pinaffi, psicóloga e consultora em recursos humanos há 30 anos em empresas de tecnologia e comunicação, explica que testes práticos em processos seletivos auxiliam na decisão da contratação nessas áreas, mas que testes excessivos ou a utilização de trabalhos gerados sem o consentimento do candidato podem ser considerados “plágio e prejudicam a ética e transparência do processo.”

A Lei de Direitos Autorais (Lei nº 9.610/1998) protege as criações dos candidatos, e a apropriação indevida desses trabalhos pode infringir os direitos de propriedade intelectual, conforme o Código Civil Brasileiro, destaca Natália Soares, também especialista na área.

Ela explica que exigir o desenvolvimento de sistemas complexos que demandem dias de trabalho pode ser abusivo, “especialmente se não houver garantias de feedback ou compensação”.

“Testes extensos em processos seletivos de TI são muitas vezes vistos como excessivos e podem afastar talentos qualificados, agravando a escassez de profissionais no mercado. O uso indevido de trabalhos não só expõe a empresa a riscos legais, como também pode danificar sua reputação, especialmente se candidatos compartilharem experiências negativas nas mídias sociais”, diz Soares.

Mariana Zonenschein, advogada especializada em Direito da Empresa e Propriedade Intelectual, aconselha que uma medida eficaz para assegurar a proteção da criação dos softwares contra o uso indevido em casos de testes em processos seletivos, seria o registro do software através do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) no Brasil. O registro é uma forma de impedir que terceiros usem a criação como se fosse sua.

“A proteção conferida pelo registro de software tem uma abrangência global, o que significa que um software registrado no Brasil é válido em praticamente qualquer outro país, sem necessidade de extensões adicionais. Além disso, oferece ao proprietário a proteção de sua criação por 50 anos”, diz.

ATUALIZAÇÃO: A reportagem foi atualizada para deixar mais claras as informações principais.

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