Pernambucanos cantando para o mundo

Quando, em 1999, Lenine lançou seu primeiro álbum solo, O dia em que faremos contato, em condições bem diferentes de quando gravara o independente Olho de Peixe em parceria com o percussionista Marcos Suzano, em 92, ou mesmo o primeiríssimo, Baque solto, dividido meio a meio com o parceiro Lula Queiroga em 83. Se este era um disco de galera, com as deficiências e inexperiências supridas com espírito de grupo e visível entusiasmo, e o segundo aposta no menos é mais e se fecha no diálogo violão/percussão com o objetivo de mostrar as composições da forma mais econômica possível (tanto em termos musicais quando financeiros, sendo um álbum independente – só mais tarde a gravadora Velas o adotou), agora a coisa era diferente: este terceiro, depois de gravado no Rio de Janeiro, foi ser mixado e masterizado nos estúdios Real World, de Peter Gabriel – que aliás aparecia em pessoa de vez em quando para ver como as coisas andavam e jogar ping-pong – literalmente, com bola e raquetes.

Em O dia em que faremos contato, Lenine testa os limites do estúdio, e o que ele pode fazer pelas suas canções, usando e abusando da engenharia de gravação – foto sintomática é a do encarte em que ele, rindo, coloca a todo vapor uma alavanca do acelerador de uma embarcação. Mas se com um pé ele embarca no futurismo confessadamente inspirado em histórias em quadrinhos com que embrulha o trabalho, por outro lado ficam alguns ajustes de contas para fazer. Um deles é a regravação de um trecho do Mote do Navio, canção de Pedro Osmar gravada no Baque Solto, como que reúne e enumera o pessoal antigo e recém-chegado para olhar para trás e ver quão longe se chegou, e quão longe ainda se pode ir. E o outro, menos literal mas igualmente efetivo, é Pernambuco falando para o mundo – gravada, no meio de um álbum cheio de efeitos e futurismos, da mesmíssima maneira de todo o álbum Olho de Peixe: Lenine ao violão, Marcos Suzano na percussão, e só – o que é muito, porque os permitiu sintetizar rítmos diversos, do frevo ao Mangue Beat, numa levada ao mesmo tempo ancestral e futurista.

Este acerto de contas é ainda mais pessoal que o Mote do Navio, porque não é com pessoas, e sim com a terra natal. Não se trata exatamente de uma canção, e sim uma espécie de pout-pourri de quatro canções de épocas diferentes, todas ligadas umbilicalmente a Pernambuco. Antes de tudo, a expressão usada para o título é o slogan de uma antiga (e ainda existente) rádio AM do estado (aliás, não por acaso, a faixa inicia com um rádio procurando sintonia e o slogan cantado por Lenine, como um spot de rádio). A frase expressa bem o sentimento de grandeza que leva os pernambucanos a dizerem que os rios Capibaribe e Beberibe se juntam para formar o Oceano Atlântico! E as quatro canções escolhidas e repetem exatamente a trajetória explicitada no título, e percorrida por Lenine: de Pernambuco para o mundo. A partir daí, há sempre duas instâncias sendo apresentadas simultaneamente a cada canção: a do encadeamento musical e da sequência da memória musical.

Voltei Recife – com Alceu Valença

 O trajeto começa, dialeticamente, com uma volta, de um compositor que, como Lenine, deixou Pernambuco para construir carreira no Rio, numa época em que a visibilidade nacional só vinha por esta via. Luiz Bandeira é também o autor de Na cadência do samba, que se tornou Que bonito é ao ser adotada pelo cinejornal de esportes Canal 100, e acabou virando sinônimo de futebol-arte, sem nem tocar no assunto na letra. Luiz era contratado da Rádio Nacional, e só voltou ao Recife aposentado, nos anos 80. Um canto de retorno como abertura, num álbum em que Lenine foi mais longe do que nunca (e ainda iria mais), como para deixar claro que um pé atravessa o oceano, mas o outro continua bem fincado na origem. E a origem é esmiuçada em Capiba, talvez o compositor de frevo mais respeitado e festejado (e que não veio para o sul construiu sua obra toda em Pernambuco). A escolha de Capiba tem significado em si, talvez mais até do que a canção específica (embora a junção de frevo e ciranda também seja expressiva). É como remeter à Bahia cantando Dorival, ou falar de São Paulo cantando Adoniran. Corresponde a uma leitura da lugar que é puramente sentimental, emotiva. Nestas duas primeiras canções, Lenine dá conta de uma matéria prima de sua criação. Outra fonte será explicitada mais tarde.

Frevo Ciranda – com Lenine, Orquestra SPOK e a mulher que filmou desafinando empolgada.

 Em 1974, Alceu Valença classificou uma canção – Vou danado pra Catende – num festival da TV Globo. Incapaz de classificar a música numa categoria, o júri teve de inventar uma para poder premiá-lo, e ele ganhou o troféu Pesquisa. Sol e Chuva é de 1976, do disco Vivo!. Em seu sítio, Alceu afirma (já se referindo ao álbum de 1981, mas na verdade consolidando o que já era efetivo) que passou a significar uma vertente do rock sem ser rock. E no entanto, em outro festival, este da TV Tupi em 1980, Alceu defendeu Coração Bobo ao lado de ninguém menos que Jackson do Pandeiro (que é citado na gravação de estúdio)! Esta capacidade de manter o equilíbrio entre a cultura musical nordestina e a música urbana serve como matriz para Lenine. O dado histórico da vinda de Alceu para o Rio na virada dos anos 70, junto com uma turma que incluía Zé Ramalho e Geraldo Azevedo, não é apenas o alargamento de um caminho que já fora percorrido por Luiz Gonzaga, em 1940, mas também um passo largo no processo em que estes nordestinos se perdem e se reencontram ao deixarem sua terra natal. A junção feroz estabelecida por Alceu em Sol e chuva, sem usar nenhum instrumento além de violão e percussão, é um prenúncio dos caminhos (neste caso musicais) que Alceu abria para quem viesse a passar depois.

Sol e Chuva – Alceu Valença

E aí vem a turma seguinte, que passou pelo caminho aberto: aqui novamente a simbologia da canção está ligada tanto a ela própria quanto aos autores. Chico Science e Fred 04 foram as pontas de lança do movimento Mangue Beat. Em comum com a turma dos anos 70 de Alceu e a dos 80 (que só ganhou visibilidade nos 90) de Lenine e Lula Queirora, o fato de tratarem de ampliar a concepção de música regional fazendo-a universal – falando para o mundo. E, em comum com Capiba, o fato de fazerem de Recife o centro em vez de irem de lá para outro centro – o que na época de Capiba constituía exceção, mas no Mangue Beat prenunciou um multicentralismo em que Pernambuco, efetivamente, fala para o mundo, e ouve o mundo também.

Rios Pontes e Overdrives- Chico Science & Nação Zumbi – remixado por David Byrne

A primeira faixa do álbum O dia em que faremos contato chama-se A ponte – os discursos estão afinados. A junção do pedal de distorção overdrive nas paisagens do Recife neste refrão-quase-um-dístico permite que Pernambuco fale bem mais alto para o mundo, mas implica que o mundo vá também a Pernambuco. Um caminho necessariamente de duas vias, percorrido nas duas direções simultaneamente, e não é de hoje – desde Luiz Gonzaga, desde Jackson, desde Luiz Bandeira, Capiba, desde a turma de Alceu, Fagner, Ednardo e Belchior, desde a turma de Lenine, Lula Queiroga, Braulio Tavares e Pedro Osmar (autor do Mote do navio), à turma do Mangue Beat – posterior a Lenine – e depois, e simultaneamente, como a sobreposição das canções que encerra a gravação. A linha de tempo de Lenine o ultrapassa. E quanto mais Lenine se navega para longe de casa, mais constrói pontes para voltar para ela.

Três cabeludos

A carreira de Roberto Carlos, entre 1968 e 1972, ao longo de quatro álbuns, passou da Jovem Guarda à música romântica e ele de ídolo da juventude a ídolo nacional. Isto é sem dúvida uma simplificação, mas também não há dúvida de que este foi o período em que se forjou o Roberto Carlos que, mesmo diluído, existe até hoje.

Porém, isto não ocorreu sem um bocado de experimentações que, mesmo não tendo sido levadas adiante no sentido de se firmarem esteticamente na obra de RC, ainda assim deixaram suas marcas, seja no sentido pessoal como no artístico. Assim foi com o flerte com o espiritismo que o levou a visitar o médium Chico Xavier em Uberaba, ao mesmo tempo em que firmava sua fé católica e começava a transformá-la em canções. E assim também o flerte com a soul music que acabou dando frutos nestas mesmas canções.

Pode parecer que Roberto tenha ousado mais justamente nas canções religiosas desta época – Jesus Cristo, O Homem, Todos estão surdos – por se sentir confortável em uma temática, digamos, mais conservadora, como uma forma de compensação. Nada mais longe disso. Pelo contrário, nada mas natural que aproximar-se do soul, ritmo com uma ligação fortíssima com a música gospel – vide Marvin Gaye e mesmo Prince, que, ao lado com a temática amorosa e sexual, sempre trouxeram também a religiosa – Sexual Healing lado a lado com What’s going on. Roberto não fez muito diferente disto em sua carreira.

Eu poderia escolher qualquer uma das três canções que citei acima para analisar. Minha preferida é Todos estão surdos.

Todos estão surdos alia o balanço da música black a uma poderosa pregação, em que Roberto tenta fazer uma ponte entre seu público juvenil e o novo assunto que aborda:

Outro dia, um cabeludo falou:
“Não importam os motivos da guerra
A paz ainda é mais importante que eles.”
Esta frase vive nos cabelos encaracolados
Das cucas maravilhosas

Estas frases bem no espírito do filme Jesus Cristo Superstar são quase gritadas por Roberto, que deixa para cantar apenas o refrão (e mesmo assim, numa prosódia melódica que sempre começa ascendente, exaltada) e o lá-lá-lá que se repete da introdução ao final. A estrutura do refrão é interessante, com oito versos, sendo que aos primeiros quatro variam a cada vez, e apenas os quatro finais se repetem, remetendo imediatamente ao lá-lá-lá. Este, sim, é o verdadeiro refrão, um convite à congregação/platéia para cantar junto. E batendo palmas, assim como em Jesus Cristo, como numa boa celebração gospel.

Ou seja, Todos estão surdos seria uma redução da cerimônia religiosa em si, alternando o sermão – seja católico ou protestante – e as partes rituais que atuam no sentido de unir o pensamento da assembléia numa mesma função simbólica. Para isso, um refrão em lá-lá-lá é tão bom quanto qualquer outro, ou talvez melhor, por se poder atribuir qualquer simbolismo a ele. Neste caso, ele carrega em si o sentido das últimas frases do refrão anterior. Muito bem, mas só isso não constitui uma canção popular. Tem que haver algo mais que isto.

Todos estão surdos – Chico Science

Chico Science percebeu o que havia a mais. Sua gravação de Todos estão surdos consegue a proeza de ser ao mesmo tempo fiel à original, mantendo as gírias fora de moda e até mesmo o riff da guitarra, e a deslocar no tempo e no espaço, transportando-a da atmosfera soul para o universo manguebeat. É impressionante como o discurso que soava messiânico na voz de RC, com base apenas na nova sonoridade do arranjo, tem ressaltada a sua visão inconformista na voz de Science.

E o maracatu, ritmo negro criado de uma manifestação popular que ao mesmo tempo imitava e criticava a cultura cristã das cortes européias, se conjuga nesta visão de Jesus não como um rei, mas como um amigo, ao mesmo tempo que permanece indignada ao afirmar que a covardia é surda e só ouve o que convém. Science consegue em sua gravação unificar sua visão historicamente ao pensamento de pessoas como Martin Luther King, por exemplo. Mas ele não deixa de acrescentar algo na letra:

Você que está aí sentado, levante-se
Há um líder dentro de você
Governe-o,
Faça-o falar!

Quando Chico Science canta o verso Outro dia, um cabeludo falou, pode estar na verdade falando de Roberto, que gravou Detalhes no mesmo álbum de Todos estão surdos, em 1971, a Detalhes de Se um outro cabeludo aparecer na sua rua. A mensagem no fundo talvez seja a mesma. Talvez, ao longo do tempo, só mudem os cabeludos.

Uma Breve História no Timbre – a volta

Começando a voltar

O Tropicalismo foi a chegada do século XX à canção brasileira. Se na década de 40 uma canção era melodia e letra, e depois da Bossa-Nova passou a ser melodia, letra e harmonia, o Tropicalismo trouxe à tona o timbre como elemento da música. Isto se deve um tanto à influência das experimentações da música clássica contemporânea (via Rogério Duprat, por exemplo, mas também pelo Tom Zé, formado em composição na UFBA), mas não só. Também foram fundamentais as conquistas técnicas amplamente utilizadas pelos grupos de rock. A partir de 1960, teclados e guitarra elétrica, esta com a popularização dos pedais de efeito, ganham uma gama de sonoridades antes inimaginável.

Quem traz as guitarras para o Brasil não é a Tropicália, mas a Jovem Guarda, que é pessimamente recebida pelo mainstream musical da época, embora sucesso de público. Até que Maria Bethânia chama a atenção do irmão para a força daquele movimento, ao afirmar que eles eram os representantes do novo naquele momento. E quando Caetano se faz acompanhar por um conjunto de ie-ie-ie argentino ao apresentar Alegria Alegria (que no fundo é quase um baião) no festival da Record, o mundo vem abaixo, a ponto de acontecer uma passeata contra a guitarra elétrica (na verdade contra a invasão da música estrangeira), com a presença de Elis Regina e Gilberto Gil! (Gil diz hoje que só foi em consideração a Elis. Aliás, esta passeata é um dos episódios simbólicos da história de nossa música que ainda não foram devidamente tratados, a meu ver.)

A diferença no uso da guitarra pela Tropicália e pela Jovem Guarda é que esta repetia um padrão de uso e sonoridades, enquanto a Tropicália decretava a liberdade, para além do uso de instrumentos, mas também com a possibilidade de experimentação no estúdio, a partir do exemplo do Sargent Peppers, dos Beatles, e do primeiro álbum do Pink Floyd, The Piper at the Gates of Dawn, de 1967. Um exemplo disso são os Mutantes gravarem Dia 36 com o microfone ligado no canal do órgão para distorcer a voz de Arnaldo Batista, e com os instrumentos soando fora de rotação. Abriam-se horizontes novos.

Os Mutantes – Dia 36, do segundo álbum

A Reta Final

A partir daí, ocorrem diversas ondas de inovação trazendo novidades, quase sempre frutos da influência externa reprocessada de modos diferentes pelo contato com a cultura local: os nordestinos chegam com Zé Ramalho emulando Bob Dylan e repentistas e Alceu Valença guitarrando o coco; os Novos Baianos tem um Pepeu Gomes entre Hendrix e Jacó do Bandolim, e Baby entre Janis Joplin e Ademilde Fonseca; já nos 80, a geração BRock traz as várias vertentes do pós-punk para a nossa realidade; e o Mangue Beat leva vários passos adiante esta mistura, consolidando uma sonoridade própria. O Chiclete com Banana se torna o chiclete de banana, que é lançado no mercado.

Paula Tesser, cantora franco/brasileira e doutora na Sorbonne, afirma em seu artigo Mangue Beat: Húmus Cultural e Social:

O que encontramos nas músicas do Mangue Beat é o efeito da tecnologia na arte popular. As referências culturais como o maracatu, a ciranda, o coco, o repente, a embolada mostram que ele inseriu o velho no novo. Com a imagem da antena parabólica fincada na lama os mangue boys querem, com esse símbolo, estimular os artistas e a comunidade para que se mantenham em sintonia com o mundo exterior, sem, no entanto perder suas raízes.

E esta mistura, mais do que através de letras, melodias ou harmonias, se dá pelos ritmos, pelos timbres. Pela guitarra integrada aos tambores do maracatu, lá; pela bateria eletrônica integrada ao samba À Procura da Batida Perfeita.

Manguetown – Chico Science & Nação Zumbi – do álbum Afrociberdelia

A Linha de Chegada

No mesmo artigo citado acima, Paula Tesser cita Nietzsche em Humano, Demasiado Humano:

Quando tocamos obras antigas deveríamos nos proibir, por uma preocupação de objetividade, de colocar nossa própria alma para animá-las? De maneira alguma, pois é tão somente quando damos nossa alma que oferecemos a elas a possibilidade de continuarem vivas; só nosso sangue pode fazer com que elas possam ainda falar. A interpretação verdadeiramente “histórica” falaria de fantasma para fantasma.

Uma das primeiras “providências” das gerações pós-Manguebeat, tendo dominado as possibilidades tecnológicas, foi acertar as contas com o passado. De formas diversas, quase todos os artistas recentes tratam de se inserir (sem a  preocupação de se legitimar, mas simplesmente como um encontro com as raízes) no contexto de alguma tradição da música brasileira. No Rio, o ponto de encontro de diversos deles é a Orquestra Imperial, que tem seu repertório majoritariamente antigo e recriado com liberdade, além da presença física do baterista Wilson das Neves, como que abençoando a bagunça. Rita Ribeiro, que é do Maranhão e iniciou a carreira gravando muito do Zeca Baleiro, fez o álbum Tecnomacumba, todo de regravações (inclusive uma do próprio repertório, Cocada) que, como o nome indica, são rearranjadas com rock e eletrônica e alinhavadas a pontos de umbanda, com um resultado empolgante. O próprio Cidadão Instigado, de repertório autoral, em certos momentos rende seu tributo às influências de correntes do brega de cantores como Márcio Greick, marginalizadas pela inteligentzia, assim como acontecera com a Jovem Guarda. Isso sem falar do pessoal do samba e choro da Lapa, que leva adiante sua tradição(talvez de forma um tanto reverente demais, mas outro dia trato disso).

A Deusa dos Orixás (Toninho/Romildo) – Clara Nunes

A Deusa dos Orixás (Toninho/Romildo) – Rita Ribeiro

Mas apesar de remeter-se a estas tradições, o formato das canções compostas por esta turma não é necessariamente o mesmo das regravadas. Como disse aqui no início deste artigo, demorei para perceber que o que parecia desarrumado era, na verdade, exatamente desarrumado, só que de propósito. Acontecia que eu continuava partindo de um pressuposto antigo, enquanto eles partiam de um novo. Eu continuava pedindo a equalização entre letra, melodia e harmonia, enquanto eles partiam de um riff (coisa que eu estava acostumado dentro do rótulo do rock, mas, preconceituosamente, não no da MPB), de uma levada, de uma sonoridade. Rótulos que já se foram há muito tempo, eu é que não tinha notado…

Se na década de 40 uma canção era melodia e letra, e depois da Bossa-Nova passou a ser melodia, letra e harmonia, e se o Tropicalismo trouxe à tona o timbre como elemento da música, hoje temos a possibilidade de uma composição se estruturar a partir do timbre, como as canções do Cidadão Instigado surfam uma sonoridade que lhes dá sentido, tanto quanto as letras de Vinícius de Morais, diferentemente de sua poesia, só fazem sentido na melodia/harmonia de Tom Jobim. Ao contrário dos temores do Chico Buarque, arrisco-me a dizer, a canção não está acabando, mas se transformando, o que é a melhor garantia de sua sobrevida. Ainda que alguns possam demorar a reconhecê-la, como já aconteceu tantas vezes. “Desliga esse som, filho, isso não é música!”