Folha de S. Paulo


CR�TICA

Sob vestes de horror, 'As Boas Maneiras' tem a cara do Brasil

AS BOAS MANEIRAS (�timo)
DIRE��O Juliana Rojas/Marco Dutra
ELENCO Isab�l Zuaa, Marjorie Estiano, Miguel Lobo, Cida Moreira
PRODU��O Brasil, 2017, 14 anos
QUANDO nesta quinta (26), �s 21h20, no Cinesesc; sexta (27), �s 18h, no Reserva Cultural 2; domingo (29), �s 18h30, na Cinemateca BNDES
Veja salas e hor�rios de exibi��o

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� estranho como s�o poucos os temas de nosso cinema atualmente. Por sorte, s�o bem diferentes os tratamentos. Em "Vazante", por exemplo, o tema do preto e do branco e de sua heran�a est� t�o presente quanto em "As Boas Maneiras". S�o por�m filmes inteiramente distintos.

Para come�ar, aqui estamos no presente e no registro do horror. Mas uma m�e (branca) morrer� ao dar � luz uma estranha crian�a, de que se ocupar� a mulher negra que contratou como bab� de seu futuro filho.

N�o sei de melhor resumo para o filme do que a equa��o fornecida pelo cr�tico dos "Cahiers du Cin�ma" que esteve no Festival de Locarno deste ano: "As Boas Maneiras" = Almod�var + Jacques Tourneur + David Cronenberg + Marco Dutra-Juliana Rojas.

A equa��o � boa porque d� o cr�dito da originalidade aos brasileiros. Os demais est�o l�? Francamente, n�o vi muito Almod�var. Mas Jacques Tourneur e seu terror de sugest�o est� l� aos montes, com toda a dif�cil sutileza que sup�e. E, por vezes, l� encontraremos tamb�m Cronenberg.

No entanto a arte mais sutil � a da transforma��o. No come�o temos uma situa��o cl�ssica: uma mulher rica com uma criada negra. Aos poucos, Ana, a mo�a rica, mostrar� suas fragilidades. A criada crescer� n�o s� aos seus olhos como aos nossos. Elas entrar�o numa esp�cie de amor simbi�tico, em que uma figura parece absorver a outra.

O momento seguinte dessa absor��o se d� pela ado��o do pequeno Joel pela bab� negra, que, sintomaticamente, se chama Clara. N�o menos sintomaticamente, conv�m lembrar que Joel tem significado b�blico nada modesto: Deus.

A companhia de Ana, primeiro, e de Joel, mais tarde, transforma Clara: antes inst�vel, inadaptada aos empregos, torna-se m�e completamente dedicada. Ela far� todo o poss�vel para que Joel cres�a modestamente (numa quase favela paulistana), mas saud�vel e no desconhecimento de suas origens.

O que vir� depois? Bem, Joel buscar� suas origens. Joel reencontrar� talvez o seu destino. E o que vir� depois? Bem, como dizia a frase final de um magn�fico filme de Tourneur ("A Noite do Dem�nio"), certas coisas � melhor n�o saber. Pelo menos n�o antes da hora.

Digamos, em todo caso, que "As Boas Maneiras" d� sequ�ncia � obra admir�vel de Marco Dutra e Juliana Rojas (seja em conjunto, seja individualmente) e do coletivo paulista Filmes do Caixote.

T�o pouco preocupado com o Brasil, na superf�cie, esse filme tem a nossa cara. Escarrada (� maneira de Cronenberg), embora sob a roupagem mais tradicional do filme de lobisomem.

Mas tamb�m � conveniente lembrar que d� sequ�ncia a uma s�rie de filmes brasileiros admir�veis que come�am a impor internacionalmente uma dramaturgia do cinema brasileiro desenvolvida por essa gera��o que come�a a filmar no s�culo 21.

Com "As Boas Maneiras" chegam "Gabriel e a Montanha", "Era uma Vez Bras�lia", "Ar�bia", "As Duas Irenes". Espera-se que as salas comecem a lhes abrir espa�os condizentes e que um p�blico maior possa descobri-los.

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Veja mais sobre filmes e diretores na 41� Mostra Internacional de Cinema de S�o Paulo no especial do 'Guia'.

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Assista ao trailer de "As Boas Maneiras"

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